Chamar o ex-juiz Sérgio Moro de extremista de direita é evidentemente um abuso de linguagem com objetivo político. O presidente da Câmara Rodrigo Maia e a direção do Democratas, inclusive seu presidente ACM Neto, estão há tempos participando dos preparativos para o lançamento da candidatura de Luciano Huck à presidência da República, e o encontro dele com Moro em Curitiba deve tê-los apanhado de surpresa, daí a reação exagerada.
Como uma parte independente do Centrão, o DEM tem que zelar pela capacidade de aliança do grupo, e Moro é figura non grata de todo político apanhado na malha da Lava-Jato, ou que pode vir a ser. Sobram poucos que apóiam ainda a maior operação de combate à corrupção já realizada no país, e Moro, por falta de traquejo político, não se aproxima nem mesmo desses.
Também a esquerda esperneou com a aproximação de Huck com Moro, tendo o presidente do Partido Socialista a classificado de “erro crasso”. Para quem pretende expressar uma candidatura de centro-esquerda, Luciano Huck foi além dessa bolha, praticando o que o presidente do Cidadania, Roberto Freire, define como a saída para enfrentar a polarização em 2022: aceitar todos os que pretendem a derrota de Bolsonaro, sem idiossincrasias.
A eleição de Joe Biden nos EUA provou que, contra um extremista de direita, o melhor é uma pessoa de centro, não um extremista de esquerda. Em 2018, no Brasil, tivemos um embate entre direta e esquerda e as candidaturas de centro não foram adiante porque se queria uma disputa sangrenta, uma agressividade na campanha que o centro não oferecia.
Mas depois de dois anos de Bolsonaro e quatro de Trump, fica claro que cansa essa situação permanente de tensão, de agressividade e de disputas políticas que chegam a ser guerra. Bolsonaro está em permanente guerra, e foi o que aconteceu com Trump, que durante quatro anos colocou os EUA de cabeça para baixo, incentivou a violência e a agressividade de seus seguidores.
Aqui, a tendência deve ser essa também, de as pessoas cansarem do Bolsonaro, cujo único propósito é atacar e destruir, sem criar nada. Um candidato de centro, com capacidade de confrontar Bolsonaro e chamar os eleitores para uma reconciliação nacional pode derrotá-lo. Uma candidatura com visão mais social do país, visando a redução da desigualdade, terá mais chance de vitória. Mesmo porque a economia está mal, e não dá sinais de recuperação.
A questão será definir quem é quem no espectro político nacional. O Centrão é de direita ou extrema-direita? Ciro Gomes é de esquerda, de centro, ou de extrema-esquerda? Houve época em que Rodrigo Maia não queria saber de esquerda na hipotética formação de um novo partido, que deveria ser de centro-direita. Hoje, um partido de centro-esquerda é o objetivo dos que se preparam para confrontar Bolsonaro em 2022.
Classificar Moro de extrema-direita por ter participado do governo Bolsonaro é acatar a tese de que ele aceitou o convite não para fortalecer o combate à corrupção, mas para obter benefícios pessoais. Se fosse assim, teria aderido às insanidades de Bolsonaro e permanecido no governo, aguardando uma vaga para o Supremo Tribunal Federal (STF).
Pode ter ficado mais tempo do que devia, acreditando poder conseguir êxitos que só seriam possíveis com um governo empenhado no combate à corrupção, e não nesse de Bolsonaro, que tem tanto a esconder quanto os políticos do Centrão que o cercam.
Pode ter sido ingênuo ao aceitar o cargo, e ao permanecer nele, e essa não é uma qualificação que o habilite a ser candidato à presidência da República. Não é possível imaginar-se que a história se repita, mas é preciso aprender com os fatos. Joe Biden, protótipo do político tradicional de centro, já desde a vitória de Obama sentiu o espírito do tempo e foi capaz de dar uma resposta convincente.
Derrotou a esquerda partidária nas primárias, mas ganhou o apoio do senador Bernie Sanders e da senadora Elizabeth Warren, e chamou a deputada Alexandra Ocasio-Cortez, fenômeno da nova esquerda, para participar da formulação de seu programa de governo.