No Brasil já se fala, sem meias palavras, que o presidente e a maior parte de seu Governo parecem ineptos para confrontar os grandes desafios que têm pela frente
O atual mandato presidencial no Brasil começou há pouco mais cinco meses, mas já começam a se escutar alarmes sobre a possibilidade de que Jair Bolsonaro não termine seu mandato. Não só porque ele aparece sem um projeto de país concreto, mas também porque o pouco já realizado é alvo de duras crítica até por parte de muitos que o elegeram e hoje não o fariam, conforme mostram todas as pesquisas em que, apesar dos 57 milhões de votos conquistados nas urnas, seu apoio desvanece. Recente pesquisa da Atlas Político mostrou que apenas 28% dos entrevistados consideravam sua gestão boa ou ótima, contra 36,2% que a veem como ruim ou péssima. Entre os que o apoiam estão um exército de radicais que desejaria devolver o Brasil aos tempos do pior obscurantismo, com uma política apoiada em messianismos alucinados, com suas preocupações fálicas e uma mórbida obsessão pelas armas.
Poderia parecer incrível num país normal que em cinco meses de Governo já se fale já abertamente na possibilidade de impeachment do presidente, não só pelo que ele não fez, mas também pelo que fez até agora, que está revelando uma forte desconfiança sobre sua capacidade de governar um Brasil-continente com 207 milhões de pessoas que já começaram a sair às ruas. E sobre como deseja conduzir o tema da educação, um ponto crucial deste país com ainda milhões de analfabetos funcionais e da qual depende também seu futuro econômico.
O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia, acaba de dizer ao jornal O Globo que o Brasil “caminha para um colapso social” com o novo Governo, que ainda não soube apresentar um projeto para fazer frente às graves crises que o afligem e que poderia levá-lo a uma catástrofe econômica se em vez de apoiar as reformas urgentes acabar boicotando-as para favorecer propostas milagrosas e às vezes até patéticas.
Preocupa à sociedade democrática um presidente que parece alheio às reformas enquanto se perde em fantasia messiânicas, como quando afirma que ainda “não nasceu para ser presidente”, pois foi algo que Deus lhe impôs. E assim repete, às vezes chorando diante das câmeras de televisão, enquanto levanta a camisa e mostra as cicatrizes do atentado que sofreu durante a campanha eleitoral. Deus, segundo ele, está ao seu lado e o escolheu como um novo Messias.
Junto a esse messianismo profético, o presidente continua tão obcecado em armar os brasileiros que seu primeiro decreto foi para ampliar a posse de armase seu porte para toda a sociedade, decreto contra o qual acabam de se manifestar 73% dos brasileiros, segundo a última pesquisa de Ibope. Multiplicar as armas nas mãos das pessoas deve parecer melhor para o país que multiplicar o pão nas mãos dos ainda milhões de pobres e as possibilidades para os jovens de um ensino que os prepare para se realizarem em liberdade e criatividade. E sem absurdas receitas de escolas sem partido, de alunos espiões e denunciantes de seus professores e o pavor de que nelas se possa falar de sexo, que é como proibir falar da vida.
Há uma história que revela o absurdo de uma presidência em seus temores relacionados com o sexo. Em abril passado, saindo do Ministério da Educação, coração do futuro nacional, o presidente confiou a um grupo de jornalistas uma de suas maiores preocupações no momento. Sobre o drama da educação no país? Não. “Temos por ano mil amputações de pênis por falta de água e sabão”, contou-lhes, e acrescentou: ”Quando se chega a este ponto, a gente vê que estamos no fundo do poço”. Essa preocupação com a higiene masculina e as proporções de suas genitálias perturba tanto o presidente que poderia ter criado uma crise diplomática com o Japão, ao dizer que naquele país “tudo é pequeno”, referindo-se ao órgão masculino.
A obsessão do presidente por tudo o que é fálico está preocupando até os psicólogos e psicanalistas, como Contardo Calligaris, que na Folha de S.Paulo, analisando estas obsessões fálicas do presidente, afirmou: “Não se pode entender uma posição repressora contra os outros, seja qual for, a não ser como um modo da pessoa reprimir e lutar com a sua própria dificuldade”.
Já João Luiz Mauad, do Instituto Liberal e colunista de vários jornais do país, escreveu que ainda não é hora de falar no impeachment do presidente, já que “improvisação, amadorismo, incompetência, idiotice e histrionismo não são, por si sós, suficientes para abrir um processo de impeachment contra um presidente”. Talvez seja verdade juridicamente, mas um presidente com todas essas “qualidades” não parece o mais bem preparado para conduzir o transatlântico Brasil, o quinto maior pais do mundo e com imensas riquezas naturais que, além disso, o presidente parece querer destruir.
No Brasil já se fala, sem meias palavras, que o presidente Bolsonaro e a maior parte de seu Governo parecem ineptos para confrontar os grandes desafios que têm pela frente. Até agora parece, entretanto, que Bolsonaro continua em campanha eleitoral, dialogando só com o grupo de radicais de extrema direitaque permaneceram fiéis a ele, sem ainda demonstrar que é quer ser o presidente de todos os brasileiros, como exige a Constituição.
O presidente continua confundindo as redes sociais com a realidade viva do país e parece ter aterrissado de outra galáxia, sem entender que o Brasil é uma nação que importa no mundo e que já aceitou a modernidade faz muito tempo. E, pior ainda, está destruindo no exterior, com sua incapacidade de governar e suas obsessões de caráter messiânico e psiquiátrico, a imagem positiva e até invejável até ontem atrelada a este país, coração econômico do continente e cadinho de mil experiências culturais que estão sendo pisoteadas.
ERRATA
O texto original deste artigo mencionava que dos 57 milhões de votos recebidos pelo presidente Jair Bolsonaro nas eleições, apenas 30% mantinham o apoio. Na verdade, são 28% os que consideram o Governo de Bolsonaro bom ou ótimo, segundo pesquisa do Atlas Político.