Estratégia da defesa e eventual morosidade da Justiça podem arrastar novela até 2019. Especialistas discutem os cenários após condenação do petista em Porto Alegre
A confirmação da sentença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelos desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) em Porto Alegre, nesta quarta-feira, coloca um grande ponto de interrogação para a eleição presidencial deste ano e para o futuro político do petista. Por um placar de 3 a 0, a Corte manteve a condenação e ampliou a pena de nove anos e seis meses assinada pelo juiz Sérgio Moro para 12 anos e um mês, que condenou o ex-sindicalista pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex no Guarujá, que seria dado pela empreiteira OAS a ele como pagamento de propina. Sob o petista agora pairam duas sombras: a da inelegibilidade (impossibilidade de ser eleito) e uma possível (mas ainda longe de ser uma possibilidade imediata) prisão, o que pode colocar as eleições de 2018 em um clima de insegurança jurídica e política. Seja como for, uma grande novela política ainda está por vir. E até que o Supremo Tribunal Federal ou o TSE (Tribunal Superior Eleitoral), as últimas instâncias possíveis, declarem que ele é inelegível, ele pode continuar a fazer campanha.
Agora existem alguns caminhos possíveis para Lula tentar, após a condenação, chegar ao Planalto. Cada um com consequências e tempos diversos. Seu problema mais imediato tem relação com uma lei que ele mesmo sancionou: o então presidente assinou a Lei Ficha Limpa, que impede políticos condenados por órgão colegiado (mais de um juiz, como o TRF-4) de disputar cargos públicos por oito anos, mesmo sem uma sentença definitiva (no Supremo Tribunal Federal, por exemplo). Este agora é seu próprio caso e acabou por reabrir um debate jurídico sobre a restrição.
Seja como for, a Lei Ficha Limpa tem uma espécie de brecha que pode manter o petista no páreo, ainda que provisoriamente. Este seria outro caminho para o ex-presidente poder disputar a eleição. A legislação permite que o candidato barrado faça um pedido liminar para suspender a inelegibilidade, e assim concorrer. Neste caso, a defesa do ex-presidente aciona o Superior Tribunal de Justiça ou o STF, e caso o pedido seja deferido temporariamente Lula poderá registrar sua candidatura e levar adiante sua a campanha a partir de 16 de agosto.
Mas mesmo com a concessão da liminar, nada garante que Lula possa disputar. Isso porque “a lei estipula que caso seja concedida essa liminar haverá um caráter de urgência para que o tribunal superior analise o caso”, afirma o juiz Márlon Reis, um dos idealizadores da medida. Ou seja, o STF e o STJ terão que definir em curto prazo se o petista pode ou não ser candidato. “Além disso, mesmo se a liminar for revogada apenas após o candidato vencer o pleito, ele perde o mandato do mesmo jeito”, diz. Esta situação provocaria um impasse político, na medida em que novas eleições teriam de ser convocadas. “Veja, mesmo neste cenário não se trata de insegurança jurídica, e sim insegurança política. A lei é clara e bem delimitada”, afirma Reis.
Outro problema, ainda que menos provável, para a candidatura do ex-presidente que pode tirar sua foto das urnas eletrônicas no dia do primeiro turno, em 7 de outubro, ocorrerá caso o STF o condene no meio tempo. Neste caso, o PT poderia escolher outro candidato desde que notifique o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) até 20 dias antes do pleito.
Existe ainda uma terceira via para Lula. Este cenário é o mais complicado do ponto de vista jurídico e político, uma vez que também pode fazer com que ele dispute, vença, mas não tome posse. O petista poderia abrir mão de recursos e pedidos de liminar, registrar a candidatura e fazer campanha até que o TSE analise o caso. Se o Tribunal negar o registro, caberá ainda ao STF dar a palavra final. Exista uma possibilidade de que o TSE não se posicione sobre o caso até o dia da eleição. Neste caso, a situação teria que ser definida pela Justiça até dezembro de 2018, quando seria expedido o diploma de presidente. Se no final do ano o registro da candidatura for cassado, Lula perderia o mandato, o presidente da Câmara assumiria interinamente e novas eleições seriam convocadas. O juiz Marlon Reis não acredita que essa seja uma estratégia eleitoral viável para o ex-presidente: “Para que isso ocorra o Ministério Público teria que deixar de notificar o TSE sobre a condenação criminal de Lula. O MP tem sido muito diligente e ágil nessas questões, analisam candidato por candidato”.
Rediscussão da prisão em segunda instância pelo STF
O outro problema que ronda Lula é o risco de prisão. Com relação ao início do cumprimento de pena pelo ex-presidente, o próprio TRF4 já divulgou nota afirmando que “a determinação de execução provisória da pena pelo TRF4 só ocorrerá após o julgamento de todos os recursos do segundo grau [que é a própria Corte]”. A defesa de Lula tem dois dias para recorrer da nova condenação unânime.
Não é possível prever quanto tempo o tribunal irá demorar para analisar os recursos da defesa. Caso eles sejam negados pelos desembargadores, aí sim a situação do ex-presidente se complica do ponto de vista da prisão. Isso porque uma decisão controversa do Supremo Tribunal Federal de outubro de 2016 permite a execução da pena após a condenação em segunda instância. Até então a prisão só era permitida após a análise de todos os recursos em todas as instâncias – incluindo o próprio STF. Uma súmula do próprio TRF-4 reforça esse entendimento. De qualquer forma, alguns ministros do Supremo já optaram por contrariar esta nova resolução, determinando que os condenados continuem em liberdade até o trânsito em julgado. Provavelmente a Corte ainda terá que se debruçar novamente sobre o tema. Um dos que já se manifestou sobre o assunto foi o ministro do STF, Gilmar Mendes. Ele, que votou pelo regime fechado após condenação em segunda instância, sinalizou que pode mudar de ideia. Sua guinada, se considerarmos o último mudaria o placar.