Há situações em que batalhas simbólicas precisam ser travadas, mesmo quando estamos cientes de que não as venceremos
Donald Trump foi, pela segunda vez, absolvido num processo de impeachment. Tal resultado era mais ou menos óbvio, ainda assim os democratas insistiram na ação contra o ex-presidente. Valeu a pena?
Do ponto de vista pragmático, a decisão dos democratas parece difícil de sustentar —e não apenas pela previsibilidade do desfecho. Processos de impeachment presidencial servem basicamente para um país livrar-se de um líder que não se mostrou à altura do cargo. No caso deste segundo processo contra Trump, isso nem sequer se colocava, pois seu mandato já havia acabado.
Existia, é verdade, a possibilidade de, com a condenação, aplicar uma pena acessória que o impediria candidatar-se em 2024, mas não creio que essa tenha sido a principal motivação dos democratas. A grande preocupação, penso, foi com aquilo que podemos chamar de julgamento da história.
No cálculo das lideranças democratas (e de alguns republicanos), as ações de Trump que culminaram na invasão do Capitólio constituem um dos mais duros golpes jamais desferidos contra a democracia americana. Deixar de tentar aplicar o remédio constitucional cabível, que é o impeachment, seria, no plano moral, normalizar essas atitudes, o que é bem complicado, para dizer o mínimo.
Concordo com o raciocínio e acho que ele vale para o Brasil sob Bolsonaro. Embora me considere um pragmático, creio que existam algumas situações em que batalhas simbólicas precisam ser travadas, mesmo quando estamos cientes de que não as venceremos.
O impeachment, hoje, não seria aprovado, mas daí não decorre que a parcela dos brasileiros que rejeita as atitudes do capitão reformado não tenhamos a obrigação moral de pelo menos ensaiar uma reação institucional para que seus muitos crimes de responsabilidade não fiquem impunes. É uma satisfação que devemos à história. Sem ela, os pósteros irão com razão nos considerar um país de maricas.