Mauricio Huertas: O pós-PT e o fim da esquerda jurássica

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Foto: Ricardo Stuckert
Foto: Ricardo Stuckert

Começou a disputa pelo espólio petista, que deverá se intensificar na medida em que as condenações judiciais, somadas à idade avançada de Luiz Inácio Lula da Silva, vão tirá-lo definitivamente do cenário eleitoral brasileiro. E, ainda que a militância esteja empenhada em seguir seu guru e instintivamente preservar a espécie, não haverá narrativa de golpe que pare em pé diante do julgamento inapelável da maioria da população, muito mais austera e intransigente que qualquer promotor ou juiz da Operação Lava Jato.

Talvez esse afastamento involuntário das urnas leve à extinção de uma esquerda jurássica monopolizada por Lula e pelo PT, possibilitando inclusive que o inventário dessas últimas décadas reposicione as coisas no seu devido lugar, dado que Lula nunca foi de fato um esquerdista, mas somente um populista que se apossou de bandeiras da esquerda, na falta de representação mais apropriada e competente, desde a sua origem sindical e principalmente após se tornar o maior líder de um partido que reunia em sua base trabalhadores, intelectuais, artistas e movimentos comunitários ligados à igreja católica.

Como bem definiu o comunista Luís Carlos Prestes no final da década de 1980: “O PT não tem propriamente ideologia. O PT é um partido burguês como qualquer outro partido, porque no Brasil ninguém nasce comunista. Todos nós nascemos sob a influência da ideologia burguesa. Não se muda de ideologia, e nem o Lula, que é o chefe, mudou… A ideologia dele é a ideologia da burguesia, porque todos nós nascemos filiados a essa ideologia da burguesia. Só se ele estudasse o marxismo é que ele poderia então mudar de ideologia.”

E concluiu, categórico: “Toda a minha crítica ao Lula é no sentido de levá-lo a estudar o marxismo, a ciência do proletariado, mas ele vê na minha crítica um ataque a ele, quando não há ataque nenhum. Eu penso que ele é um operário talentoso – de grande talento, mesmo – que organizou massas em torno do nome dele. Isso já é um motivo de admiração. Mas está muito longe ainda de ter uma ideologia do proletariado.”

Perdoe desenterrar Prestes, em pleno centenário da Revolução Russa, depois de quase três décadas de sua morte e às vésperas dos 120 anos do seu nascimento, que será celebrado em 2018. Mas falar sobre a esquerda no Brasil sem recorrer à opinião abalizada do maior e mais emblemático nome do comunismo neste país seria praticamente um insulto à história e à realidade dos fatos. Recorra-se então a Prestes para compreender que Lula e o PT acabaram se tornando ícones de uma esquerda de fachada, cosmética, ornamental, pragmática, pouco assentada nos verdadeiros princípios teóricos do socialismo e do comunismo, muito mais próxima das práticas da social-democracia, mas que na transição fraudulenta entre o que pregava em 20 anos na oposição e o que executou em 13 anos no governo acabaria por enxovalhar definitivamente o rótulo de esquerda no Brasil.

Quem, afinal, disputa hoje a herança lulista? Políticos na faixa dos 60, 70 anos, como Jaques Wagner, Chico Alencar, Eduardo Jorge, Marina Silva, Cristovam Buarque, Fernando Gabeira, Roberto Freire, Ciro Gomes? Ou, ainda, quem será a nova geração que despontará na esquerda brasileira? No PT, Gleisi Hoffmann, Lindbergh Farias, Fernando Haddad? No PSOL, Marcelo Freixo, Luciana Genro, Jean Wyllys? Coletivos como a Mídia Ninja? Movimentos como o MTST de Guilherme Boulos?

Ora, esse Boulos, por exemplo, o novo queridinho dos artistas globais metidos à esquerdistas, é simplesmente um invasor da propriedade alheia, depredador do patrimônio público e privado, usurpador da ordem constitucional estabelecida. Burguesinho bem nascido, estudioso das teorias fossilizadas de esquerda pré-histórica e marqueteiro de um incompreensível “poder popular”, que pode surgir agora do âmbar como candidato salvador das viúvas de Lula pelo PSOL ou pelo próprio PT.

Ainda que devamos repeitá-lo pessoalmente, o que ele representa como figura pública? Quem o conhece minimamente das manifestações e ocupações em São Paulo, principalmente em áreas de mananciais (como o Parque dos Búfalos, invadido na gestão cúmplice e omissa do prefeito moderninho Fernando Haddad), com seu exército de soldados manipulados e alistados na base de pontos ganhos por tarefa cumprida, não pode crer que essa excrescência é o que se apresenta como futuro da esquerda no Brasil.

Feito o estrago, como nunca antes na história deste país, resta aos ideólogos de uma sociedade mais justa, igualitária, fraterna e solidária, em tese definidos como esquerdistas (essencialmente os democratas, não extremistas), reunirem seus remanescentes e se juntarem ao chamado centro democrático e até mesmo à direita mais liberal, ou entregarem de vez os pontos para os retrógrados e conservadores da direita radical, intolerante, sectária, preconceituosa, intransigente, totalitária e saudosa da ditadura militar.

Estamos em uma encruzilhada histórica. As conquistas democráticas, a salvaguarda constitucional dos nossos direitos, o aconchego das nossas liberdades, a infalibilidade das instituições republicanas, a vitalidade e o bem-estar do nosso povo estão sob violenta ameaça, à esquerda e à direita, por uma horda de irresponsáveis, inconsequentes, levianos, desajuizados, inescrupulosos e insanos. Precisamos nos unir pelo Brasil!

* Mauricio Huertas, jornalista, é secretário de Comunicação do PPS/SP, diretor executivo da FAP (Fundação Astrojildo Pereira), líder RAPS (Rede de Ação Política pela Sustentabilidade), editor do Blog do PPS e apresentador do #ProgramaDiferente

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