Bolsonaro tem 71 dias para escolher se muda ou fica refugiado nas cinzas da era Trump
A realidade bate à porta do insone Jair Bolsonaro. O delírio da “reinvenção do Brasil” numa “nova ordem mundial” sob comando de Donald Trump, como repetia seu chanceler, acaba na quarta-feira 20 de janeiro, quando Joe Biden assume com o plano de mudar o rumo dos Estados Unidos. Aos 78 anos, ele terá pressa em abrir um “caminho irreversível” para a inovação tecnológica em saúde, comunicações e energia limpa.
Se conseguirá, é outra história. Mas sinaliza o fim de uma tragicômica sintonia de negação da ciência: enquanto Trump considerava a mudança climática uma conspiração chinesa, Bolsonaro reduzia a pandemia a gripezinha.
Outra consequência é o impulso ao cerco legislativo ao Brasil. Democratas e republicanos atravessaram os últimos 12 meses apresentando um novo projeto a cada 50 dias para forçar Brasília a conter o desastre na Amazônia e proteger os indígenas.
Bolsonaro se enrolou na bandeira da soberania nacional quando viu Biden acenar com US$ 20 bilhões (R$ 104 bilhões) para “deixar de destruir” a Amazônia. Mas aceitou, em silêncio, uma interferência externa bem mais barata. No Orçamento de 2020, o Congresso americano separou US$ 15 milhões (R$ 78 milhões) para financiar “assistência estrangeira na Amazônia”, condicionados a provas de respeito aos direitos humanos. Também não reclamou da repetição da ajuda em 2021, com veto ao uso do dinheiro na remoção de indígenas (emenda nº 6395, já aprovada na Câmara).
O cerco legislativo à antipolítica ambiental antecede Biden. Desde o ano passado, avançam projetos como a “Lei da Amazônia” (HR nº 4263), com punições como bloqueio de ativos e de importação de algumas commodities, além de restrições militares — entre elas a revogação da recente designação do Brasil como aliado militar dos EUA fora da Otan.
Bolsonaro tem 71 dias para escolher se muda o rumo ou atravessa a segunda metade do mandato, e a campanha de reeleição, refugiado na saudade e nas cinzas da era Trump.