Presidente trombou com a ekipekonômica, mas mostrou caminho para aprovar reforma da Previdência
Pelo andar da carruagem, a reforma da Previdência será aprovada. Numa revelação surpreendente feita durante uma entrevista aos repórteres Carlos Nascimento, Débora Bergamasco e Thiago Nolasco, o presidente Jair Bolsonaro pôs na mesa uma nova idade mínima para o acesso às aposentadorias e abriu o caminho para que ela passe a girar em torno de seu eixo principal, a “fábrica de desigualdades” exposta pelo ministro Paulo Guedes: “Quem legisla e julga tem as maiores aposentadorias e a população, as menores”.
Durante a campanha, Bolsonaro repetiu que a idade mínima do projeto mandado por Michel Temer era perversa. O anúncio da nova idade resultou numa trombada com a ekipekonômica. Resta saber quem manda e quem é capaz de fazer um projeto que passe pelo Congresso.
Bolsonaro defendeu de forma convincente a mudança na lei que permite a posse (não o porte) de armas. Afinal, em 2005, um plebiscito rejeitou a proibição da venda de armas de fogo. Felizmente, ele não comparou trabucos a automóveis, como faz o ministro Augusto Heleno.
O Bolsonaro da entrevista pareceu mais leve que o do palanque de mármore de Brasília. Ainda assim, disse que “hoje em dia o poderio das Forças Armadas americanas, chinesas e soviéticas alcança o mundo todo”. Como ele acha que com o seu governo o Brasil “começa a se livrar do socialismo”, alguém precisa avisá-lo de que a União Soviética se acabou em 1991.
O PODER DE PAULO GUEDES
Falta ao poderoso ministro Paulo Guedes um pé no Planalto. Parece detalhe, mas há dois tipos de ministros, os que têm sala no Palácio (Augusto Heleno, por exemplo) e os que não têm.
Quem está no primeiro grupo checa se o presidente está livre, toma o elevador e vai à sua sala. Quem não está precisa marcar hora ou arriscar-se a uma espera.
É claro que Guedes verá Bolsonaro sempre que isso for necessário, mas, por enquanto, a burocracia palaciana revela que nos primeiros cem dias de governo ele participará da reuniões do ministério às terças-feiras e de cinco encontros de “alinhamento”, sempre com outros colegas.
A trombada ocorrida na sexta-feira entre o que diz Bolsonaro e o que pensa a ekipekonômica mostra que faltam conversas. Isso na melhor das hipóteses, porque pode estar faltando disciplina. Choque com a ekipekonômica na primeira semana de governo é coisa nunca vista.
Os ministros com sala no Palácio têm um acesso informal ao presidente e essa circunstância cria um tipo especial de convivência. Para o bem, produz eficácia, para o mal, intrigas. É mais fácil se desviar de uma bola nas costas estando perto do juiz.
SANTAS PALAVRAS
Pode-se achar o que se queira do discurso de posse de Paulo Guedes, mas é impossível discordar de seu diagnóstico sobre os bancos públicos:
“Eles se perderam nos grandes programas, onde piratas privados, burocratas corruptos e criaturas do pântano político se associaram contra o povo brasileiro.”
A BIC DE TEREZA
A caneta Bic de Tereza Cristina, ministra da Agricultura, tem mais tinta que a da maioria dos ministros civis.
O SAMBA DE ARAÚJO
O grande ausente na posse do chanceler Ernesto Araújo foi o escritor Oswald de Andrade (“Tupi or not tupi”). Quando o diplomata pediu a seu colegas que lessem mais José de Alencar e menos o New York Times, poderia ter feito uma ressalva, recomendando sua obra de ficção. Nela há um negro endiabrado sendo chamado de “bugio”, mas ficção é ficção.
Há um outro Alencar, político, deputado, ministro da Justiça e escravocrata convicto. Ele chamou a Lei do Ventre Livre de “iníqua e bárbara”. Isso em 1871, seis anos depois do fim da Guerra Civil que acabou com a escravidão nos Estados Unidos.
Alencar criticava o “fanatismo do progresso” e advertia: “A liberdade e a propriedade, essas duas fibras sociais, caíram desde já em desprezo ante os sonhos do comunismo.”
“Toda lei é justa, útil, moral, quando realiza um melhoramento na sociedade e representa uma nova situação, embora imperfeita, da humanidade. Neste caso está a escravidão.”
“Se a escravidão não fosse inventada, a marcha da humanidade seria impossível.”
Alencar sustentava que o Estado não deveria se meter a legislar sobre a relação trabalhista da escravidão.
O MITO DE ARAÚJO
Noves fora José de Alencar, o chanceler Araújo deu-se a comentários sobre figuras míticas, valendo-se do rei português d. Sebastião. Com sua erudição, poderia ter associado Jair Bolsonaro a uma centenas de outras figuras.
D. Sebastião era meio pancada, sumiu na batalha de Alcácer Quibir (1578) e, como tinha horror às mulheres, foi-se embora sem deixar descendência. Disso resultou na anexação de Portugal pela Espanha por 60 anos.
EREMILDO, O IDIOTA
Eremildo é um idiota e acha que os condenados na primeira instância do Judiciário devem ir para a cadeia sem direito a recurso.
O que o cretino não entende é por que o ministro Sergio Moro quer enviar ao Congresso uma emenda constitucional assegurando e prisão dos condenados na segunda instância.
Como juiz, Moro defendia esse procedimento e o tema está na pauta do Supremo Tribunal Federal para o dia 10 de abril.
Como é impossível que o Congresso aprove a emenda em tão pouco tempo, Eremildo ficou com a impressão de que a iniciativa seja uma pressão inútil. Até porque, o tribunal sempre poderá julgar a mudança inconstitucional.
A APPLE MANCOU
A queda do valor da Apple foi atribuída pelo mercado a uma retração dos compradores chineses.
Algo pior pode vir por aí. Depois de ter mudado os hábitos de consumo com os iPhones e os iPads, a Apple está mancando no novo mercado de aplicativos e de assistentes digitais que recebem ordens por comandos de voz.
Esses equipamentos têm o tamanho de um pequeno pote. Entre outras coisas, processam mensagens, ligam luzes, tocam músicas, registram ordens de compras e a cada dia expandem sua capacidade. O Echo da Amazon e o Google Home dominam o mercado, enquanto o HomePod da Apple está bem atrás. Steve Jobs não deixaria isso acontecer.
WITZEL NO PALANQUE
O governador Wilson Witzel ainda não desceu do palanque. Quando ele disse que o país precisa de “estabelecimentos prisionais destacados, longe da civilização, precisamos ter a nossa Guantánamo”, ofendeu a geografia e, tendo sido juiz, massacrou o Direito.
A prisão americana de Guantánamo não fica longe da civilização. Está a 899 km de Miami e a 65 km de Santiago de Cuba. Quando o presidente Bush resolveu mandar terroristas para lá, o que ele queria era mantê-los fora do alcance da Constituição dos Estados Unidos. A Corte Suprema cortou-lhe as asas.
TEMER PERDEU
O pente-fino determinado pela Casa Civil para o reestudo das últimas medidas tomadas pelo governo de Michel Temer é o preço que ele pagará por ter apostado no escurinho do fim de mandato para disseminar um testamento.
Deu o mau exemplo nomeando protegidos para a direção de agências reguladoras e acabará enrascado em maluquices de escalões inferiores.