A medida do oportunismo do centrão partidário, que ciscou em várias direções e acabou, ao que tudo indica, nos braços do candidato tucano Geraldo Alckmin, é a resistência à entrada no grupo do MDB, sob a alegação de que é preciso se afastar do governo Temer para ser competitivo na eleição geral de outubro.
Logo o centrão, que formou a base de todos os recentes governos, sem distinção de ideologia, inclusive o de Temer até recentemente. Grupo suprapartidário de centro-direita criado no final do primeiro ano da Assembleia Nacional Constituinte de 1988, o centrão nasceu marcado por uma frase, até hoje é sinônimo de fisiologia: “É dando que se recebe”.
Foi o deputado paulista Roberto Cardoso Alves, o Robertão, já morto, o autor dessa releitura da frase de São Francisco de Assis. O centrão da época reunia lideranças conservadoras de PFL, PMDB, PDS e PTB, não necessariamente as direções partidárias dessas legendas, mas políticos de peso dentro do Congresso como Luiz Eduardo Magalhães e Ricardo Fiuza, do PFL, Gastone Righi, do PTB, e Daso Coimbra, do PMDB.
Partido que se dividiu entre os que apoiavam o governo Sarney e os que seguiam o presidente da legenda à época, Ulysses Guimarães, que semeava na Constituição Cidadã sua futura campanha à Presidência da República em 1989, na qual foi cristianizado, chegando em sétimo lugar com cerca de 4% dos votos.
Essa divisão do PMDB, o partido hegemônico, determinou o fim da Aliança Democrática entre o PMDB e o PFL, que dava sustentação política à Nova República. Da mesma maneira que agora, os líderes do centrão procuraram se afastar do Palácio do Planalto e se aproximaram de Fernando Collor, candidato vencedor na eleição de 1989.
O MDB em tese tem um candidato próprio, Henrique Meirelles, o ex-ministro da Fazenda de Temer e presidente do Banco Central de Lula. Ter um candidato que defenda seu governo foi, aliás, um conselho de Sarney a Temer. E o MDB parecia disposto a disputar sozinho o Palácio do Planalto, mas ontem já começou a dar sinais de que pretende embarcar nesse ônibus partidário, aderindo a Alckmin.
O próprio Temer atuou vigorosamente para que o centrão não apoiasse o candidato do PDT, Ciro Gomes, tornando inevitável o apoio ao candidato tucano. São sinais explícitos da incoerência do quadro partidário brasileiro. É tão estranho o empresário Josué Gomes negociar, ao mesmo tempo, com o PT e Alckmin, quanto o centrão ser cobiçado da extrema direita à extrema esquerda.
Esta eleição está mostrando que, do jeito que as coisas estão, elas não podem continuar. O quadro partidário está completamente falido, tem que começar do zero e reorganizar as bases partidárias. Nossa política está uma geleia geral, ninguém sabe quem é quem, e não se pensa em bases programáticas, o que só traz prejuízos à democracia.
Ainda vamos ter um Congresso pouco renovado, com este esquema partidário funcionando, mas ele está a caminho do fim. A questão agora é compatibilizar a vontade do centrão de se afastar do governo que o acolheu até recentemente, e a necessidade do MDB de estar do lado vencedor na eleição de outubro.
Tudo indica que Henrique Meirelles vai ser abandonado, se não logo na convenção partidária, provavelmente durante a campanha. A indefinição atual favorece o grupo do senador Renan Calheiros, que vem trabalhando para derrotar Meirelles na convenção e pode conseguir que o partido decida não ter candidato, liberando sua enorme bancada.
Mas essa decisão só favoreceria Renan Calheiros, pois o MDB institucionalmente perderia a chance de mostrar sua força dentro do futuro bloco governista. Dividido na eleição, o MDB provavelmente continuará com uma bancada poderosa, fazendo valer o velho axioma da política brasileira: o MDB não consegue eleger o presidente da República, mas nenhum presidente governa sem o MDB.