Para sair da crise, será preciso a união das forças políticas, pois nenhum dos dois candidatos terá capacidade de governar sozinho
A importância desta eleição presidencial é dada pelo clima de radicalização política que a dominou. Cruzamos a linha civilizatória com o atentado à vida de Jair Bolsonaro e prosseguimos em uma campanha radicalizada e de acusações de fake news de ambos os lados, com a utilização ao extremo dos novos meios de comunicação, amplificando-as.
Ao radicalismo dos oponentes neste segundo turno contrapõe-se a mensagem apaziguadora do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, publicada ontem pelo GLOBO.
Em bom momento o STF coloca-se, por seu presidente, como instituição mediadora dos conflitos, dando ênfase a esse papel que cabe na definição do Supremo como Corte Constitucional, mas não pela limitação de seus poderes, como querem os dois oponentes, nem uma Corte política, como também acusam os dois candidatos que disputam hoje o segundo turno.
Coincidentemente, na sexta-feira dois assuntos chamaram a atenção sobre o STF, de maneira positiva. O coronel da reserva que bravateou nas redes sociais contra o Supremo, atingindo a honra de vários ministros e até mesmo ofendendo pessoalmente a ministra Rosa Weber, que preside também o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), acabou com tornozeleira eletrônica e circulação restrita pelo país.
No mesmo dia, o Supremo teve papel fundamental na reação do Judiciário contra a ação coordenada de tribunais eleitorais de 12 estados que, a pretexto de impedir propaganda eleitoral em prédios públicos, censuraram as manifestações dentro de universidades daqueles estados.
A coordenação entre os estudantes ficou evidenciada pela decisão conjunta de debater o fascismo, numa evidente referência ao candidato da extrema direita Jair Bolsonaro. A autonomia universitária não pode, porém, ser contestada por agentes repressores, e o trabalho do próximo governo será garantir a liberdade de expressão também para os grupos opostos, como os que, assim como Bolsonaro, acusam o PT de querer levar o país para o comunismo, como acontece em vários países da região.
O confronto de ideias deve ser a essência dos debates acadêmicos, mas não é com repressão que será garantido. É aí que entra o papel fundamental do vencedor de hoje. Com o país conflagrado desde 2013, o novo incumbente terá como missão principal e prioritária unir novamente os brasileiros, através de palavras e atos.
No discurso da vitória, além de assumir esse compromisso, o vencedor tem obrigatoriamente que se referir ao derrotado, assim como o derrotado deve telefonar desejando-lhe sorte.
Essa regra comezinha de civilidade não esteve presente em 2014, pois, mesmo tendo recebido um telefonema do tucano Aécio Neves, a presidente reeleita Dilma Rousseff não o mencionou em seu discurso.
Depois das trocas de ofensas e das posições radicalizadas dos dois candidatos, é difícil antever que tenham esse gesto de grandeza. Sem um gesto de conciliação, como prega o presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, estaremos caminhando outra vez para o terceiro turno da eleição presidencial, e para um embate entre extremos que não ajudará o país a sair dessa crise imensa em que nos metemos.
Para sair dela, será preciso a união das forças políticas, pois nenhum dos dois candidatos terá capacidade de governar sozinho, muito menos de aprovar as reformas constitucionais de que o país necessita. Para além do pragmatismo necessário para tocar o governo, o novo presidente terá que favorecer um ambiente distensionado no país, sem o que estaremos no pior dos mundos, encalacrados financeiramente e encurralados no radicalismo político.
Não se trata mais de denunciar os culpados, mas de união de esforços para superar esse impasse com uma visão de país que tem faltado aos nossos líderes recentes, e faltou também, dos dois lados, na campanha eleitoral que se encerra.
Um exemplo formidável de espírito democrático está contido no discurso do então presidente Barack Obama, depois da vitória de Donald Trump para o governo dos Estados Unidos. “(…) esta é a natureza da democracia. Às vezes é duvidosa e barulhenta, muitas vezes não é inspiradora.
Quando o povo vota e perdemos a eleição, aprendemos com nossos erros, fazemos reflexões. E voltamos ao jogo. O importante é que sigamos em frente, com a presunção de boa-fé dos nossos cidadãos. (…) Vou fazer tudo para que o próximo presidente tenha sucesso, porque, no final, estamos no mesmo time”.