Enquanto bombeiros tentam apagar fogo na Europa, no Brasil fazendeiros queimam a Amazônia
A ativista adolescente Greta Thunberg costuma afirmar, na tentativa de acordar os adultos para a emergência climática: “Nossa casa está em chamas”. No momento, a sueca de 16 anos atravessa o oceano num barco à vela rumo à Conferência da ONU, em Nova York. O que Greta pode não ter imaginado, porém, é ainda mais assustador: fazendeiros e grileiros atearem fogo na floresta, deliberadamente, como manifesto político. É o que aconteceu na Amazônia, em 10 de agosto, segundo foi anunciado no jornal de Novo Progresso.
Fazendeiros e grileiros do entorno da BR-163, uma das regiões de maior conflito na Amazônia brasileira, programaram o “Dia do Fogo”. Na data, queimaram áreas de pasto e em processo de desmatamento. Segundo uma das lideranças, entrevistada pelo jornal Folha do Progresso, setores do agronegócio se sentem “amparados pelas palavras de Jair Bolsonaro”, que estimula a abertura das áreas protegidas da floresta para exploração agropecuária e mineração. Disseram também que desejavam mostrar ao presidente do Brasil “que querem trabalhar e o único jeito é derrubando, e para formar e limpar nossas pastagens é com fogo”.
Tudo indica que conseguiram. Anunciaram, pelo jornal, cinco dias antes. E cinco dias depois a Amazônia queimou — mais. Segundo os dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, na data marcada Novo Progresso teve um número 300% maior de “queimadas”, com 124 focos de incêndio. No dia seguinte, o número saltou para 203. Em Altamira, as estatísticas mostraram uma realidade ainda mais assustadora: 743% de aumento, com 194 focos de incêndio. No domingo, chegaram a 237.
Enquanto Greta Thunberg navega para Nova York, sua frase se literaliza: há incêndios em diferentes partes do planeta, da Gran Canária, na Espanha, a Sibéria, na Rússia. A conexão com a crise climática pode ser mais ou menos direta. Na Europa, os focos apareceram depois do julho mais quente da história. No Ártico, os incêndios recordes criaram um ciclo vicioso: o fogo libera CO2 para a atmosfera e agrava o colapso climático. O trabalho dos bombeiros, em todas as partes, está sendo dificultado pelas ondas de calor e pela falta de umidade. Na América Latina, a Amazônia queima, assim como pedaços da Bolívia e do Paraguai.
As más notícias para superaquecer o planeta não param. Diante da explosão do desmatamento no Governo de Bolsonaro, Alemanha e Noruega suspenderam quase 300 milhões de reais destinados à proteção da Amazônia. Bolsonaro respondeu ao Governo alemão: “A Alemanha vai parar de comprar a Amazônia a prestações”. E, aos noruegueses: “Pega a grana e ajude a Angela Merkel a reflorestar a Alemanha”.
Bolsonaro não é apenas estúpido — e muito mal educado. As declarações servem para acirrar a paranoia de seus seguidores: o antipresidente e seu clã defendem que a preocupação com a floresta é uma desculpa para tomar a Amazônia do Brasil. O curioso nacionalismo pregado por Bolsonaro amaldiçoa a Europa em nome da soberania e se curva até a cueca aparecer diante dos Estados Unidos de Donald Trump. Para setores do empresariado brasileiro, porém, a única boa notícia no atual governo foi o acordo entre União Europeia e Mercosul, costurado durante 20 anos pelos governos anteriores e hoje ameaçado pela escandalosa destruição da Amazônia. A Europa precisa decidir: se continuar comprando carne de desmatadores e produtos empapados de agrotóxicos, o agronegócio predatório vai continuar se sentindo à vontade para ampliar os dias de fogo, estimulado pelo perverso que hoje lidera o Brasil.