Disputa está tão radicalizada que centro pode ser representado por Ciro, irascível e de ideias econômicas ultrapassadas
O resultado da pesquisa do Datafolha parece ter reaberto a possibilidade de surgir uma terceira via pelo centro contra os extremos. Ciro Gomes busca esse caminho de volta às suas origens, depois de ter flertado com a esquerda nos últimos anos. Apresenta-se como centro político, nem esquerda nem direita, e parece estar mais conectado ao espírito dos tempos atuais, que favorece os candidatos mais assertivos, sem importar muito se suas promessas e ideias são factíveis. A disputa está tão radicalizada que o centro pode ser representado por Ciro, um político irascível e com ideias econômicas ultrapassadas, como proibir a fusão da Embraer com a Boeing.
Em carta publicada no Facebook, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso faz um apelo em favor da união de candidaturas de centro para eleger o que chamou de candidatos “mais capazes”. A possibilidade de o eleitorado estar, afinal, buscando a via do meio faz com que candidatos mais genuinamente desse campo, como o tucano Geraldo Alckmin e Marina Silva, da Rede, animem-se. Seria um sinal de que os extremos em provável disputa num segundo turno preocupam o eleitorado.
O candidato tucano ficou estagnado, o que pode ser uma ótima notícia a esta altura do campeonato. Numa visão otimista, ele estaria empatado com Ciro Gomes na disputa do terceiro lugar, isto se diminuirmos dois pontos de Ciro e dermos mais dois para o tucano, num exercício de boa vontade na margem de erro.
É claro que Ciro também faz a leitura da margem de erro a seu favor. Se aumentarmos dois pontos para ele e diminuirmos dois de Haddad, o pedetista estaria empatado com o petista, numericamente à frente.
Mesmo Marina, que continua em tendência de queda, considera que a pregação de temperança na disputa política pode ir ao encontro do desejo mais recôndito do eleitor, que estaria envolvido por radicalizações políticas, mas despertou a tempo. Esse é o espírito de um filmete que está sendo divulgado por sua campanha na internet.
O petista Haddad, à medida que o eleitorado o vai identificando como o candidato de Lula, aumenta também sua rejeição. Já mais de 70% dizem conhecê-lo bem, e mais de 60% o identificam como o candidato de Lula. Na pesquisa do Datafolha seu crescimento foi menor que o verificado pelo Ibope, mas as pesquisas foram feitas com métodos diferentes e, sobretudo, em dias diferentes, e só uma próxima poderá afunilar os resultados em uma mesma direção, ou não.
Todos os candidatos de centro negam se a unir-se em torno de um só nome, apesar de diversos apelos, e da reafirmação do autointitulado centro democrático da necessidade de união para derrotar os extremos.
A Região Nordeste, onde Lula, e agora Haddad, lidera com folga, é o novo campo de batalha para Bolsonaro, que tentará anular a força do petista na região. Mas Ciro também tem uma visão positiva do eleitorado nordestino, acreditando que conterá a subida de Haddad.
Na análise de sua assessoria, o slogan “Haddad é Lula e Lula é Haddad” funciona apenas na propaganda eleitoral, não é assim na vida real. Há um levantamento que indica que o desempenho de Lula no Nordeste, no passado, não foi diretamente relacionado com a votação de Ciro Gomes nos estados da região.
A votação de Ciro Gomes, comparando o pleito de 1998 (quando foi eleito Fernando Henrique) com o de 2002 (eleito Lula), cresceu em quatro estados. Na Bahia, o maior eleitorado da região, a votação de Ciro cresceu cerca de 40%. No Ceará, a votação cresceu cerca de 10%. Em um deles, Pernambuco, a votação foi em percentual praticamente semelhante. O petista cresceu de 1998 para 2002, tirando a maioria de seus votos de outros candidatos, entre eles do PSDB.
Esta realidade se repete agora. Ciro não perde votos na região para Haddad. Com base nestas informações, a avaliação é que a votação de Ciro vai crescer na região, e que Haddad, para crescer, terá de repetir Lula e tirar votos de outros candidatos. Só que o candidato petista não é Lula nem carregará todos os votos de seu líder.
Pelo Datafolha, Haddad já conseguiu a transferência de cerca de 40% das intenções de voto em Lula, mas faltam pouco mais de 15 dias e sua subida, ao contrário do que aponta o Ibope, não está no ritmo necessário. Para chegar ao segundo turno, porém, Ciro terá que convencer o eleitorado de centro de que não é um mero apêndice de Lula. Por isso, tem exacerbado suas críticas a Haddad e ao PT. Mas procura poupar Lula.