Os artigos anteriores apresentaram resumidamente a essência clássica de uma austeridade fiscal conservadora para fazer frente aos déficits fiscais que se fazem presentes em determinados momentos históricos. Destacaram ainda que tal essência volta a ser defendida por círculos financistas como a “vacina” ideal para a recuperação financeira do Estado e enfrentamento da brutal depressão econômica verificada no Brasil, como prova a queda histórica 13,5% do Produto Interno Bruto (PIB) na comparação de abril de 2020 com abril de 2019, segundo o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).
O avanço veloz da pandemia do novo coronavírus Sars-Cov-2 e da Covid-1 criou uma situação fiscal preocupante: por trás, os gastos; pela frente, a dívida e, na cabeça, a dúvida. Com as reduções do PIB, do emprego, da renda, do consumo, da receita e o crescimento dos gastos, do déficit e da dívida pública, defende-se aqui que a austeridade não pode nem deve repetir seu receituário clássico conservador, pois sua reedição aprofundará a depressão e agravará o quadro social.
Destinar mais uma vez os resultados financeiros da austeridade em favor das oligarquias e do parasitismo financista especulativo – essa economia dos papeis que compra tudo o que é fruto concreto do saber e do suor humanos – é um crime social e econômico.
É necessária uma austeridade fiscal democrática financeiramente eficaz, socialmente inclusiva, promotora do desenvolvimento, que combata o desperdício, a ineficiência, a ineficácia e elimine a concessão de recursos públicos a grupos sociais e econômicos dominantes fortemente articulados politicamente no aparelho estatal e centros decisórios da República.
A natureza de uma austeridade democrática casada a uma reforma social e econômica rompe, assim, a histórica, repetitiva, criminosa e imoral austeridade fiscal que consistiu até agora em sacrificar os miseráveis mantendo intocáveis os privilégios do “andar de cima”, emprestando aqui a definição de Elio Gaspari.
Tal austeridade democrática supera a estreiteza de perspectivas e ações que caracteriza a política de austeridade conservadora defendida pelos grupos econômicos e financeiros dominantes e entusiasticamente cultuada pelos círculos financistas em torno ministro da Economia, Paulo Guedes.
Reunida quantitativamente a força política para lhe dar vida, o que não é nada fácil, os resultados financeiros da austeridade fiscal democrática podem ser qualitativamente direcionados para a melhoria dos serviços públicos essenciais, a inclusão produtivo-social de milhões cidadãos e ao apoio às empresas do presente e do futuro. (continua…)
*Eduardo Rocha é economista