Esta é a primeira eleição geral no país após o grande impacto da Lava-Jato. Apesar de as prisões terem começado em 2014, as delações ocorreram em 2015. De lá para cá, as investigações mostraram a dimensão multipartidária da corrupção. Tendo isso em mente, um grupo de pesquisadores de áreas diversas e tendências diferentes formulou o mais amplo pacote de medidas anticorrupção.
Na visão de um dos organizadores do “Unidos contra a Corrupção”, o professor de Direito Michael Mohallem, da FGV, “o resultado das urnas pode mandar sinais para todos, para os que são investigados e os que eventualmente têm condenações”. Este é o momento ideal de discutir tecnicamente essa questão e enviar os sinais. As 10 medidas contra a corrupção foram formuladas basicamente pelo Ministério Público e algumas das medidas foram criticadas, apesar das boas ideias que estavam lá. Desta vez, são 70 medidas que foram definidas após discussão numa plataforma que reunia várias visões do problema. Elas serão encaminhadas em forma de projeto de lei ao Congresso, com ideias que vão desde a regulamentação do lobby, à proteção da pessoa que reporta o caso de corrupção, até uma nova forma de fiscalização dos partidos.
A reação da sociedade precisa ser ampla, porque o problema também é disseminado, diz Bruno Brandão, da Transparência Internacional Brasil.
— A Lava-Jato mexeu com interesses de poderosos de todos os lados do país. Da esquerda, da direita, do poder econômico, do poder político. E ela vem sob ataque desde o dia um. Em quatro anos, a Lava-Jato está constantemente sob ataque, sob uma guerra de comunicação, desinformação, que tenta deslegitimar a operação. Alguns candidatos já se manifestaram contra ela, e outros defendem a sua continuidade e avanço. Alguns se posicionam a favor e têm propostas que contradizem esse apoio. O professor Joaquim Falcão fala que a Lava-Jato é uma atitude, mais do que uma operação — diz Bruno.
O fato de transcender às investigações e ser uma atitude de juízes, procuradores e também da sociedade é que levou a esse esforço multidisciplinar de formular propostas concretas para avançar.
— As pesquisas têm mostrado que esse passou a ser o problema número um dos brasileiros. E olha que o Brasil tem problemas sérios. Fica acima da segurança, desemprego, educação. Portanto, uma resposta precisava ser dada. Organizações como a Transparência, universidades como a FGV e outros parceiros acharam que era preciso dar uma contribuição. As 10 medidas tiveram o mérito de colocar o debate, mas faltaram alguns elementos. Mais organizações, mais ideias, mais pontos de vista — diz Mohallem.
Ele explicou que foram reunidas pessoas que trabalham nessa agenda há décadas. Buscou-se inspiração no que deu certo no exterior.
— Juntaram-se professores, servidores, juízes, promotores, advogados, acadêmicos. Juntaram-se inteligências. Houve um processo que passou por consulta pública. Depois tudo foi revisado para se tirar os excessos, a gente depurou do ponto de vista técnico. E são 70 medidas, formuladas por 200 especialistas — explica o professor.
Bruno Brandão diz que a Transparência Internacional trabalha com esse assunto em 110 países, pesquisando planos nacionais, as grandes reformas. Ele diz que este é o programa mais extenso já formulado.
— Hoje enfrenta-se uma polarização exacerbada. Aqui não. A divergência foi bem-vinda. Nós buscamos a divergência porque ela ajudou a fazer filtros.
Eu entrevistei os dois no meu programa na Globonews. Um dos pontos propostos é a regulamentação do lobby, que existe em muitos países. Não resolve o problema, mas aumenta a transparência. Outra proposta tem a ver com os partidos políticos. Eles têm recursos públicos, muita autonomia, e vários viraram negócios familiares, ou são controlados por caciques. Há propostas que estimulam a democratização dos partidos. Uma medida que funciona muito no exterior é a proteção do whistleblower, o denunciante. Não o que faz a delação, por estar dentro do problema, mas sim o que vê algo errado e comunica.
Caminhos para combater e prevenir a corrupção existem. Mesmo que o cenário pareça desanimador é preciso persistir. Na visão de Bruno Brandão, essa é uma luta por direitos.
(Com Alvaro Gribel, de São Paulo)