No mundo político, só se fala em vices; no mundo real, nem se fala nos presidenciáveis
Os eleitores demonstram profunda indiferença pela eleição e não estão nem aí para os próprios candidatos à Presidência da República, quanto mais para aqueles que disputam as vagas de vice. Mas, no mundo político, só se fala nisso, freneticamente: quem vai ser vice de quem?
As pesquisas em São Paulo – São Paulo! – mostram que muita gente ainda nem sabe que Geraldo Alckmin, ex-governador do Estado por três vezes, é candidato novamente à Presidência. E elas vão se preocupar com o vice? Sem Josué Gomes da Silva, que nove entre dez presidenciáveis disputavam, está aberta a disputa entre PP, PR, DEM, Solidariedade e PRB para indicar o (ou a) vice. Sem esquecer o PSD.
Já o caso do PT de Lula e do PSL de Jair Bolsonaro é ainda pior. Oficialmente, o PT nem candidato a presidente tem, com Lula preso em Curitiba e Fernando Haddad rouco de tanto dar entrevistas, mas só como “coordenador do programa”. As opções para vice dependem do cabeça de chapa e de alianças que, até agora, não vieram.
Já Bolsonaro convive com uma profusão de nomes para a vice, um mais engraçado do que o outro. Os últimos são o do “príncipe” Luiz Philippe de Orleans e Bragança e do astronauta Marcos Pontes. Os marechais Deodoro da Fonseca e Floriano Peixoto devem estar se remoendo no céu, ou na cova, diante desse namoro de um capitão reformado do Exército com a monarquia, derrubada a duras penas. E o que dizer de um astronauta na vice? É piada pronta, ou coisa de lunático.
Bolsonaro já pensou em ter na vice o senador Magno Malta, pastor evangélico, e dois generais reformados, Augusto Heleno e Hamilton Mourão, mas a preferida é a professora Janaina Paschoal, uma das autoras do impeachment de Dilma Rousseff – e que chorou quando o próprio pedido deu certo.
Se Bolsonaro tem essa profusão de opções, Ciro Gomes está no lado oposto: rejeitado pela esquerda e pelo Centrão, não consegue fechar alianças e chega à reta final sem nenhum nome forte para a vice. Vai depender das negociações do PDT com o PSB – que está dividido entre apoiar Ciro, agarrar-se a Lula ou liberar geral para cada um fazer o que bem quiser.
E Marina Silva, que era vice de Eduardo Campos e assumiu a cabeça de chapa com a morte dele, só acena com nomes da própria Rede, o que equivale a chover no molhado. Chapas puro-sangue (com candidato a presidente e a vice do mesmo partido) são próprias de siglas fortes, com estrutura, boas bancadas e tempo de TV. Não para pequenos partidos isolados, sem nenhuma dessas condições ou vantagens.
Mas, afinal, por que esse frenesi pela definição da vice, se nem os próprios candidatos a presidente empolgam? Primeiro, por uma questão prática: vice consolida alianças, traz tempo de TV, “agrega valor” regional, ou de gênero, ou financeiro, às campanhas. Segundo, por uma questão mais simbólica, hipotética: a história registra que José Sarney, Itamar Franco e Michel Temer só viraram presidentes por impedimento dos titulares. Um golpe de sorte? Só tem sorte quem está bem colocado, no lugar certo e na hora certa.
Os próprios eleitores já encamparam a ideia de que impeachments não são bichos de sete cabeças e podem muito bem acontecer. São parte do jogo. Aliás, pesquisa estimulada Record-Real Time detectou que 33% se declaram “muito preocupados” e 17% “razoavelmente preocupados” com a possibilidade de o futuro presidente seguir a trajetória de Collor e Dilma e sofrer impeachment. E lá viria mais um vice.
A advertência do juiz Sérgio Moro no Fórum Estadão de quarta cai como uma luva nesse contexto: o resultado da eleição não pode pôr em risco a Lava Jato. Senão, o pau vai comer e o vice é que vai se dar bem.