Líderes se antecipam ao fim das coligações proporcionais
A erupção do PSL escancarou a disputa que ocorreu, no subterrâneo e sob elevadas pressões, entre as duas alas antagônicas existentes no partido do presidente da República. Aliados de Jair Bolsonaro esperam que a tomada de poder na liderança da sigla na Câmara resulte, à semelhança do que ocorre depois das erupções vulcânicas, na produção de material sólido como rocha e um solo fértil a ser explorado nas próximas eleições.
Liderados pelo deputado Luciano Bivar (PE), presidente nacional do PSL, os adversários de Bolsonaro na legenda apontam que o episódio revela a meta do presidente de controlar um partido para construir plataformas políticas de médio e longo prazos. Esse objetivo gestado dentro do Palácio do Planalto, alertam, é influenciar a agenda do Congresso no próximo ano, a sucessão do presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), e as articulações para as eleições gerais de 2022. Ninguém esquece que é o presidente da Câmara quem decide o destino de qualquer pedido de impeachment – a gaveta ou acolhimento – e todo presidente precisa de previsibilidade para governar.
Ainda sob a ótica de seus adversários, Bolsonaro e companhia querem a chave do cofre e um controle remoto capaz de ditar os rumos da legenda em todos os Estados a partir do sofá do Palácio da Alvorada. Não apenas por apetite pelo poder, mas por questões práticas, diante das perspectivas de redução do número de partidos num futuro próximo.
Nas eleições municipais do ano que vem, as coligações proporcionais estarão proibidas. Os partidos precisarão lançar o maior número possível de candidatos a prefeito, como forma de impulsionar os candidatos a vereador. Inevitavelmente, os partidos que não se saírem bem serão compelidos a se unir a outras siglas de baixo desempenho por meio de fusões ou incorporações.
Essa reconfiguração será vista novamente nas eleições de 2022, quando aí sim, na visão de dirigentes partidários, o ecossistema político brasileiro começará a ganhar novos contornos. Haverá menos partidos e, portanto, menos postos-chave nas instâncias partidárias à disposição para rateios e acertos políticos. Em outras palavras, menos postos de confiança, verbas e poder de influência. Todos querem estar bem posicionados para as tratativas que virão.
Essa é a visão de quem hoje ainda tem o controle da direção nacional do PSL e, também, dos interlocutores do presidente da República em outros partidos independentes.
Uma eventual aliança ou até uma fusão com o PSL bolsonarista são articulações hoje vistas como potencialmente tóxicas, aos olhos de parlamentares de centro. “O presidente sozinho arruma problemas dentro de qualquer legenda, Bolsonaro com seus filhos representam um problema maior, enquanto Bolsonaro seus filhos e meia bancada do PSL produzem um tsunami de problemas”, ironiza um influente congressista.
Do ponto de vista de Bolsonaro e seus aliados, contudo, o movimento deve ser lido de forma bem distinta. Afinal, o partido do presidente da República precisa servir de exemplo. Por essa mesma razão a transparência nas contas do PSL se tornou um ponto inegociável para Bolsonaro. Aliados do presidente ponderam que ele deve estar à frente de uma sigla capaz de responder aos anseios populares por novas práticas na política. Esse partido pode, inclusive, conter e respeitar várias alas ou tendências. Desde que a liderança de Bolsonaro e o compromisso de transparência sejam respeitados.
Dia após dia, a lava expelida pelo PSL continua a ser derramada e expõe a briga dentro do partido do presidente. É um aspecto aparente de um movimento mais amplo, este ainda silencioso, das placas tectônicas do sistema partidário.
Protestos e distúrbios
Muito antes de o general Eduardo Villas Bôas repetir nas redes sociais seu alerta sobre os riscos à paz social, militares e integrantes do sistema brasileiro de inteligência já vinham monitorando a ocorrência de diversos distúrbios no exterior. Eles não têm relação alguma, como pode-se supor, com as decisões do Supremo Tribunal Federal e o destino político do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
O primeiro sinal veio da Ásia. Mais precisamente de Hong Kong, onde manifestantes mascarados desafiaram seguidamente o governo chinês.
Rússia, Iraque, Líbano, Espanha, Haiti, Porto Rico, Venezuela e Chile entraram no radar logo na sequência. Entre as motivações, dependendo da localidade, estão a falta de liberdade política, a corrupção, o desemprego, o aumento de impostos, o fim de subsídios e a alta do preço de combustíveis ou a elevação de tarifas do transporte público.
No Brasil, as manifestações contra a atuação do governo na educação demonstraram força e capilaridade no começo do ano, mas depois rarearam.
Atos em defesa do governo foram organizados, mas não se tornaram frequentes e não acabaram em confusão.
Hoje, o STF retoma o julgamento sobre a prisão após condenação em segunda instância.
A perspectiva de o ex-presidente Lula retornar aos palanques dá calafrios aos adversários e anima seus aliados de diversos partidos e Estados.
No entanto, há outras preocupações de curtíssimo prazo no horizonte de autoridades do Executivo e do Congresso, além de uma eventual reação violenta de setores mais radicais contra a possível mudança no entendimento do STF. Uma delas é a já esperada resposta de corporações do funcionalismo à reforma administrativa, outra é a rejeição das camadas mais pobres a medidas que adiem o crescimento do emprego e da renda. Outra questão latente é a falta de solução em relação à tabela do frete e à situação dos caminhoneiros, esta sim uma categoria capaz de parar o Brasil.