Apesar do revés com ritmo de recuperação, humor e apoio à política econômica mais liberal vão continuar melhorando
Na última sexta-feira fiz uma apresentação em seminário promovido pela Amcham em São Paulo onde me concentrei em mostrar a natureza atípica da recessão que vivemos nos últimos seis anos. Algo muito parecido com o conteúdo da minha coluna no Valor de janeiro passado, apenas com mais recursos audiovisuais do que um jornal impresso. O objetivo era mostrar, através de gráficos, o comportamento semelhante de uma série de indicadores de natureza econômica, inclusive de expectativas futuras dos agentes, na formação da bolha de demanda entre 2010 e 2014 e sua posterior ruptura entre 2015 a 2017.
Em todos eles temos o mesmo padrão: visualização do início da fase de formação da bolha com a curva da variável do gráfico se afastando da linha de tendência histórica e formando uma corcova para cima no gráfico. Posteriormente, com a explosão da bolha, a mesma corcova invertida se formando agora abaixo da linha de tendência. Finalmente, a partir de 2018, uma nova linha de tendência de crescimento se forma com uma inclinação ainda muito reduzida.
Pretendia contradizer a afirmação, sempre presente na mídia brasileira, de que vivemos a mais lenta das recuperações cíclicas da economia dos últimos tempos. Esta afirmação é incorreta pois não leva em conta a natureza da crise que vivemos sob o governo do PT, também ela nunca vista antes neste país. E esquece ainda que a macroeconomia da crise provocada por uma bolha de consumo como a que vivemos é diferente de recessões que ocorrem em um fim de ciclo econômico.
Por isto, agora em 2020, também a trajetória da recuperação deve levar em consideração os vários resíduos de bolha que ainda existem na economia além das limitações que ainda existem para uma política fiscal anti-cíclica. O mais grave destes resíduos é certamente a elevada taxa de desemprego, que ainda permanece. Como tenho ressaltado, o que está impulsionando o crescimento do consumo é o aumento da população empregada e uma elevação de cerca de 2% do salário real, alavancado pelo crédito bancário.
Mas fazem falta pelo menos três milhões de brasileiros com sua renda reduzida pelo fato de estarem fora do mercado de trabalho e que somente devem recuperar seus empregos ao longo de três ou quatro anos. Outros resíduos que dificultam a retomada, como batalha pela estabilização fiscal e a enorme ociosidade da indústria brasileira, vão pesar em 2020 e limitar a velocidade da recuperação cíclica em andamento.
Estas dificuldades foram lembradas agora aos analistas mais otimistas – inclusive eu – com a clara desaceleração havida neste final de ano. Tomo prova desta afirmação as revisões que estão sendo feitas por várias instituições financeiras sobre o crescimento do PIB no último trimestre de 2019. Há algumas semanas o número mais citado era da ordem de 0,6% o que corresponderia a uma velocidade anual de mais de 2% ao ano na virada de 2010. Hoje os números estão sendo revistos para algo como 0,4% o que corresponde a uma velocidade anual composta de 1,6%.
Com este crescimento mais baixo no último trimestre de 2019, precisa ocorrer uma aceleração da economia nos próximos meses – o que quer dizer hoje do consumo das famílias – para que possamos chegar a um crescimento anual, em 2020, próximo de 2,5%. Apesar da ducha de água fria nos mais animados com a recuperação cíclica, que está ocorrendo mesmo um número próximo de 2%, deve continuar a melhorar o humor e o apoio da sociedade à alternativa de política econômica mais liberal.
Finalmente quero tratar nesta coluna da questão da alta volatilidade da cotação do real nos mercados de câmbio e que tem sido citado por um certo grupo de analistas como um sinal de alerta a ser considerado. A grande causa desta volatilidade recente tem sido o rápido e brutal ajuste nas taxas reais de juro da economia medida pela Selic. Aliás a Selic explica também o movimento no índice Ibovespa, que chegou a dobrar de valor no final de 2019 simplesmente porque a taxa de desconto sobre lucros futuros das empresas brasileiras passou de 12% ao ano para menos de 7%.
No caso da taxa de câmbio foi a queda do juro real na economia que fez com que todo um grupo de rentistas no exterior zerasse suas aplicações em reais e buscasse outras freguesias para aplicação de seus recursos. Neste movimento racional trocaram reais por dólares, pressionando a taxa cambial da moeda brasileira. A este movimento o Banco Central respondeu corretamente equilibrando, por intervenção sua, a demanda por dólares, vendendo inclusive dólares de sua reserva externa.
Ao fazer esta troca provocou uma redução expressiva da conta de juros paga pelo Tesouro em sua dívida pública. Paralelamente outro movimento de ajuste no mercado de câmbio ocorreu com várias empresas brasileiras aproveitando juros reais mais baixos nas operações de crédito junto aos bancos brasileiros para reduzir seu endividamento em moedas estrangeiras. Mais uma vez a troca de dólares por reais gerou volatilidade nas operações cambiais.
Finalmente, com a queda dos juros nos mercados interbancários (DIs) a níveis muito baixos os especuladores de curto prazo migraram para o mercado de câmbio e vem tentando repetir o que sempre ocorre no Brasil quando a volatilidade do real aumenta; ganhar um dinheirinho extra.
*Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro e economista, é presidente do Conselho da Foton Brasil. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações.