El País: Após estagnar, Bolsonaro dá sinais de recuperação nas redes, sua boia de salvação

Candidato sai de sua zona de conforto na Internet para participar do programa Roda Viva. Resiliência da candidatura mesmo sem tempo de TV é maior incógnita da campanha até agora.
Foto: Roda Viva/TV Cultura
Foto: Roda Viva/TV Cultura

Candidato sai de sua zona de conforto na Internet para participar do programa Roda Viva. Resiliência da candidatura mesmo sem tempo de TV é maior incógnita da campanha até agora

Por Afonso Benites, do El País

Aconteça o que acontecer, o futuro do fenômeno Jair Bolsonaro, o pré-candidato de extrema-direita ao Planalto, vai depender de sua capacidade de capitalizar o uso das redes sociais. É que o seu PSL não conseguiu fechar alianças e, por causa disso, o ex-capitão do Exército terá reduzido espaço na propaganda oficial de rádio e TV – o partido terá menos de 10 segundos diários na programação de 24 minutos – e ausência de palanques fortes nos Estados. O problema para o presidenciável, e não só para ele, é que ainda não se sabe o quanto a eleição brasileira ainda é dependente do horário eleitoral gratuito, que começa em 31 de agosto. Antes mesmo que essa pergunta crucial seja respondida, a Internet, considerada maior trunfo e boia de salvação do militar reformado, deu sinais de arrefecer no fervor por sua candidatura. Nas últimas semanas, o apoio a Bolsonaro na redes sociais estagnou em relação ao seus concorrentes de campanha, segundo levantamento da consultoria Atlas Político. Só deu sinais de recuperação nos últimos dias, justo antes e na esteira de sua participação no programa Roda Viva, da TV Cultura, nesta segunda-feira.

A participação no Roda Viva é um dos testes de fogo de Bolsonaro, que lidera as pesquisas de opinião, ainda que sem grandes crescimentos recentes, se o nome de Luiz Inácio Lula da Silva, preso em Curitiba, não é considerado. No centro do cenário e cercado de jornalistas, ele deixou sua zona de conforto nas redes, onde fala para boa parte dos convertidos, e se deparou com representantes dos principais jornais brasileiros, muitos dos quais ele critica frequente e insistentemente. Os primeiros momentos do pré-candidato foram tensos. Aparentando estar nervoso, ele enfrentou uma bateria de perguntas sobre as violações de direitos humanos cometidas durante a ditadura militar. Ele repetiu sua argumentação negacionista: argumentou que não houve golpe em 1964 e minimizou o uso de tortura, que descreveu como o uso, “talvez”, de “algumas maldades”. Em outro momento, chegou a elogiar o ex-deputado preso pela Operação Lava Jato, Eduardo Cunha, pelo apoio do carioca ao projeto que obriga a existência de voto impresso. “Eu gostaria de ter estado mais vezes ao lado do Eduardo Cunha”, disse. No decorrer dos blocos, fugiu de perguntas específicas sobre propostas programáticas, como para a recuperação econômica, e manteve o tom de enfrentamento e discurso contra as mazelas da escravidão e as cotas raciais.

Do seu desempenho na espécie de paredão midiático depende uma nova injeção de ânimo nas redes, como já aconteceu com pré-candidatos que passaram na bancada antes dele. Até agora, quem se deu melhor na aparição foi Manuela D’Ávila (PCdoB), que ganhou mais de 18.000 novos seguidores contando apenas o dia da entrevista e os dois dias de repercussão – as frequentes interrupções à pré-candidata provocaram um debate sobre machismo no programa. “De todos, Manuela, Guilherme Boulos e Álvaro Dias se destacaram. Geraldo Alckmin e Marina Silva não impressionaram”, comenta Andrei Roman, do Atlas Político.

Nos números da consultoria, desde que intensificou sua campanha eleitoral e passou a participar de entrevistas e sabatinas, o número de seguidores do presidenciável Bolsonaro no Facebook – ele é recordista, com mais de 5 milhões de pessoas – ou caiu ou estagnou na comparação dia a dia. Nem mesmo em 22 de julho, quando foi oficializado como o candidato à presidência do PSL, ele registrou crescimento considerável. Naquele dia, entre 13 pré-candidatos monitorados pelo Atlas Político, o deputado de extrema direita ficou na sétima colocação dos que mais recebiam novos seguidores. Nos últimos dias, contudo, começou a receber novos seguidores. Só entre os dias 27 e 29 deste mês, ele ganhou 30.799 seguidores. Atualmente, é o segundo que mais registra novos fãs na rede social. Fica atrás apenas de João Amoêdo, do NOVO. No caso desse, porém, esse crescimento é resultado do patrocínio de posts.

Não só Bolsonaro depende das redes. Outros nomes concorrentes de partidos nanicos como Amoêdo, Marina Silva (REDE), Guilherme Boulos (PSOL) e Álvaro Dias (PODEMOS) também. De outro lado, conglomerados de esquerda e direita dividirão a maior fatia da propaganda oficial. Até o momento, Geraldo Alckmin detém quase 12 minutos diários da programação por causa da aliança de seu PSDB com outros oito partidos. Ainda aguardando uma definição de legendas como PSB, PCdoB e PT, Ciro Gomes (PDT) poderá agregar outra fatia desse bolo – se o PT desistir de candidatura própria—, enquanto que o MDB, sozinho, somará outros dois minutos e meio. “Dado que a gente vive uma situação diferente, em que parte dos líderes das pesquisas não tem tempo de TV, as redes sociais passam a ser o principal espaço que eles têm para atuar. Por isso sua importância aumenta neste ano”, explicou o cientista de computação e professor da Universidade Federal de Minas Gerais, Fabrício Benevenuto, que coordena um projeto de acompanhamento da campanha política nas redes.
Gráfico mostra o desempenho dos pré-candidatos nas redes no dia da aparição do Roda Viva e nos dois dias seguintes. Manoela D’Ávila foi a que mais capitalizou a aparição.
Gráfico mostra o desempenho dos pré-candidatos nas redes no dia da aparição do Roda Viva e nos dois dias seguintes. Manoela D’Ávila foi a que mais capitalizou a aparição. Atlas Político
Variação de engajamento

Desde o início de junho, proporcionalmente o espaço que Bolsonaro tinha em comparação com os demais concorrentes também sofreu grandes oscilações de 11% a 38%, ainda segundo a consultoria de Andrei Roman. No dia 29, último dado disponibilizado pelo Atlas Político, 27% das interações com os presidenciáveis eram feitas por meio de Bolsonaro, atrás apenas de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com 39%. O engajamento é o sinônimo de todas as interações envolvendo um perfil do Facebook. Isso inclui os compartilhamentos, os comentários e as curtidas feitos sobre as postagens desse usuário.

A par da redução de seguidores e a grande oscilação entre o engajamento de suas postagens, Bolsonaro decidiu orientar seus admiradores a o seguirem em outra rede social chamada Mano, na qual tem a TV Bolsonaro. É um aplicativo nacional no qual, segundo os coordenadores da campanha dele, seria mais confiável do que o Facebook. Em um dos vídeos em que pede o apoio de seus fãs, o deputado estadual Flávio Bolsonaro, filho do presidenciável ele diz que a campanha de seu pai tem sofrido um ataque covarde, uma censura. “Como muitos de vocês já sabem o alcance das nossas postagens nas grandes redes sociais, como o Facebook, tem sido absurdamente restringido”.

A aposta nas redes não é simples porque o terreno ainda é movediço. Ainda há dúvidas sobre a utilização das ferramentas – pela primeira vez os candidatos poderão investir dinheiro das campanhas para que sua mensagem chegue a mais pessoas – e sobre como a Justiça Eleitoral vai monitorá-la na prática. Há um debate em curso sobre o que é permitido ou não publicar, até mesmo porque tudo está sujeito às regras do Facebook, o gigante norte-americana que também é alvo de polêmicas nos EUA. Na semana passada, a companhia fechou quase duas centenas de páginas e 87 contas que, segundo a rede, infringiam suas normas. Parte delas é ligada ao Movimento Brasil Livre, um grupo de direita que influenciou no impeachment de Dilma Rousseff (PT). Oficialmente, a companhia alegou que havia “uma rede coordenada” “com o propósito de gerar divisão e espalhar desinformação”. O conceito de “espalhar desinformação” ainda está sendo debatido e questionado e nada descarta que novos expurgos voltem a ocorrer afetando as mesmas ou outras forças dos espectro político.

Mesmo fora do Facebook o cenário também é de mudança. A campanha de Bolsonaro diz apostar nos grupos de WhatsApp movimentados – que são quase 900 segundo disse seu apoiador, deputado Major Olímpio, à revista Piauí – para difundir sua mensagem. A questão é que o próprio WhatsApp resolveu restringir o número de encaminhamentos simultâneos de mensagens. Antes, não havia restrição. Desde o dia 19 de julho, contudo, esse número no Brasil foi diminuído para 20 contatos ou grupos.

https://www.facebook.com/rodaviva/videos/2033964346647837/

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