Sucesso da ciência em controlar moléstias nos fez esquecer quão devastadoras elas podem ser
É preciso que surjam novos agentes patógenos como o coronavírus de Wuhan para que experimentemos uma pequena fração da angústia com doenças infecciosas que sempre acompanhou a humanidade. O sucesso da ciência em controlar as moléstias virais, bacterianas e parasitárias em vastas regiões do globo nos fez esquecer quão devastadoras elas podem ser.
A varíola, provavelmente a maior assassina da história, matou, só no século 20, entre 300 milhões e 500 milhões de humanos. A peste bubônica dizimou até um terço da população europeia no século 14. Uma parcela ainda maior dos grupos ameríndios sucumbiu ao blend de doenças infecciosas trazidas pelos europeus.
Aos que gostam de pintar as guerras como um flagelo comparável vale lembrar que, até a 1ª Guerra Mundial, a grande maioria dos soldados abatidos em conflitos morria por causa das doenças que acompanhavam as tropas e não devido à carga dos exércitos inimigos. Na Guerra Civil americana, dois terços dos 500 mil mortos foram vítimas primárias de patógenos. A situação só mudou depois que os militares incorporaram brigadas sanitárias, que, com barbeiros e serviços de lavanderia, limaram os ectoparasitas que transmitiam tifo e outras moléstias.
Doenças infecciosas moldaram a história e a evolução humanas. O vazio populacional deixado pela peste jogou o preço do trabalho nas alturas, desestabilizando o sistema feudal e abrindo caminho para o capitalismo. Ectoparasitas são a melhor hipótese para explicar a redução de pelos nos humanos. Isso para não mencionar a invenção do sexo, que também parece ser uma resposta a patógenos.
O curto e precário controle que conseguimos exercer sobre as moléstias infecciosas a partir do século 19 se deve exclusivamente à ciência —a mesma ciência que governos populistas ignoram quando desdenham especialistas e estudos técnicos. A população não faz melhor quando rejeita vacinas.