Fernando Henrique Cardoso sugeriu a antecipação das eleições presidenciais de 2018, o que é considerado uma heresia pela maioria dos políticos governistas
A crise ética chegou com tudo ao PSDB, que virou um ninho de aflitos. As agruras do partido se intensificaram por causa do pedido de prisão do senador Aécio Neves (MG), ex-presidente da legenda, que também foi afastado do exercício do mandato pelo ministro Edson Fachin, relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal, depois de conversa gravada pelo empresário Joesley Batista, dono da JBS. Novo pedido será julgado na próxima terça-feira, pelo STF, e pode se transformar num divisor de águas na relação entre Corte e o Congresso.
Candidato a presidente da República em 2014, Aécio foi o autor do pedido de cassação da chapa Dilma Rousseff-Michel Temer, negado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), por 4 a 3. Agora, está no epicentro da crise política envolvendo o Congresso e o o STF, porque sua eventual prisão precisa ser autorizada pelo Senado e uma decisão da Corte nesse sentido, atendendo o novo pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pode aprofundar a crise entre os Poderes. Antecipa, de certa forma, o impasse em torno da eventual denúncia do presidente Michel Temer, que, para ser julgada pelo STF, precisa primeiro ser aceita pela Câmara.
Como há um grande número de políticos envolvidos na Lava-Jato e outras operações da Polícia Federal, o ambiente no Congresso caminha para um alto lá no Ministério Público Federal e no próprio ministro Fachin, o que pode aprofundar a crise entre os Poderes. Quem farejou o aprofundamento da crise foi o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em nota surpreendente, na qual sugere a antecipação das eleições presidenciais de 2018, o que é considerado uma heresia pela maioria dos políticos governistas. Isso significa aceitar as bandeiras da oposição, num momento em que o PT arrefeceu seu entusiasmo com o “Fora, Temer!” e “Diretas, já”, pois prefere ver os partidos da base governista sangrando em razão do apoio ao presidente da República.
FHC deu um cavalo de pau nas suas próprias posições políticas: “A conjuntura política do Brasil tem sofrido abalos fortes e minha percepção também. Se eu me pusesse na posição de presidente e olhasse em volta, reconheceria que estamos vivendo uma quase anomia. Falta o que os politicólogos chamam de ‘legitimidade’, ou seja, reconhecendo que a autoridade é legítima e consentir em obedecer. A ordem vigente é legal e constitucional (daí ter mencionado como ‘golpe’ uma antecipação eleitoral), mas não havendo aceitação generalizada de sua validade, ou há um gesto de grandeza por parte de quem legalmente detém o poder pedindo antecipação de eleições gerais, ou o poder se erode de tal forma que as ruas pedirão a ruptura da regra vigente exigindo antecipação do voto.”
Na mesma linha, o presidente interino do PSDB, senador Tasso Jereissati (CE), defendeu a saída dos tucanos do governo, em sintonia com a maioria da bancada na Câmara. O partido só continua na base aliada porque os ministros tucanos Aloysio Nunes Ferreira (Relações Exteriores), Antônio Imbassahy (Secretaria de Governo), Bruno Araújo (Cidades) e Luislinda Valois (Direitos Humanos), no começo da semana, avisaram à cúpula da legenda que permaneceriam nos cargos, mesmo que a direção partidária decidisse abandonar Temer. O governador Geraldo Alckmin, o prefeito João Doria e o senador José Serra (SP) são hoje os principais apoios do presidente dentro da legenda, mas tudo pode mudar por causa do reposicionamento de FHC.
Às cegas
FHC praticamente decretou o desembarque do PSDB, ao avaliar que a situação se agravou — “Ou se pensa nos passos seguintes em termos nacionais e não partidários nem personalistas ou iremos às cegas para o desconhecido” — e afirmar que a legenda deve deixar o governo se o presidente Temer não convocar eleições antecipadas: “A responsabilidade maior é a do presidente, que decidirá se ainda tem forças para resistir e atuar em prol do país. Se tudo continuar como está com a desconstrução continua da autoridade, pior ainda se houver tentativas de embaraçar as investigações em curso, não vejo mais como o PSDB possa continuar no governo.”
A posição do PSDB gerou reações contrárias dos aliados. O presidente do PPS, Roberto Freire, que deixou o ministério da Cultura quando foi divulgada a gravação da conversa de Temer com Joesley Batista e defendeu, na ocasião, a renúncia do presidente, repercutiu assim a nota de FHC: “Temos que reafirmar que, dentro da Constituição, tudo. Fora dela, nada. A partir disso, dizer a FHC que presidente só é destituído por impeachment e se por moto-próprio renunciar; as eleições para preencher tal vacância estão previstas na Carta Magna. Qualquer outra solução é grave equívoco.”
Luiz Carlos Azedo é jornalista