Insegurança jurídica é um dos grandes empecilhos no Brasil
A semana foi movimentada em Brasília. Não só foi aprovada a Medida Provisória (MP) 870, que reestrutura a máquina administrativa do governo federal, como também outras MPs foram apreciadas na data-limite em que venciam suas vigências.
Para o setor ambiental, no entanto, o resultado não foi bom. Não só caducou a MP 877, que estabelecia o novo Marco Regulatório para o Setor de Saneamento, como se estabeleceu enorme polêmica acerca da MP 867, que previa inicialmente apenas a prorrogação de prazos para a efetiva implantação do Código Florestal, votado em 2012.
A discussão sobre a convivência entre crescimento econômico e preservação ambiental não é nova. Antes da década de 70, a preocupação não era central. Apenas em 1972 foi realizada a 1ª Conferência Mundial sobre Meio Ambiente, em Estocolmo. Em 1992, promovemos no Brasil a Rio-92, a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. O Brasil assumia protagonismo no tema em escala global.
Em 2012, num dos momentos mais marcantes de minha passagem pela Câmara, tivemos uma rica experiência de exercício da democracia, com um intenso debate entre ambientalistas e setor produtivo, e conseguimos aprovar o Código Florestal. O relator da matéria, o então deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), conseguiu produzir uma síntese equilibrada entre o estímulo à produção rural e a proteção ao meio ambiente.
Passaram-se sete anos. Ao final do governo Temer, foi enviada a MP 867, que em seu texto original de poucos artigos previa apenas a prorrogação dos prazos para o cadastramento voluntário dos produtores rurais, passo inicial para a implantação dos programas de regularização ambiental.
Mas a Comissão Especial Mista introduziu uma infinidade de emendas ao texto que resultaram num projeto de conversão em lei que adulterava de forma radical a lógica do Código Florestal.
A Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (Raps) e a Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura promoveram um intenso debate sobre os riscos presentes em tal retrocesso.
Primeiro, seria uma traição à esmagadora maioria de produtores rurais que, voluntariamente, se cadastraram, preparando o terreno para a implantação de seus programas de regularização ambiental.
Segundo, a insegurança jurídica é um dos grandes empecilhos no Brasil à retomada do desenvolvimento. Como obter um ambiente de confiança e credibilidade se leis estruturantes, configuradas em códigos, longamente debatidas, são alteradas por “caronas” em MPs, que têm rito sumário de deliberação em 120 dias de tramitação legislativa e se prestam apenas para matérias urgentes? É uma contradição o Congresso Nacional adotar esses expedientes diante de sua demanda histórica de limitar as MPs e recuperar suas prerrogativas.
As mudanças introduzidas têm implicações na credibilidade do país, afetam acordos internacionais, anulam a Lei da Mata Atlântica, anistiam o desmatamento de vastas áreas e carregam uma visão atrasada de antagonismo entre geração de renda, produção e emprego e a preservação ambiental.
Felizmente, o Senado Federal se negou a votar de afogadilho tema tão complexo. Tomara que um diálogo mais profundo nos leve a bom porto e preserve o protagonismo do Brasil na questão ambiental e a sustentabilidade necessária para o nosso desenvolvimento.