Os espetáculos pirotécnicos que encantam multidões já se apagaram nos céus; a troca de mensagens de esperança e fé entre as pessoas já produziu seu efeito propulsor de novas energias; os discursos de posse já foram dissecados e registrados para a posteridade. Agora é hora de arquivar a retórica e o ambiente festivo, arregaçar as mangas, encarar a crise e colocar a mão na massa em busca de soluções. A gravidade da situação é tão grande, que não podemos perder um minuto. O país tem pressa.
No conjunto de desafios e gargalos nacionais a serem enfrentados, um é absolutamente central: a reforma da Previdência. O maior obstáculo à retomada do desenvolvimento econômico e social no Brasil é o profundo desequilíbrio nas finanças públicas. E o aspecto-chave é encontrar uma equação adequada para o nosso deficitário sistema previdenciário.
A Previdência Social foi o elemento central na configuração do Estado do bem-estar social, que marcou o nascimento da social-democracia no mundo. A luta dos trabalhadores e a evolução da consciência social impunham a humanização do chamado “capitalismo selvagem”. Tarefas que eram supridas pelas famílias e organizações filantrópicas começaram a ser absorvidas pelo Estado. O avanço civilizatório determinava que se conferisse dignidade à velhice, à doença e à pobreza extrema.
Leis esparsas surgiram na Inglaterra e na Áustria. Mas foi a Lei do Seguro Social, introduzida por Bismark, em 1883, na Alemanha, que progressivamente previu o seguro- doença, o seguro contra acidentes de trabalho, a cobertura para a invalidez e para os idosos. Depois, vieram Dinamarca, Suécia, Argentina, Uruguai, Chile, EUA. O México foi o primeiro a constitucionalizar a questão, em 1917.
O espírito essencial era proteger o trabalhador pobre quando perdesse sua capacidade laborativa. O pressuposto é que os setores de maior renda acumulam poupança e patrimônio ao longo da vida e a Previdência deveria garantir uma renda mínima para idosos, inválidos e miseráveis.
Mais recentemente, com as mudanças demográficas no mundo contemporâneo – onde, graças aos avanços tecnológicos e à melhoria geral da qualidade de vida, estamos vivendo muito mais, e, por outro lado, à tendência universal da queda da taxa de natalidade –, os sistemas previdenciários começaram a entrar em crise, exigindo mudanças em todo o mundo.
Essa é uma realidade em todos os países, mas no Brasil é agravada por distorções acumuladas por décadas. Todo sistema previdenciário tem que atender duas características: ser justo e sustentável. O nosso sistema não é justo nem sustentável. É impressionante que, num país tão desigual como o Brasil, um instrumento criado para promover justiça social seja produtor de privilégios e desigualdades.
Na próxima semana procurarei demonstrar a iniquidade e a insustentabilidade de nosso sistema, discutir seus efeitos e as saídas para tão grave dilema.