Governo brasileiro precisa recorrer a medidas que reduzam a dependência de Juan Guaidó
O governo Bolsonaro começou a entregar sua promessa de redobrar a pressão contra a ditadura venezuelana.
O Brasil reconheceu Juan Guaidó, presidente da Assembleia Nacional em Caracas, como o legítimo chefe de governo venezuelano. No Twitter, o chanceler Ernesto Araújo aproveitou para chamar Nicolás Maduro de “ex-presidente”.
Poucas horas depois, os americanos fizeram o mesmo. Aproveitando o movimento, o vice-presidente Mike Pence prometeu apoiar o povo venezuelano, caso ele “levante a sua voz num pedido de liberdade”.
Os protestos de rua ocorridos nesta quarta-feira (23) contra Nicolás Maduro só dão fôlego adicional ao Palácio do Planalto. Nos próximos dias, numerosos países seguirão a coalizão sul-americana a reboque.
A implicação imediata disso tudo é elevar o passe de Bolsonaro junto ao governo dos Estados Unidos. O presidente brasileiro se apresentará como esteio da estabilidade regional.
Se a tese segundo a qual Guaidó é o melhor caminho para uma transição democrática ganhar força, também sairá fortalecido o ministro das Relações Exteriores, um de seus mais ativos artífices.
O problema é que essa estratégia tem um problema.
Guaidó está longe de ser uma liderança consolidada. Ele não conta com base ampla nem controla as ruas. Seu programa de governo é vago, utópico e não oferece plataforma crível para a construção da coalizão que será necessária num esforço de restauração da democracia.
Por isso, o Brasil precisa complementar esse trabalho com outras medidas que reduzam a dependência de Guaidó.
A primeira é a necessidade urgente de diálogo entre o Brasil e as Forças Armadas venezuelanas. Hoje, esse canal não existe, mas não há saída para a crise do país vizinho que exclua os militares.
A construção desse canal também importa porque, ao menos no primeiro momento, Maduro vai redobrar a repressão contra a população.
A segunda medida diz respeito à construção de pontes com aqueles líderes políticos venezuelanos que têm máquina e influência real.
Muitas vezes, trata-se de gente jovem que, outrora chavista, se posiciona agora contra Maduro. Os governadores das províncias de Miranda e Carabobo são exemplos disso.
Se houver um levante popular generalizado e duradouro, então essa gente terá papel decisivo na construção de soluções para a crise no futuro.
Por fim, está a questão da China e da Rússia, as duas potências que ainda apoiam o regime venezuelano. A capacidade brasileira de pressionar esses países é quase nula. Mas o argumento de que eles ganharão mais sendo parte da solução do que do problema precisa ser feito um dia. Esta é uma boa hora para começar.
*Matias Spektor é professor de relações internacionais na FGV.