Talvez fosse melhor Jair Bolsonaro trocar a metafísica do distante Olavo de Carvalho pelos critérios de Paulo Guedes
Assim como o “Escola sem Partido” significa na verdade trocar um partido por outro, a nova ordem está trocando a “ideologização da esquerda” pela “ideologização da direita”, sob a mesma inspiração, grandiloquência, antipetismo, atingindo em cheio duas das áreas mais sensíveis: Relações Exteriores, com o diplomata Ernesto Araújo, e Educação, com o filósofo Ricardo Vélez Rodríguez.
A inspiração vem de fora, do também filósofo Olavo de Carvalho, ideólogo da direita brasileira, que mora desde 2005 nos Estados Unidos, tem Twitter em inglês e já avisou que até topa um cargo no governo do qual ele é mentor, mas com uma condição: que seja lá, nos EUA, como embaixador. O PT já era e Jair Bolsonaro está chegando, mas bom mesmo continua sendo a Virgínia.
Assim como Ernesto Araújo causou enorme perplexidade ao ver o “globalismo” como complô interplanetário liderado pela “China maoista” para exterminar o Ocidente e os valores cristãos, Vélez Rodríguez se coloca como um Dom Quixote na guerra pela preservação do “valores tradicionais de nossa sociedade”. Ambos, aliás, pelo mesmo veículo: seu blog anti-PT e pró-Bolsonaro.
Professor emérito da Escola de Comando do Estado Maior do Exército e professor colaborador de Pós-graduação em Ciência da Religião da Universidade Federal de Juiz de Fora, o futuro ministro da Educação se destaca por ser contra o PT, o Enem, as cotas, a ideologia de gênero e, claro, a favor do “Escola sem Partido”, mas sem pressa.
Nascido na Colômbia, está convencido de que as escolas brasileiras vêm sendo usadas para impor à sociedade uma doutrinação marxista e desmontar os valores tradicionais “no que tange à preservação da vida, da família, da religião, da cidadania, em suma, do patriotismo”.
Ou seja: na visão do novo governo, o Itamaraty e as escolas estão infestados de comunistas, contaminados pela ideologia marxista, servindo de instrumentos para o “climatismo” e o “antinatalismo”, conceitos criados por Araújo para explicar como os ambientalistas, abortistas e ateus se articulam para, ardilosamente, destruir o mundo.
No “Novo Brasil”, portanto, há o risco de expurgos, dedos em riste, dossiês, acusações, suspeitas, danças estonteante de cadeiras, sabatinas para apurar a ideologia de servidores e professores concursados e “depurar” o Estado. Ou é só impressão, um temor delirante? Tomara que sim.
Num campo mais concreto: assim como o futuro chanceler deve explicações sobre como projetar a imagem do Brasil, atrair investimentos, melhorar as condições de comércio e fortalecer parcerias, espera-se que o ministro da Educação diga com clareza o que ele pretende fazer pela… educação.
Pela valorização dos professores, qualidade do aprendizado, a escola como fator de igualdade de oportunidades, a qualificação dos jovens, a excelência das universidades. No primeiro texto depois de anunciado, ele prometeu focar nos municípios, na perspectiva individual e nas diferenças regionais. E terminou com a saudação bolsonarista: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”.
Com Mozart Neves, sabia-se o que ele significava e pretendia, porque ele não divaga sobre ideologias e ameaças fantasmagóricas e é, sim, uma reluzente referência do Instituto Ayrton Senna. Precisa dizer mais? Por isso, foi descartado com tanta ligeireza e escorraçado pela bancada evangélicas, que testou forças e ganhou.
Talvez fosse melhor Jair Bolsonaro trocar a metafísica do distante Olavo de Carvalho pelos critérios de Paulo Guedes. Vamos combinar que as escolhas do ministro da Fazenda para salvar a economia do País estão sendo bem mais pragmáticas, úteis e consensuais do que as do filósofo erudito para salvar o mundo e o Brasil dos próprios demônios dele.