Luiz Carlos Azedo: Prisão quase inexorável

A presidente do STF, Cármen Lúcia, sepultou as possibilidades de reverter a decisão dos desembargadores de Porto Alegre, que condenaram Lula a 12 anos e 1 mês de prisão, antes de a pena começar a ser executada

Complicou-se ainda mais a situação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que ontem sofreu mais uma dura derrota judicial: o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Humberto Martins rejeitou o pedido de habeas corpus preventivo da defesa. Lula está condenado a 12 anos e 1 mês de prisão pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, com sede em Porto Alegre, em regime fechado e execução imediata. Apenas um embargo de declaração de seus advogados o mantém em liberdade.

A defesa de Lula recorreu ao STJ com o argumento de que a medida fere a Constituição, que diz: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. Ocorre que uma súmula do STF determina que os réus condenados em segunda instância comecem a cumprir a pena imediatamente, independentemente da posterior apreciação do caso pelos tribunais superiores. A defesa de Lula tentou atalhar o TRF-4 com o pedido de habeas corpus.

A defesa de Lula persistiu na politização dos processos judiciais aos quais responde, ao afirmar que a prisão de Lula teria “desdobramentos extraprocessuais, provocando intensa comoção popular — contrária e favorável — e influenciando o processo democrático”. Martins rechaçou os argumentos: “O receio de ilegal constrangimento e a possibilidade de imediata prisão não parecem presentes e afastam o reconhecimento, nesse exame liminar, da configuração do perigo da demora, o que, por si só, é suficiente para o indeferimento do pedido liminar”. Segundo o ministro, não existe ameaça de prisão ilegal, o que justificaria o habeas corpus preventivo.

A decisão do ministro surpreendeu o mundo político. Há duas semanas, Martins deu liminar a favor da posse de Cristiane Brasil no Ministério do Trabalho. Mas a decisão foi cassada pela presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Cármen Lúcia, que ontem descartou a possibilidade de rever a jurisprudência da prisão após condenação em segunda instância em razão da situação de Lula. “Em primeiro lugar, o Supremo não se submete a pressões para fazer pautas. Em segundo lugar, a questão foi decidida em 2016 e não há perspectiva de voltar a esse assunto”, disse a ministra. Martins e a presidente do STF, portanto, estão em sintonia.

Afronta

A estratégia de Lula em relação aos processos que enfrenta na Operação Lava-Jato vem se revelando um fracasso absoluto. Na medida em que a primeira condenação, a nove anos e meio de prisão, pelo juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal, saiu da primeira para a segunda instâncias (no caso, o TRF-4), o petista subiu o tom dos ataques ao Judiciário, ao mesmo tempo em que reforçou o discurso político de que haveria um complô para fraudar as eleições, impedindo-o de disputar a Presidência. Esperava que isso tivesse repercussão favorável nos tribunais superiores, que não são formados apenas por juízes de carreira. Deu tudo errado.

O que está sendo posto em xeque, com a estratégia do PT, é o respeito à Constituição e à democracia por Lula e seus aliados, exatamente o contrário do que apregoam com base no senso comum de que o julgamento das urnas seria mais legítimo do que o dos tribunais. Há todo um debate no mundo jurídico sobre a execução de penas a partir da segunda instância, que é adotada em vários países democráticos. No caso brasileiro, esse recurso foi acolhido porque o princípio do “transitado em julgado”, principalmente nos casos de crimes de “colarinho branco”, estava sendo um instrumento de impunidade.

Recentemente, porém, a discussão voltou à baila no Supremo Tribunal Federal (STF). A mudança de opinião do ministro Gilmar Mendes, que era favor da execução da pena após condenação em segunda instância, e a entrada do ministro Alexandre de Moraes, no lugar do falecido ministro Teori Zavascki, alimentam as especulações sobre a revisão da jurisprudência. A aposta da defesa de Lula era explorar essa contradição e protagonizar uma alteração na jurisprudência. A radicalização do seu discurso político e a postura desrespeitosa em relação aos magistrados que o condenaram acabaram provocando um efeito contrário. Agora, a decisão de Carmem Lúcia sepulta as possibilidades de reverter a decisão dos desembargadores federais de Porto Alegre, antes de a pena começar a ser executada.

Além disso, afasta a possibilidade de Lula disputar as eleições, pois está inelegível. Para isso, seria necessário revogar a Lei da Ficha Limpa, que exclui da disputa eleitoral quem foi condenado em segunda instância. Sem garantia de registro, a candidatura de Lula está natimorta. Mesmo assim, a estratégia do PT é “vitimizar” o ex-presidente da República e manter sua pré-candidatura enquanto for possível. Entretanto, o estratagema somente afronta ainda mais o Judiciário. Não tem eficácia jurídica.

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