Fernando Gabeira: As voltas que a vida dá

Bolsonaro investiu contra a vida liderando a maior política de destruição ambiental do Brasil moderno. E investiu de novo contra a vida negando a pandemia do coronavírus.
Foto: Alan Santos/PR
Foto: Alan Santos/PR

Bolsonaro investiu contra a vida liderando a maior política de destruição ambiental do Brasil moderno. E investiu de novo contra a vida negando a pandemia do coronavírus.

A vida começa agora a cobrar de forma combinada os crimes de Bolsonaro. Numa só semana, convergiram a Cúpula de Líderes sobre o Clima e a CPI da Covid, eventos que lembram a Bolsonaro que sua própria vida ficará para sempre marcada por seu desprezo à vida das florestas e dos bichos e pelo sacrifício humano envolto na tese da imunização de rebanho.

Por mais que psicólogos mergulhem no labirinto da mente de Bolsonaro, nenhuma explicação atenua o dado objetivo de tantas árvores derrubadas, tantos animais carbonizados, tantas pessoas mortas pelo coronavírus.

A economia explica apenas parcialmente. Bolsonaro acha que é preciso tirar todos os recursos da natureza, independentemente do rastro de destruição. Da mesma forma, ele acha que a economia precisa funcionar, independentemente das pessoas que o vírus consome.

A verdade é que Bolsonaro não se importa tanto com a economia, não estuda o tema e, ao se eleger, designou um ministro para responder a todas as perguntas, a quem chamou de Posto Ipiranga. O que move o presidente não chega a ser, portanto, nem uma teoria econômica, por mais grosseira e obsoleta que possa parecer.

Tanto na destruição das florestas como na tragédia humana diante do vírus, o que move Bolsonaro é sua vontade de permanecer no poder.

A floresta interessa na medida em que garanta os votos dos seus predadores; as pessoas podem morrer para que uma suposta normalidade econômica garanta a reeleição.

É muito conhecida a literatura sobre essa obsessão com o poder, a necessidade de respeito e até admiração que os poderosos obtêm quando se revestem dessa condição que lhes parece mágica.

Mas o caso de Bolsonaro é singular. Existe uma coerência em todas as suas escolhas. A morte é a grande aliada desde a opção destrutiva no ambiente e na pandemia, passando pela difusão das armas, chegando até a detalhes como suprimir multas de quem se descuida da cadeirinha do bebê no carro.

Essa aliança com a morte pode ser também o resultado de uma grande frustração com a própria vida. Mas, de novo, deixo isso aos psicólogos ou àqueles que preferem combater Bolsonaro no plano da sanidade mental.

Por meio de grandes episódios como a Cúpula do Clima e a CPI da Covid, entretanto, é possível compreender o antagonismo de Bolsonaro com todos todos os tipos de vida no planeta.

E refletir sobre isso. Não importa a Bolsonaro se o país se tornar um deserto, muito menos se os que ele considera mais fracos forem tombando pelo caminho.

Nunca na história moderna do país a indiferença diante da realidade política poderá ter consequências tão devastadoras para nosso futuro.

A Cúpula do Clima serve para mostrar a importância da luta da Humanidade para a sobrevivência das novas gerações e a contradição de Bolsonaro com essa gigantesca reação vital.

Ali, ele apenas mentiu, supondo que possa enganar o mundo. Seu objetivo sempre foi desmontar a fiscalização, acabar com a “indústria da multa”, liberar o garimpo e enfraquecer os povos indígenas.

A CPI da Covid servirá para revelar aquilo que muitos de nós já sabemos. Mas pode fazê-lo de uma forma séria e pedagógica para que todos compreendam a responsabilidade de Bolsonaro.

Essas duas vertentes, a ambiental e a sanitária, sempre estiveram aí enquanto, de uma certa maneira, Bolsonaro gritava “Viva la muerte”, como o oficial do Exército de Franco.

É estranho que esse grito tenha dominado um país mundialmente conhecido pela vitalidade. Imperdoável, no entanto, que ele possa ecoar em 22, o prazo final para o encerramento dessa fúnebre passagem da História do Brasil.

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