Miguel Caballero: Tour de Bolsonaro humilha Mandetta e confunde população

O ministro Luiz Henrique Mandetta passou a semana constrangido, tentando equilibrar-se entre as recomendações dos técnicos de sua pasta e a posição do presidente Jair Bolsonaro pelo fim do isolamento, expressada em rede nacional na terça-feira. Já o chefe não viu problemas em desautorizar o subordinado.
Foto: Agência Brasil
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O ministro Luiz Henrique Mandetta passou a semana constrangido, tentando equilibrar-se entre as recomendações dos técnicos de sua pasta e a posição do presidente Jair Bolsonaro pelo fim do isolamento, expressada em rede nacional na terça-feira. Já o chefe não viu problemas em desautorizar o subordinado.

Mandetta declarou novamente no sábado ser a favor do distanciamento social e de medidas restritivas, e no domingo Bolsonaro fez um passeio pelo comércio de rua em cidades-satélites de Brasília. As imagens pesam bem mais que palavras lidas no teleprompter em pronunciamentos em cadeia de rádio e TV.

O tour presidencial fará recrudescer especulações sobre uma demissão do ministro. O descompasso entre o presidente e Mandetta agrava um quadro em que o Bolsonaro vive às turras com os governadores. Até um dos mais próximos, Ronaldo Caiado, de Goiás, importante na indicação de Mandetta, rompeu com o presidente. A desarticulação de quem precisa organizar com urgência uma operação de contenção de uma catástrofe num país continental é alarmante, mas não é a única consequência ruim do passeio.

As imagens confundem a população. O cidadão liga a televisão e vê o mundo em quarentena, a tragédia já avançada em muitos países. O presidente pede para que saiam às ruas, mas o governador anuncia que a polícia coibirá quem descumprir o isolamento. Há contradição no próprio passeio de domingo: o “isolamento vertical” defendido por Bolsonaro faria com que ele, aos 65 anos, permanecesse em casa.

O presidente joga com a corrida entre qual tragédia terá efeitos de prazo mais imediato: a escalada da fome nos bolsões mais pobres pela interrupção da circulação de dinheiro ou a multiplicação de mortes pelo avanço do vírus.

Há um aspecto cruel nessa dinâmica. A população mais humilde é a que sofre mais a curto prazo, e de forma mais devastadora, o efeito da supressão de recursos em circulação. É, também, a que tem menos acesso à informação para identificar a irresponsabilidade do presidente.

Sair às ruas para “evitar a fome antes de evitar o vírus” é um falso dilema. O caminho possível para desatar esse nó — reconhecido pelos demais governantes e pelos economistas — é a injeção de dinheiro nas pessoas e empresas para suavizar o impacto do necessário isolamento. Possibilidade que está ao alcance apenas do governo federal.

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