Derrotado por sentimento majoritário antipetista e antilulista, PT mantém-se na posição de dono da esquerda
Parafraseando Talleyrand, ministro dos Negócios Estrangeiros por quatro vezes e o primeiro primeiro-ministro da França com Luis XVIII, o PT não esqueceu nada, não aprendeu nada. Talleyrand se referia aos Bourbons, que reassumiram o poder na sequência da Revolução Francesa, que havia decapitado Luis XVI, e não entenderam os novos tempos. Foram derrubados novamente anos depois.
O PT, depois de ter sido derrotado por um sentimento majoritário antipetista e antilulista, mantém-se na posição de dono da esquerda brasileira, anunciando uma oposição sem trégua ao novo governo, a partir do patético discurso da derrota de Fernando Haddad. O fracasso parece ter-lhe subido à cabeça, e também à da presidente do PT, Gleisi Hoffmann.
Haddad insistiu na “prisão injusta” do ex-presidente Lula, e Gleisi, na antevéspera da eleição, disse que o presente ideal para Lula seria indultá-lo. Só no dia seguinte se dignou a enviar um voto de boa sorte através do Twitter. As urnas disseram o que pensam sobre isso.
Depois dos discursos contundentes do senador Cid Gomes e do rapper Mano Brown, que jogaram água no chope petista ao denunciarem os equívocos cometidos pelo partido, e seu distanciamento do povo, foi a vez do candidato terceiro colocado na corrida presidencial, Ciro Gomes, que adotou uma posição de bom senso e anunciou um claro rompimento com o PT.
Em entrevista à “Folha de S.Paulo”, faz várias críticas ao partido, que se quer hegemônico e é traidor, na sua opinião. O PDT vai entrar em rota de colisão com o PT, que muito provavelmente ficará isolado na condição de oposição radical a qualquer preço. Ciro parece querer ser uma oposição mais equilibrada, até onde isso é possível tratando-se de um político com seu temperamento. Haverá um caminho pelo meio para a oposição de esquerda, mais responsável, que pode render frutos para sua liderança.
A única chance de o PT voltar a se colocar como grande esperança do povo brasileiro é se nada no governo Bolsonaro der certo. Por isso, o partido jogará no quanto pior, melhor, apostando no fracasso do governo Bolsonaro. Não é a primeira vez que o PT faz isso: não votou em Tancredo Neves para presidente, não apoiou o governo de transição de Itamar Franco, não assinou a Constituição de 1988, não apoiou o Plano Real.
A denúncia de uma suposta parcialidade do juiz Sergio Moro contra Lula, por ter sido convidado por Bolsonaro para o Ministério da Justiça, é tão absurda quanto as insinuações que partidários de Lula fizeram em 1989, após ele ter sido derrotado por Fernando Collor no segundo turno da primeira eleição direta depois da redemocratização. Collor convidou o ministro Francisco Rezek, do STF, que coordenara a eleição como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), para ministro das Relações Exteriores.
Rezek aposentou-se do cargo de ministro do STF para poder compor o Ministério, mas, em 1992, retornou ao STF, período em que Collor lutava para escapar do processo de impeachment —ele não participou do julgamento de Collor por considerar-se impedido. Para que Rezek pudesse retornar ao STF, Célio Borja, que tinha sido assessor especial de Sarney, que o nomeou em 1986 para o STF, aposentou-se, em abril de 1992, assumindo o Ministério da Justiça no chamado “Ministério dos notáveis” de Collor, última tentativa de resistir à queda política.
A integridade e credibilidade do ministro Rezek não foi afetada, pois foi nomeado membro da Corte Internacional de Justiça da ONU, em Haia. É o mesmo processo de agora, quando os advogados de Lula, e os líderes petistas, consideram prova de parcialidade de sua atuação o juiz Sergio Moro ser convidado pelo presidente eleito Jair Bolsonaro para ministro da Justiça.
Moro provavelmente aceitará o convite, depois de conversar com o presidente eleito hoje, e a principal medida será a elaboração de um Plano Nacional contra a Corrupção. Nada mais natural que um candidato eleito em grande parte pela luta contra a corrupção e o apoio à Operação Lava-Jato convide para seu governo o símbolo maior desse combate.