Para o analista político Alon Feuerwerker, o imprevisível nunca pode ser esquecido
Por Joelmir Tavares, da Folha de S. Paulo
“O adjetivo “histórico” anda banalizado, como afirma o jornalista e analista político Alon Feuerwerker, 63, em um texto do livro “Brasil em Capítulos – Um Olhar sobre a Política, do Impeachment às Eleições de 2018”.
Mas não seria exagero aplicar a expressão ao período esquadrinhado por ele na obra. A epopeia começa com a queda de Dilma Rousseff (PT) em meio ao arrastão da Lava Jato, passa pela ascensão de Michel Temer (MDB) e sua luta para se manter na Presidência e chega ao fenômeno da vitória de Jair Bolsonaro (PSL).
“É interessante observar como o cenário estava sendo visto no momento em que as coisas aconteciam”, diz Alon, que reuniu —sem atualizações— textos produzidos de 2016 a 2018 e enviados a clientes da FSB Comunicação, agência para a qual trabalha. O site Poder 360 e o blog do autor também hospedam seus artigos.
Pode parecer estranho aos olhos de hoje ler, por exemplo, que Dilma tinha 65% de probabilidade de ficar no cargo e 10% de sair por impeachment. Mas era essa a avaliação de Alon em 25 de janeiro de 2016.
“Ali era possível fazer a leitura de que ela poderia virar o jogo. Meu trabalho não é nem opinar nem somente descrever, mas pegar a movimentação dos personagens e os fatos e tentar projetar tendências.”
O analista fala com o olhar de quem esteve de dois lados. Como jornalista, cobriu o poder em veículos como Folha e Correio Braziliense; como assessor, trabalhou com políticos e governos de siglas como PT, PSDB, PC do B e PSB.
A experiência de alguém que conhece o sistema por dentro foi uma das razões que o fizeram, por exemplo, “nunca ter menosprezado Bolsonaro”, como diz hoje, com certo tom de satisfação por ter acertado em suas previsões.
Textos de 2017 resgatados no livro já apontavam “a aparente resiliência” do então pré-candidato à Presidência, que à época capturava “boa parte do desejo de renovação”.
Um ano antes do pleito, o autor afirmou em um artigo: “Não é inteligente contar com a desidratação automática de Jair Bolsonaro quando a campanha eleitoral entrar em campo. A intenção de voto espontânea dele já é alta, e ele parece ter adquirido alguma consistência nos apoios”.
Em outros casos, a realidade não confirmou a previsão —embora essas situações tenham sido mais raras, como pode concluir o leitor do livro.
Em abril de 2017, por exemplo, Alon supunha: “2018 acena para o confronto entre o candidato de Lula e o candidato de Temer”. A teoria se concretizou pela metade, com Fernando Haddad pelo lado do PT.
O analista calcula agora, às vésperas da posse de Bolsonaro, que dificilmente o futuro comandante do Planalto conseguirá executar a contento a anunciada intenção de governar em bases diferentes das que vigoram hoje no presidencialismo de coalizão.
Se o eleito romper com o toma lá, dá cá —como se refere à troca de cargos e verbas por apoio—, “será uma experiência única no mundo”, diz Alon.
“Em qualquer país, existe um processo no qual o governante divide poder com quem o apoia. Acredito que ele [Bolsonaro] vai ter alguma dificuldade, porque no dia a dia do Congresso quem coordena são os líderes dos partidos.”
Para o comentarista, o presidente, “em algum momento”, terá que buscar o meio-termo.
Alon foi subchefe de Assuntos Parlamentares do governo Lula (PT), entre 2004 e 2005. Era responsável pelo acompanhamento da execução de emendas dos congressistas.
Segundo ele, a experiência em governos lhe deu “um grau a mais de objetividade”. Fala que a compreensão da política “é diferente se você já presenciou as coisas acontecendo”.
Não que isso tenha lhe concedido dons de adivinho. Alon fala que o imprevisível nunca pode ser esquecido. A facada em Bolsonaro no meio da campanha é só o exemplo mais recente de um fator surpresa que mudou o rumo dos acontecimentos, diz ele.
E, afinal, suas matérias-primas são política e Brasil. “Como mostra a experiência”, anotou em texto de 2016 presente no livro, “no realismo fantástico da política brasileira nunca é demais respeitar sua excelência, o imponderável”.
Brasil em Capítulos – Um Olhar sobre a Política do Impeachment às Eleições de 2018
Autor: Alon Feuerwerker
Ed. Imprimatur; R$ 69 (428 págs.)