O cobertor curto orçamentário está causando apreensão entre os políticos (alérgicos a novos impostos), ao governo, que já tem tudo para lançar um novo programa social (menos dinheiro), e nos órgãos fiscalizadores, como o Tribunal de Contas da União (TCU), que ontem alertou que o quadro fiscal do país é “gravíssimo”, na definição do ministro Bruno Dantas.
O ministro Paulo Guedes está em busca de “tributos alternativos” para desonerar a folha de pagamentos das empresas e também encontrar “uma aterrissagem suave” do auxílio emergencial. É a maneira politicamente correta que Guedes encontrou para tentar a aprovação do imposto sobre transações digitais.
Quanto à desoneração da folha, a troca é bem-vinda e poderá ser a chave para um acordo no Congresso, pois barateará o custo das contratações, ajudando a reduzir a taxa de desempregados. “Queremos desonerar, queremos ajudar a buscar emprego, facilitar a criação de empregos, então vamos fazer um programa de substituição tributária”, disse Guedes.
Mas, quanto ao substituto do auxílio emergencial, que o governo quer transformar em um programa de renda mínima de R$ 300, maior que o Bolsa-Família no valor e no alcance social, a conta não fecha. O teto de gastos não admite que novas receitas possam aumentar as limitações orçamentárias.
Só cortando custo, gastos a mais só com a definição de onde sairá o dinheiro novo para compensá-los. O ministro Bruno Dantas ontem foi claro: “O teto é fixo”. Ao analisar ontem uma prestação de contas da execução orçamentária e financeira do primeiro trimestre deste ano, os ministros ficaram impressionados com a previsão de que o déficit fiscal este ano deve ser da ordem de R$ 861 bilhões, maior do que a previsão oficial em julho.
Segundo o ministro Bruno Dantas, existe a sensação “em vários momentos” de que o Brasil está “à deriva”, e foi apoiado por todos quando afirmou que o governo precisa fazer um plano de saída da crise para “o curto e médio prazo”.
Com todas essas dificuldades, no decorrer das negociações sobre o pacto federativo, que é onde está embutido o Renda Cidadã, é possível que o debate sobre a possibilidade de mudança dos critérios do teto de gastos seja destravado. Há quem imagine que é possível fixar-se um novo teto, englobando o resultado de um novo imposto.
A proposta do relator do pacto federativo, senador Marcio Bittar, é acabar com as despesas obrigatórias para saúde e educação, permitindo que o orçamento seja mais flexível. É uma questão polêmica, que certamente causará debates polarizados, pois será preciso que, nessa conformação, o apoio político da saúde e da educação seja forte o suficiente para que não percam verbas orçamentárias. Como a visão é de que esse governo não tem apreço pelas duas áreas, vai ser difícil chegar a um acordo.
Para cortar gastos que sejam relevantes, só há uma saída: ou mexer na parte superior da pirâmide, que é onde estão os altos salários dos servidores públicos, ou cortar na base, atingindo a maioria, formada pelos que se procura atender com o novo programa social. A segunda opção já foi descartada pelo presidente Bolsonaro, que alega não querer tirar dos pobres para dar para os paupérrimos.
O que ele quer mesmo é manter um programa social que dará o dobro do que hoje dá o Bolsa Família, e a mais gente, incluindo os cerca de dez milhões de “invisíveis” que foram descobertos agora na pandemia. É um projeto político que esbarra na dificuldade por que passa o país, mas que interessa também ao centrão, que assumiu o apoio ao Renda Cidadã. Como estamos em época eleitoral, o novo programa social não deve ser de efeito imediato, pois até dezembro está em vigor o auxílio emergencial de R$ 300.