Se Trump perder, arrasta junto a política externa e os delírios internacionais de Bolsonaro
O Brasil é o Brasil, o presidente Jair Bolsonaro é o presidente Jair Bolsonaro. O que é bom para o Brasil não é necessariamente bom para Bolsonaro e a recíproca é verdadeira. Aliás, muitas vezes é o oposto. O risco de derrota de Donald Trump é também de Bolsonaro, com sua política externa e seus delírios ideológicos, mas não para o Brasil, que lucra com um mundo melhor.
Com Trump e os Estados Unidos era uma coisa, sem ambos é outra. O projeto de um mundo de extrema direita vira um sonho (ou pesadelo) de uma noite de verão. É hora de acordar e cair na realidade – que, aliás, não está fácil, com pandemia, economia quebrada, dívida pública descontrolada e milhões de desempregados. O caos não é ideológico, é real.
Em 2018, após a vitória do pai, o deputado Eduardo Bolsonaro patrocinou a Cúpula Conservadora das Américas, em Foz do Iguaçu, como contraponto ao Foro de São Paulo, das esquerdas, mas a sociedade não deu bola para um nem para o outro. Em 2019, no primeiro ano de governo, ele voltou à carga, anunciando “o maior evento conservador do mundo” em São Paulo, mas só se ficou sabendo que o filho 03 foi recebido aos gritos de “mitinho” e que o seu guru só apareceu no telão, direto da Virgínia.
O 03 orna a parede da sala de jantar com um rifle (ou sei lá o que é aquilo), fritou muito hambúrguer nos EUA, desfilou com o boné da reeleição de Trump e passou vergonha ao ser indicado pelo papai para ser embaixador em Washington. Por sorte (dele e do Brasil), os senadores avisaram que era um pouco demais.
A ideia morreu, mas o delírio conservador – e autoritário – sobreviveu. Em fevereiro deste ano, o chanceler Ernesto Araújo – que definiu Trump como o único Deus capaz de salvar o Ocidente – foi a Washington para a criação, com EUA, Hungria e Polônia, de uma “Aliança Internacional pela Liberdade Religiosa”. O carimbo de “religiosa” escamoteava algo muito mais ambicioso.
O passo seguinte seria a ida do próprio presidente Bolsonaro à Hungria e à Polônia, ainda neste segundo semestre, para consolidar a aliança da extrema direita. Por ironia, a pandemia de Covid 19, tratada com igual ignorância por Trump e sua réplica brasileira, impediu a empreitada. Sem a reeleição de Trump, o que Bolsonaro poderia fazer agora em Budapeste e Varsóvia? Só chorar as mágoas.
O democrata Joe Biden não tem nada de socialista, diferentemente do que disse Trump e os cubanos e venezuelanos da Flórida engoliram. Biden é um liberal na economia, antirracista, defensor de minorias, direitos humanos, meio ambiente Acordo Climático de Paris, ONU, OMC e OMS. Eleito, interromperá as investidas de Trump e dos Bolsonaro, calcadas em ódios e armas, sob inspiração do mentor da extrema direita internacional, Steve Bannon, que nem Trump aguentou e anda às voltas com a polícia.
Sem Trump e EUA, evaporam o projeto ultra conservador e política externa de Bolsonaro. Bolsonaro chutou China e Europa porque tinha Washington na retaguarda, mas, agora sozinho, repete o muxoxo de que as potências querem nos tomar a Amazônia e empurrar a América do Sul para a esquerda. Não tem pé nem cabeça tanto que, sob a perspectiva de vitória de Biden, as Bolsas subiram, o dólar caiu no Brasil. Esse mercado está cada vez mais socialista…
Com a cabeça no lugar, o vice-presidente Hamilton Mourão trata a China com pragmatismo e lembra que a relação entre Brasil e EUA é entre Estados, não entre pessoas. É um claro contraponto a Bolsonaro, tão candidato a perdedor quanto Trump. O Brasil, porém, não perde nada com o equilíbrio político e pessoal de Joe Biden e a obrigação de voltar fazer política externa. Bolsonaro e Ernesto Araújo são capazes de fazer?