44 parlamentares que concorrerão à reeleição já gastaram 122.000 reais de recursos públicos para se promoverem na rede social
Por Afonso Benites, do El País
As regras sobre o impulsionamento de publicações em redes sociais durante a campanha só começarão a valer de fato em agosto, mas ao menos 44 deputados federais já usam o dinheiro público para ampliar a divulgação das atividades de seus mandatos e, indiretamente, se apresentarem ao eleitorado em um ano em que a maioria deles disputará a reeleição. Um levantamento feito pelo EL PAÍS na área de transparência da Câmara constatou que, entre janeiro de 2016 e junho de 2018, esses parlamentares pagaram 122.265,50 reais para o Facebook, a principal rede em que as publicações são patrocinadas e difundidas aos seus usuários. Os gastos estão dentro da cota para o exercício da atividade parlamentar.
“Impulsionar as postagens é a melhor maneira que encontrei para chegar aos meus eleitores em locais onde jamais eu teria espaço na mídia tradicional”, afirmou o deputado Hiran Gonçalves (PP-RR). Algumas de suas postagens atingiram 20.000 internautas, é mais do que o dobro do número de votos que ele recebeu na eleição passada, 9.048. Gonçalves está entre os dez deputados que mais investiram diretamente no Facebook no último ano e meio. Ele gastou 7.400 reais, conforme os dados apresentados por ele para o setor de transparência da Câmara. No topo dos que mais gastaram com impulsionamentos de posts estão Evandro Roman (PSD-PR) e Adail Carneiro (PODE-CE). O primeiro investiu 12.891 reais de recursos públicos e, o segundo, 11.129 reais.
Estes dados, entretanto, não representam a realidade fiel dos gastos de deputados com o impulsionamento nas redes. Não estão inclusos no valor gasto com o Facebook aquilo que os parlamentares pagaram para que intermediários patrocinassem suas publicações. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), por exemplo, investe mensalmente 20.000 reais em uma agência, que tem como atribuições coordenar toda a comunicação de seu mandato, incluindo o patrocínio de publicações.
Assim como Maia, há ao menos uma centena de deputados que usam do mesmo expediente, o que dificulta a fiscalização e a filtragem precisa do quanto é de fato gasto com o patrocínio de conteúdo nas redes sociais. Por ano, os 513 deputados brasileiros gastam em média 50 milhões de reais com a propaganda de suas atividades. São recursos que são destinados para agências de comunicação, assessorias de imprensa, gráficas, emissoras de rádio e TV, além de jornais e revistas.
Em dezembro do ano passado, o Tribunal Superior Eleitoral autorizou que todo conteúdo produzido por candidatos para as eleições de 2018 seja impulsionado nas redes sociais. Ou seja, os concorrentes aos cargos de presidente, governadores, senadores, deputados federais e estaduais poderão pagar para que as postagens feitas em redes como Facebook, Twitter e Instagram sejam direcionadas e exibidas a um grupo maior de internautas/eleitores. Essa foi uma das principais mudanças nas regras de propaganda eleitoral brasileira dos últimos anos.
Ao menos 54% dos lares brasileiros possuem acesso à Internet, de acordo com a pesquisa TIC Domicílios, e boa parte delas usa as informações absorvidas pelos meios digitais para tomar decisões de maneira geral. Ainda se debate a real influência que o acesso pode ter na hora do voto. Se a controvérsia ainda é grande a respeito dos efeitos nas últimas eleições pelo mundo, como na de Donald Trump nos Estados Unidos ou no Brexit, também há pesquisas internacionais que indicam que poucos usuários se lembram de terem visto anúncios nas redes sociais.
44 deputados federais gastaram 122.000 reais em patrocínios direto de posts no Facebook
Até as eleições de 2016, nenhuma postagem feita por candidatos ou partidos políticos podia ser patrocinada. Agora, poderão, desde que sejam identificadas como propaganda eleitoral, assim como já ocorre nos anúncios feitos em revistas ou jornais impressos. As publicações impulsionadas pelos candidatos ou partidos poderão ocorrer a partir de 16 de agosto. Antes, porém, detentores de mandatos eleitorais continuarão usando do artifício para ampliar a divulgação de seus trabalhos.
Representantes do Facebook e do Google participaram de debates públicos no TSE e de reuniões privadas com técnicos do órgão para discutir as regras. Em princípio, conforme o EL PAÍS apurou, as empresas informaram que a identificação das postagens como publicidade eleitoral seria inviável. Depois, quando notaram a quantia de dinheiro que abririam mão de receber, voltaram atrás e informaram que viabilizariam essa identificação. Como o impulsionamento jamais foi usado em campanhas no Brasil, ainda não há uma estimativa oficial de quanto deverá ser gasto com essa ferramenta.
A estratégia de investir apenas na Internet, contudo, não é vista como a mais adequada para quem quer tentar se eleger, mesmo em períodos em que as campanhas terão menos recursos em decorrência do veto a doações empresariais e à reforma política, que limitou o gasto de fundos públicos em campanhas. “Como os órgãos de controle estão em cima dos gastos há um esforço para direcionar os recursos para Internet. Mas é um erro investir só na Internet ou nas redes sociais. Quase a metade da população brasileira não tem acesso a elas. O rádio e a TV não podem ser ignorados nesse momento”, ponderou o pesquisador do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital, Rodrigo Carreiro.
Doutor em Comunicação e Cultura Contemporâneas, Carreiro é um dos especialistas que se debruçam sobre a influência das redes sociais na política. Em sua visão, além da preocupação com o aumento das postagens patrocinadas, os eleitores e os órgãos de controle também terão de fiscalizar a disseminação das fake news.
“Teremos muitas fake news em 2018. O cuidado que o público deve ter é o de checagem da informação. Terão de ver em que veículo ou site ou perfil está saindo essa informação. Se foi dada por mais de um veículo ou se só saiu em um específico, sem credibilidade”, alertou Carreiro. Para ele, a polarização política na qual o país está afundado nos últimos anos deverá aumentar e, por isso mesmo, haverá impulso à divulgação de boatos. “Um público mais identificado com um candidato tende a acreditar mais nessas notícias falsas. Ele tateia no mercado de informação apenas o que lhe convém”, avaliou.