Luiz Carlos Azedo: Sai Lula, entra Haddad

“O julgamento frustrou as intenções petistas de utilizar todos os prazos possíveis para Lula permanecer como candidato. Mas isso não significa que a estratégia eleitoral do PT tenha fracassado”.
Foto: Ricardo Stuckert
Foto: Ricardo Stuckert

“O julgamento frustrou as intenções petistas de utilizar todos os prazos possíveis para Lula permanecer como candidato. Mas isso não significa que a estratégia eleitoral do PT tenha fracassado”

Não se pode dizer ainda que a estratégia eleitoral do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para levar o PT de volta ao poder tenha fracassado, uma vez que a impugnação de sua candidatura pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estava escrita nas estrelas e na Lei da Ficha Limpa. Entretanto, estão dadas todas as condições para o PT transferir os votos cativos de Lula para o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, com a decisão daquela Corte de permitir que o ex-presidente da República, mesmo impugnado e preso, apareça como apoiador de seu substituto nos programas eleitorais de tevê, rádio e internet.

Lula não é um proscrito político num regime de exceção, como pretende fazer crer o PT e muita gente acredita, principalmente no exterior. Lula está preso porque foi condenado a 12 anos e um mês de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex de Guarujá, ou seja, por receber vantagens indevidas no cargo de presidente da República e ocultar seu patrimônio, o que não é incomum na política brasileira. É o mais ilustre condenado pela Operação Lava-Jato, que mandou para a cadeia outros ex-dignatários. Por essa razão, insistir na narrativa do “preso político” no horário eleitoral será uma afronta à democracia e à Justiça eleitoral.

“O Brasil é um Estado democrático de direito. Não estamos sob regime de exceção. Todas as instituições estão em funcionamento regular. O Poder Judiciário é independente. Os juízes de primeira e segunda instâncias são providos em seus cargos por critério exclusivamente técnico, sem vinculação política. A defesa pode perfeitamente alegar erro judiciário, mas não se mostra plausível o argumento de perseguição política”, disse o ministro Luís Barroso, relator do caso, no julgamento que entrou pela madrugada de ontem, em resposta aos argumentos da defesa em favor da candidatura de Lula.

Com o único voto divergente do ministro Édson Fachin (a favor de uma autorização provisória para que Lula concorresse, apesar de considerar o petista inelegível por conta da Lei da Ficha Limpa), a candidatura de Lula foi impugnada por seis a um na sessão extraordinária do TSE. Os ministros decidiram evitar que Lula aparecesse como candidato nos programas oficiais do PT de rádio, tevê e internet, iniciados ontem. De certa forma, o julgamento frustrou as intenções petistas de utilizar todos os prazos possíveis para Lula permanecer na mídia como candidato. Mas isso, como já dissemos, não significa que a estratégia eleitoral do PT tenha fracassado. Vejamos:

A última pesquisa semanal XP-Ipespe que monitora o cenário eleitoral e tem grande influência no mercado financeiro, no último dia 29 de agosto, demonstrou que a capacidade de transferência de votos entre os candidatos do PT é significativa. No cenário com Lula, o petista liderava a disputa com 33% de intenção de votos, seguido por Jair Bolsonaro (PSL), com 21%. Ciro Gomes (PDT) tinha 8%, Marina Silva (Rede) e Geraldo Alckmin PSDB) empatavam com 7%; João Amoedo (Novo), 4%, e Alvaro Dias (Podemos), 3%. Henrique Meirelles (MDB) e Guilherme Boulos (PSOL), 1%. Com Lula fora da disputa, Bolsonaro subia para 23%, Marina Silva para 13%, Ciro para 10%, Alckmin para 9% e Haddad aparecia com apenas 6%, à frente de Alvaro e Amoedo, empatados com 4%. Boulos e Meirelles não se mexiam; o Cabo Daciolo aparecia pela primeira vez, com 1%.

O substituto
Entretanto, quando o nome de Haddad é apontado com o indicado por Lula para substituí-lo, o quadro se altera completamente: Bolsonaro reflui para os 21% do primeiro cenário e Haddad aparece em segundo, com um índice cabalístico: 13% de intenções de votos. Ciro e Marina empatam com 10%, Alckmin com 8%, Alvaro e Amoedo com 4%, Meirelles, Boulos e Daciolo com 1%. Vê-se que a narrativa de “vitimização” de Lula neutralizou as denúncias de corrupção em seu governo e sua condenação por crime de colarinho branco. A capacidade de transferência de voto do petista, pela simples indicação de seu substituto, às vésperas do julgamento, estava em 32%. Espontaneamente, porém, 11% dos votos de Lula se deslocam para Ciro e aproximadamente 7%, para Marina Silva.

Mesmo preso em Curitiba, Lula se manteve na mídia e conseguiu ser o líder absoluto das pesquisas de intenção de voto, o que corroborou a narrativa de perseguição política. Com a decisão do TSE, essa presença será ampliada, pois Lula poderá aparecer de forma recorrente nos programas eleitorais como apoiador de Haddad. Entretanto, não poderá se passar por vítima de perseguição, porque isso certamente será contestado pelos adversários, que quererão tirar os programas do ar na Justiça Eleitoral.

Como aquele copo meio cheio, meio vazio, com 13% de intenções de votos, Haddad não terá um passaporte garantido para o segundo turno, mas estará mais próximo disso do que os demais concorrentes de Bolsonaro. Vamos ver se esse cenário se confirma na próxima semana. A campanha será brevíssima, mas há outras variáveis. A primeira delas é a mudança no ambiente eleitoral, que se deslocou das redes sociais para as ruas e as casas dos eleitores, por causa dos telejornais e da propaganda de tevê e rádio. Somente Bolsonaro e Ciro vinham mantendo uma agenda de rua quase diária, os demais candidatos estavam mais circunscritos aos ambientes fechados. Alckmin, Haddad e Meirelles têm mais tempo de televisão e rádio, mas só agora saberemos o peso real dessa vantagem estratégica nas eleições. Uma surpresa é Amoedo, que se destacou nas redes sociais, na qual predominavam Bolsonaro e Marina.

Nas entrelinhas: Sai Lula, entra Haddad

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