Luiz Carlos Azedo: A razão das incertezas

A primeira grande definição do processo eleitoral está fora da esfera de decisão dos partidos, do Congresso e dos governos: é o julgamento de Lula

Há um grande divórcio entre o que está sendo chamado de centro democrático e a grande massa do eleitorado que busca uma solução segura para os problemas do país, mas que ainda não consegue identificar uma alternativa para isso. Uma vez que as projeções eleitorais para este ano, com base em pesquisas de opinião, apontam uma possível polarização entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ), é natural que o cenário eleitoral seja caracterizado como um grande fator de incerteza na vida nacional.

Em circunstâncias normais, esse campo estaria sendo ocupado eleitoralmente pelos dois principais sistemas de poder instalados no país. O principal é o que se articula em torno do governo Temer, encabeçado pelo PMDB e com amplo apoio entre as forças que a aprovaram o impeachment de Dilma Rousseff. O outro é o governo Alckmin, vértice do sistema de alianças protagonizado pelo PSDB a partir de São Paulo. Uma convergência entre os dois polos, nas condições estabelecidas pela reforma política, em tese, seria eleitoralmente imbatível. Entretanto, nem juntos, nem separados, Temer e Alckmin constituem ainda uma alternativa de poder.

Pelo contrário, a expectativa de poder criada em torno do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em que pese o enfraquecimento eleitoral e orgânico do PT, vem se impondo gradativamente ao país, com uma retórica populista e de ajuste de contas. O líder petista renasce das cinzas do colapso do governo de Dilma Rousseff, como se nada tivesse a ver com o fracasso do “poste de saias” que ungiu e levou ao poder. Lula ameaça repetir a trajetória de Getúlio Vargas nas eleições de 1950, quando o ex-ditador voltou ao poder nos braços do povo.

Em contrapartida, como resposta à recidiva lulista, Jair Bolsonaro estabelece um outro polo de poder, com um discurso igualmente populista, mas à direita, nucleado por setores reacionários que veem no antigo regime militar um espelho para solução dos problemas do país. Completa com suas ideias autoritárias e conservadoras um cenário de radicalização política que interessa a ambos, pois estreita as possibilidades de surgimento de uma alternativa robusta ao centro do espectro político. Uma candidatura unificadora deste campo que os neutralize está se tornando cada vez mais difícil, por razões que examinaremos a seguir.

Lava-Jato

A primeira razão do não surgimento de uma candidatura unificada a partir do centro do poder é a crise ética. A Operação Lava-Jato atingiu em cheio o núcleo do governo Temer e vem impedindo que o sucesso de sua política econômica tenha reflexos significativos na popularidade do governo. A segunda é o fato de que essa percepção também existe em relação à cúpula do PSDB, ainda que seu líder principal, Fernando Henrique Cardoso, mantenha inabalado prestígio entre as elites do país e parcela da classe média, e o governador Geraldo Alckmin não tenha sido alvejado de forma direta pelas denúncias do Ministério Público Federal (MPF). Mas o fato é que o candidato tucano a presidente da República ainda não foi capaz preencher esse vazio como alternativa de poder e ninguém vai pular numa piscina sem saber se tem água dentro.

É natural, portanto, que outras candidaturas se coloquem em cena para ocupar esse espaço. A mais presente ainda é a de Marina Silva (Rede), mas outros nomes buscam também afirmação, de Ciro Gomes (PDT) a Álvaro Dias (Podemos), passando ainda pela pré-candidatura de Cristovam Buarque (PPS), que permanece à flor da terra, enquanto o presidente do partido, Roberto Freire, sonha com um coelho na cartola: Luciano Huck. Tudo isso faz parte de um cenário único de incertezas, que tem o colorido das flores do recesso.

A primeira grande definição do processo eleitoral que se avizinha está fora da esfera de decisão dos partidos, do Congresso e dos governos: é o julgamento de Lula em segunda instância pelo Tribunal Federal de Recursos da 4ª região, no dia 24 de janeiro, em Porto Alegre. O petista pode ser condenado, se tornar inelegível e até mesmo ser preso. A disputa passaria a ser polarizada entre Bolsonaro e Marina, num cenário de fácil volatilização por causa da disparidade de armas em relação aos grandes partidos e paridade quanto a candidatos mais ou menos do mesmo naipe de recursos de campanha (fundo eleitoral e tempo de televisão e rádio). Ou seja, o julgamento pode mudar tudo no jogo eleitoral.

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