Merval Pereira / O Globo
A batalha do presidente Bolsonaro com a Petrobras pelo preço da gasolina, do diesel e do gás resume o que historicamente acontece no Brasil em anos eleitorais. Também a distribuição de verba pública para a população, como o repasse do dinheiro do FGTS e o novo Bolsa Família turbinado, está incluída em estudos que mostram quão poderoso é o efeito de políticas de rendas nos períodos eleitorais.
As maiores quedas de pobreza acontecidas no Brasil nos últimos anos se deram em anos eleitorais. São planos, porém, que geram custos sociais traduzidos em desemprego mais alto e renda mais baixa. Historicamente, nos últimos 40 anos pelo menos, a utilização de políticas monetárias, fiscais e cambiais com claros objetivos político-eleitorais gera “Ciclos Políticos de Negócios” (CPNs), cuja principal característica é a redução do desemprego em períodos pré-eleitorais, resultante de políticas cujo objetivo seria proporcionar um ambiente positivo capaz de influenciar o resultado eleitoral.
Após esse período de crescimento, no entanto, o pós-eleitoral é caracterizado por inflação em alta, cuja consequência é a adoção de políticas macroeconômicas contracionistas. A maxidesvalorização de 1983 ou a desvalorização do real em 1999, depois da eleição, são exemplos típicos desse fenômeno. Essa instabilidade, além de problemática do ponto de vista ético, é danosa à taxa de crescimento de longo prazo da economia.
O economista da FGV-Rio Marcelo Neri, que estuda essa característica brasileira, tem alguns exemplos históricos a ressaltar. Em 1986, o Plano Cruzado, lançado pelo governo Sarney em fevereiro, teve a duração de nove meses e foi substituído pelo Plano Cruzado II, seis dias depois de o governo ter obtido a maior vitória eleitoral da História da República: elegeu 22 de 23 governadores e quase dois terços da Câmara e do Senado e das Assembleias Legislativas.
Com os salários congelados havia nove meses, a população sofreu aumentos num só dia de 60% no preço da gasolina e 120% nos telefones e energia, entre outros. Segundo os estudos de Neri, a comparação pré e pós-eleitoral em 1986 revela que a proporção de indivíduos que obtiveram redução de renda é superior, no período pós-eleitoral, para todas as faixas de educação, o que identificaria os planos como oportunistas. Em 1989, à semelhança de 1986, houve um componente oportunista: a queda de renda no período pós-eleitoral, quando comparado ao período pré-eleitoral, foi generalizada.
Em 1994, o Plano Real não tinha características oportunistas e promoveu melhor o desempenho de renda no período pós-eleitoral. Os grandes beneficiários do surpreendente boom pós-eleitoral foram os analfabetos, o que certamente levou à vitória de Fernando Henrique à Presidência. O ano de 1998 apresenta proporções de redução de renda em níveis bastante superiores aos observados nos três episódios pré-eleitorais anteriormente analisados. Segundo Neri, devido às crises externas, o governo não teve a oportunidade de gerar um ambiente eleitoral propício, mas apenas postergou a adoção de medidas impopulares como a desvalorização cambial, que afetaram decisivamente a avaliação do governo tucano.
A eleição de Dilma Rousseff em 2010 custou ao país uma grave crise econômica, gerada pela gastança do governo petista, que produziu um crescimento do PIB de 7,5% no ano eleitoral. A partir daí, o governo Dilma não teve condições de reorganizar as finanças públicas e, com sua “nova matriz econômica”, levou o país à bancarrota.
Michel Temer, que assumiu a Presidência com o impeachment de Dilma, não teve condições políticas de fazer malabarismos econômicos na sucessão e acabou alijado da disputa presidencial, que chegou a acalentar. A polarização ficou entre o PT, com Haddad, e Bolsonaro, que agora retoma a prática de distribuir bondades para tentar se reeleger.
Fonte: O Globo
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