Governo está sem rumo na educação, perdendo tempo com polêmicas, mas há agenda de temas reais sobre os quais deveria estar debruçado
Não falta assunto urgente na agenda da educação brasileira, o que falta é foco do governo nos itens que são realmente importantes. O Fundeb tem prazo até o ano que vem para ser renovado e o MEC nem toca no assunto. Na área econômica, como se sabe, há a ideia de acabar com toda a vinculação orçamentária, o que seria tentado através de uma futura emenda constitucional. O problema é que um assunto como esse não pode ficar sem decisão, enquanto a PEC não vem, porque sem o fundo o impacto na educação dos municípios menores e mais pobres seria demolidor.
O governo começou há quatro meses, o país está no segundo ministro da Educação, e permanece o padrão das polêmicas artificiais. A última foi o corte de verba para universidades onde ocorrem “balbúrdia”, que depois virou o corte generalizado. Reuni dois especialistas na Globonews para perguntar a eles que temas o Brasil deveria estar discutindo. O professor Mozart Neves Ramos foi secretário de Educação de Pernambuco e iniciou um processo, mantido por outros governos, de aumento das escolas em tempo integral. Hoje, Pernambuco é o estado que tem o maior volume de horas-aula no ensino médio. Ele é diretor do Instituto Ayrton Senna. Regina de Assis tem mestrado em Harvard e doutorado na Universidade de Columbia, em educação. Foi secretária municipal do Rio na administração de Cesar Maia.
Regina lembra o sempre presente tema da “valorização do professor”. Sob os cuidados do professor estão 50 milhões de brasileiros, crianças e jovens. E a qualificação em tempos de mudança rápida, “tempos fluidos”, tem que ser dinâmica. Mozart concorda:
— Sem bons professores, bem formados, nós não vamos sair desse estado praticamente de estabilidade, num patamar muito baixo. De cada 100 jovens que concluem o ensino médio, só sete aprenderam o que seria esperado em matemática, e 28, em língua portuguesa.
A grande questão que os dois apontam é que o Brasil tem que preparar professores para o século XXI, porque a formação que a gente vem dando historicamente é muito distante da realidade.
Regina de Assis quando era secretária no Rio, no começo dos anos 1990, reconheceu o uso das mídias na sala de aula como um direito. Na época a ideia era que isso era um luxo:
— Não há um método que seja único para ensinar a maioria das crianças. A forma de fazer as crianças aprenderem a ler, com gosto, é contar histórias. É arcaica a maneira de ensinar via alfabeto.
Outro ponto fundamental na educação, explica Mozart, é a questão socioemocional. Ele disse que o economista que foi prêmio Nobel de 2000, James Heckman, fez um estudo com crianças na pré-escola e mostrou que as que trabalhavam a resiliência, a colaboração, a criatividade e o pensamento crítico entre quatro a seis anos tiveram maior desempenho no ensino médio e maiores possibilidades de sucesso na vida profissional.
Há na agenda da educação temas que vão da preparação dos professores para tempos digitais ao fator emocional determinando a trajetória dos estudantes. Há questões práticas como a renovação do Fundeb. São R$ 160 milhões no Fundo, para o qual contribuem as três esferas da federação, que depois retornam aos municípios e estados como reforço no financiamento da educação.
— O Brasil é uma federação de estados e municípios regidos pela colaboração. A ideia é de que esse dinheiro complemente os orçamentos. Dos 5570 municípios brasileiros, 70% têm até 20 mil habitantes. Essas cidades precisam do Fundeb —disse Regina.
Uma das frases que Mozart repete é que o Brasil tem que aprender com o Brasil. Ou seja, ver os casos de sucesso e reproduzir. O Instituto Ayrton Senna fez trabalhos importantes em uma série de cidades nas quais houve estudos de impacto.
— Não é achismo, não é se o aluno está gostando, é se o aluno está aprendendo — diz Mozart.
Outra questão urgente é a reforma do ensino médio e a implantação da Base Nacional Comum Curricular. O país se dedicou a isso nos últimos anos. E agora? Sobre as universidades, Regina disse qual é o ponto fundamental: elas precisam ter liberdade de criação e a responsabilidade do resultado.
O governo está perdido em sua balbúrdia porque quer. Assunto sério para discutir na educação é que não nos falta.