El País: Abraham Weintraub, um segundo ‘olavete’ no MEC para gerir a “terra arrasada”

Economista e professor, novo ministro da Educação prega contra o "marxismo cultural" e terá desafio de romper paralisia na pasta e encontrar solução para impressão do ENEM.
Foto: Rafael Carvalho/Casa Civil
Foto: Rafael Carvalho/Casa Civil

Economista e professor, novo ministro da Educação prega contra o “marxismo cultural” e terá desafio de romper paralisia na pasta e encontrar solução para impressão do ENEM 

Um professor universitário contra o “marxismo cultural”, que trata seus opositores como inimigos, especialista em Previdência social, que passou pelo mercado financeiro, mas nunca gerenciou nada na área educacional. Foi aluno de Olavo de Carvalho – o ideólogo do bolsonarismo. Esse é o novo ministro da Educação, o economista Abraham Weintraub. Ao lado de seu irmão, o advogado e professor Arthur Weintraub, administrou o Centro de Estudos em Seguridade e prega a bandeira ideológica e conservadora do Governo Jair Bolsonaro (PSL). Chega ao cargo com o desafio de administrar uma “terra arrasada” deixada por seu antecessor Ricardo Vélez. Entre idas e vindas,  Vélez demitiu mais de dez assessores e quatro secretários-executivos, além de não conseguir dar andamento a quase nenhum projeto em pouco mais de três meses de gestão.

Aos 47 anos de idade, Abraham Weintraub é professor universitário da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) desde 2014. Dois de seus colegas consultados pela reportagem disseram que ele teve uma passagem discreta pela universidade porque parecia se dedicar mais aos seus projetos pessoais do que à academia. Em 2014, apoiou a campanha presidencial de Marina Silva (REDE). Antes de abraçar a carreira acadêmica, Abraham atuou no Banco Votorantim e na Quest Corretora.

A aproximação dos irmãos Weintraub com presidente se iniciou há quase dois anos, por intermédio de Onyx Lorenzoni (DEM), o ministro da Casa Civil. Ao mesmo tempo ganhou a confiança do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), o filho mais novo do presidente. Em princípio, Abraham atuaria no ministério da Economia como um dos responsáveis por elaborar a reforma da Previdência. Mas o ministro Paulo Guedes preferiu nomear alguém com experiência legislativa para a função de secretário especial de Previdência e Trabalho. Afinal, era necessário convencer parlamentares sobre a necessidade de se aprovar a reforma. Assim, a vaga ficou com o ex-deputado federal Rogério Marinho (PSDB-RN). Abraham acabou, então, na secretaria executiva da Casa Civil. Enquanto isso, o irmão dele, Arthur, tornou-se chefe da assessoria especial da Presidência da República.

Na Cúpula Conservadora das Américas no ano passado, evento promovido pelo deputado Eduardo, Abraham chamou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva de sicofanta (mentiroso), disse que o ex-ditador cubano Fidel Castro era um playboy e que o petismo não estava morto, por isso teria de ser combatido. “Quando caiu o muro de Berlim, teve um monte de goiaba que falou: agora o comunismo acabou. Agora, que o Jair Bolsonaro ganhou, tem muita gente dizendo que o PT está derrotado, que podemos ficar tranquilos. Não, não podemos”. Ressaltou, ainda, lições de Carvalho, caso seus colegas professores passassem criticá-los por serem de direita. “A gente adaptou a teoria do Olavo de Carvalho de como enfrentar eles [comunistas] no debate intelectual. Não precisa mandar pastar. Quando eles falam, a ciência é burguesa, então vá embora daqui porque aqui é o templo da ciência, seu religioso”.

Nessa segunda-feira, em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, disse que não precisa seguir na íntegra o que o ideólogo sugere. “Ele tem ideias muito boas, mas não sigo ipsis litteris tudo o que ele fala. Não é porque gosto de música clássica que não escute rock and roll de vez em quando”. Dentro do MEC, contudo há a expectativa do retorno de boa parte dos olavetes que foram demitidos nas últimas semanas por Ricardo Vélez. Outras declarações do ministro também já provocam repercussão negativa, como a de que “crack foi introduzido de caso pensado no Brasil”. “Em vez de as universidades do Nordeste ficarem aí fazendo sociologia, fazendo filosofia no agreste, [devem] fazer agronomia, em parceria com Israel”, disse ele no ano passado, em uma transmissão ao vivo citada no UOL. 

Os desafios na pasta

Entre seus desafios na pasta está a impressão e organização do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), já que a gráfica que faria o trabalho declarou falência, e a definição de uma agenda na área de educação básica e a aproximação de áreas sensíveis, como ciência e tecnologia.

Desde que Vélez começou a perder força no cargo, há quase duas semanas, uma lista de nomes foi sugerida ao presidente. Além de Abraham, outros dois corriam por fora. O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) foi defendido pela bancada evangélica e o empresário e consultor em educação Stravos Xanthopoylos foi sugerido por membros do mercado educacional. O que pesou na escolha do presidente foram seus dois padrinhos Olavo e Onyx. Ambos foram consultados por Bolsonaro e a decisão anunciada nesta segunda-feira.

A troca foi vista de maneira positiva por apoiadores de Bolsonaro. “O MEC precisa de um bom gestor e não de um ideólogo do atraso, que defenda a revolução contramarxista do século XIX”, afirmou o cientista político Antonio Testa, um antigo colaborador do presidente na área de educação. Segundo ele, Abraham é um técnico capaz de gerenciar a pasta com o segundo maior orçamento do Governo, com 115 bilhões de reais.

Outros especialistas, contudo, entendem que a troca não deverá surtir efeito no Governo. Entendem, por exemplo, que é necessário empossar alguém com experiência na área educacional. “Todo esse jogo de cena, trazendo para o MEC pessoas completamente alheias ao sistema educacional tem como objetivo o desmonte”, afirmou o sociólogo César Callegari, ex-membro do Conselho Nacional de Educação e presidente do Instituto Brasileiro de Sociologia Aplicada.

Na opinião de Callegari, o papel de Abraham será o de defender os planos do ministério da Economia de desvincular a educação do orçamento da união. Conforme a Constituição, o Governo federal tem de investir 18% de seu orçamento em educação, enquanto que as gestões estaduais e municipais são obrigadas a gastar 25%. Uma proposta de emenda constitucional deverá ser enviada nas próximas semanas revisando esses percentuais.

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