Temer sabe que a votação da reforma da Previdência será um momento decisivo da trajetória do governo, que entrará em declínio antecipado se a mesma não for aprovada
Digamos que foi um bom acordo de cavalheiros o resultado da brevíssima conversa de ontem, em Limeira (SP), entre o presidente Michel Temer e o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que deve assumir o comando nacional do PMDB no próximo fim de semana. “Será uma coisa cortês e elegante, como é do meu estilo e do estilo do governador”, como bem explicou Temer o desembarque do PSDB do governo federal sob comando de Alckmin, que é pré-candidato à sucessão presidencial. Ambos se encontraram para a entrega de moradias do programa Minha Casa, Minha Vida no interior de São Paulo, mas não avançaram em negociações sobre o futuro.
Aparentemente, há convergência entre ambos quanto a mais crucial das reformas propostas pelo governo Temer, a da Previdência. “Vamos fazer o possível e o impossível para poder aprovar. Teremos reunião com os presidentes da Câmara e do Senado, que estão entusiasmados. Entusiasmados em nome do Brasil”, exagerou Temer, ao falar sobre o assunto. O planejamento do governo prevê uma maratona de conversas ao longo da semana com lideranças dos partidos que integram a base de apoio de Temer no Congresso Nacional.
Alckmin ainda não fala em nome do PSDB, mas não esconde seu apoio à reforma. Na sexta-feira, em entrevista à Mariana Godoy, fora explícito: “Eu sempre defendi um regime geral de Previdência Social. Não tem sentido você ter um regime de Previdência para quem é funcionário público e outro regime de Previdência para quem é funcionário da indústria, da agricultura, dos serviços, do comércio, nós sempre defendemos um regime geral de Previdência.” Do ponto de vista objetivo, aprovar a reforma da Previdência agora será melhor para quem vier a ser eleito presidente da República em 2018.
Temer sabe que a votação da reforma da Previdência será um momento decisivo da trajetória do governo, que entrará em declínio antecipado se a mesma não for aprovada, em razão dos desgastes já conhecidos e do desembarque do PSDB. Esse é o cardápio político do almoço deste domingo com os ministros e aliados e do jantar na casa do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). No primeiro encontro, fará uma avaliação real da situação e iniciará consultas sobre a nova configuração do governo sem a presença do PSDB na Esplanada; no segundo, o assunto principal e a viabilidade ou não de alinhar a base com a aprovação da reforma.
A economia já mandou recados de que o otimismo ufanista dos governistas sobre a retomada forte do crescimento não se sustentará sem a reforma da Previdência: a Bovespa caiu, a previsão de crescimento do PIB deste ano continua abaixo de 1%. E a Lava-Jato permanece fustigando aliados próximos de Temer, que se livrou de duas denúncias do ex-procurador Rodrigo Janot para continuar no comando do barco, mas não tem condições de recolher os seus náufragos, como os ex-ministros Henrique Alves e Geddel Vieira Lima. Ou seja, a crise ética continua sendo a variável predominante na avaliação popular sobre o governo; a economia não terá a menor condição de alterar esse peso da Lava-Jato sem a aprovação da reforma da Previdência, porque as projeções são de que, nesse caso, o crescimento do PIB em 2018 não passará de 2,5%.
O rei do Rio
O procurador regional da República José Augusto Vagos, da Lava-Jato no Rio de Janeiro, criticou duramente nas redes sociais o habeas corpus concedido pelo ministro Gilmar Mendes ao empresário Jacob Barata Filho, que foi solto pela terceira vez. “Chega a ser constrangedor o acesso que esse acusado tem para obter decisão em último grau de jurisdição sem passar pelas demais instâncias, como se desfrutasse de um foro privilegiado exclusivo para liminares em habeas corpus, mesmo sendo acusado de destinar dezenas de milhões de reais aos maiores líderes políticos do Rio, como se isso constituísse crime de menor potencial ofensivo, crime de bagatela.”
Sem entrar no mérito da polêmica jurídica, o fato é que Barata é uma eminência parda da política fluminense e tem enorme poder político na antiga capital federal. Mas é uma ilusão achar que é o único empresário do setor de transportes urbanos que manda e desmanda numa assembleia legislativa e nas câmaras municipais. O padrão de mobilidade urbana do país é um contrassenso total (10% da população ocupam 90% das vias) e reproduz, em maior ou menor escala, a relação entre políticos corruptos e empresários inescrupulosos que os financiam.