O próprio presidente trabalha para minar a confiança na vacinação
Numa cerimônia mais voltada a produzir fatos políticos do que a divulgar informações científicas, o governo de São Paulo finalmente anunciou que a Coronavac apresentou, no Brasil, uma eficácia de 78% na prevenção de doença sintomática. É um bom resultado; um pouco melhor do que o do imunizante da Universidade de Oxford/AstraZeneca —aposta do governo federal—, cuja eficácia foi estimada em 70%.
Politicamente, o governador de São Paulo, João Doria, se saiu melhor do que Jair Bolsonaro, já que o presidente, que jurara que jamais adquiriria a “vacina chinesa do Doria”, teve de engolir a pirraça a seco e mandar comprar os imunizantes do rival paulista. Sorte de Doria, azar de Bolsonaro, já que, quando firmaram suas parcerias, era impossível saber qual vacina funcionaria melhor.
Numa perspectiva imediatista, o Brasil também teve sorte. Para um país que fez apostas tão limitadas (basicamente duas), ambas terem apresentado resultados bem razoáveis é boa notícia.
Num plano mais existencial, porém, o Brasil teve o pior azar imaginável. A pandemia chegou quando o país era governado pelo presidente mais despreparado de todos os tempos. Se atravessar a crise sanitária já teria sido difícil com um estadista no comando, com Bolsonaro tornou-se um pesadelo.
O tratamento que ele deu às vacinas é a maior prova disso. Um governante não precisa entender nada de medicina para fazer uma gestão decente na saúde. Basta saber que o grosso dos ganhos em expectativa de vida que a humanidade experimentou nos últimos dois séculos podem ser atribuídos a duas coisas: saneamento básico e vacinação em massa. São as duas vacas sagradas das quais nenhum gestor pode descuidar.
O Brasil era muito fraco na primeira e bom na segunda. Com Bolsonaro, continuamos ruins na primeira, mas ficamos péssimos na segunda, com o próprio presidente trabalhando para minar a confiança na vacinação.