Luiz Carlos Azedo: Novo eixo no Supremo

“Toffoli assume um tribunal desgastado pela contaminação política, as idiossincrasias de seus pares e a falta de coesão institucional”.
Foto: Carlos Moura/SCO/STF (04/04/2018)
Foto: Carlos Moura/SCO/STF (04/04/2018)

“Toffoli assume um tribunal desgastado pela contaminação política, as idiossincrasias de seus pares e a falta de coesão institucional”

O ministro Dias Toffoli assumirá hoje a presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) com o firme propósito de distender as tensas relações na Corte e mudar o eixo de sua atuação em relação aos demais poderes. Durante o processo eleitoral, a pauta será elaborada de modo a não criar mais tensões políticas; após as eleições, tende a assimilar o resultado do pleito e criar condições para uma transição de governo sem grandes traumas. Por exemplo, as ações que discutem a possibilidade de execução da pena após a condenação em segunda instância, em princípio, não serão julgadas neste ano. Porém, um freio de arrumação na Operação Lava-Jato está em andamento.

Toffoli assume um tribunal desgastado pela contaminação política, as idiossincrasias de seus pares e a falta de coesão institucional, o que resultou numa séria de decisões juridicamente contraditórias, opondo a Primeira e a Segunda Turma do Tribunal, que foram apelidadas de “Câmara de gás” e “Jardim do Éden”. Há um entendimento generalizado de que o STF deixou de exercer um papel moderador nas relações entre os poderes da República para ser um fator a mais de instabilidade.

O novo presidente do Supremo pretende adotar medidas para dar mais efetividade à Justiça e compartilhar os rumos da Corte com os pares. Durante o processo eleitoral, quer evitar grandes polêmicas. Na primeira sessão plenária sob seu comando, na próxima semana, estão na pauta decisões triviais: o ingresso em universidades públicas de militares transferidos, nos casos de ausência de universidade paga congênere; a concessão de licença ambiental única para atividades de agronegócio sem prévia realização de estudo de impacto ambiental; e a pulverização aérea de produtos químicos para combater o mosquito Aedes aegypti.

Toffoli construiu uma imagem de conciliador no Supremo, num momento em que as divergências pessoais e doutrinárias estavam muito acirradas, principalmente entre os ministros Gilmar Mendes e Luís Barroso, que andaram se digladiando em plenário. Entretanto, é um dos ministros que critica a Operação Lava-Jato. Como assumirá o comando do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), acredita-se que pretenda impor um novo padrão de atuação aos promotores e juízes de primeira instância.

Um sinal dessa tendência foi dado ontem pelo corregedor nacional do Ministério Público, Orlando Rochadel, que mandou abrir reclamação disciplinar contra os promotores Wilson Coelho, Marcelo Mendroni e Ricardo Castro, de São Paulo, questionando as denúncias apresentadas contra o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad e o ex-governador paulista Geraldo Alckmin, candidatos do PT e do PSDB à Presidência, respectivamente. Rochadel atendeu ao pedido do conselheiro Luiz Fernando Bandeira de Mello, que questiona a “regularidade da instrução de feitos que possam ter impacto nas eleições de 2018”.

Na Segunda Turma, as posições críticas de Toffoli em relação às prisões preventivas e à execução imediata de pena para condenados em segunda instância resultaram numa maioria favorável à concessão de muitos habeas corpus pelo ministro Gilmar Mendes. Fala-se que Toffoli pretende pôr em julgamento o processo disciplinar que discute a conduta do juiz Sérgio Moro por ter autorizado a divulgação de interceptação telefônica de conversa entre a então presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Foi de Toffoli o voto favorável à libertação do ex-ministro da Casa Civil José Dirceu, o que ensejou a discussão reservada entre os ministros da possibilidade de conversão da prisão de Lula em domiciliar. Essa medida, porém, teria sido abortada pela confusão criada pela defesa de Lula no Tribunal Regional Federal da 4ª Região, onde um desembargador de plantão, durante o recesso, resolveu libertar Lula, mas teve o alvará de soltura cassado pelo presidente daquele tribunal.

Legado
A ministra Cármem Lúcia, que deixa o cargo, enfrentou um dos momentos mais difíceis da Corte, por causa das denúncias contra o presidente Michel Temer. Assumiu a presidência do Tribunal duas semanas após o impeachment da presidente Dilma Rousseff e logo teve que enfrentar rebeliões nos presídios do Norte e Nordeste. Em Manaus, foram 56 mortes. Em Roraima, no maior presídio do estado, 33 presos foram assassinados. Houve 133 mortes nos presídios do país nos primeiros 15 dias de 2017. No mesmo mês, o ministro Teori Zavascki, relator dos processos da Operação Lava-Jato no Supremo, morreu na queda do avião que o transportava para Angra dos Reis. Estava na iminência de homologar as delações premiadas da Odebrecht e foi substituído pelo ministro Édson Fachin.

Carmem Lúcia deixou como legado na sua passagem pelo comando do Supremo muitas decisões importantes: redução do escopo do foro privilegiado; constitucionalidade da terceirização de atividades-fim por empresas; o direito de transgêneros alterarem seu registro civil sem a necessidade de mudança de sexo; imprescritibilidade de ação de ressarcimento ao erário por ato doloso de improbidade; impossibilidade de condução coercitiva de pessoas investigadas; poder da polícia de firmar acordos de delação premiada; possibilidade de desconto no salário do servidor em greve; desnecessidade da autorização prévia de Assembleia Legislativa para que o governo do respectivo estado seja processado criminalmente; possibilidade de ensino religioso confessional nas escolas públicas; constitucionalidade do fim da contribuição sindical obrigatória; e constitucionalidade do Código Florestal.

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