Correio Braziliense: “O legado é o MDB continuar grande”, diz Renan

Eleitor de Lula, o senador diz que as candidaturas de Meirelles e Temer são ruins para o partido, que precisa se recuperar nas urnas.
Foto: Agência Senado
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Eleitor de Lula, o senador diz que as candidaturas de Meirelles e Temer são ruins para o partido, que precisa se recuperar nas urnas

Por Alessandra Azevedo e Denise Rothenburg, do Correio Braziliense

Conhecido nos últimos tempos mais pelos embates que protagoniza do que por consensos, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) se prepara para mais uma batalha dentro do partido que representa há praticamente quatro décadas, salvo o curto período em que apostou no PRN, de Fernando Collor, no início da década de 1990. Depois de ter feito, em várias oportunidades, duras críticas à atuação do presidente Michel Temer, ele não poupa palavras para dizer que o MDB não tem nenhum candidato viável para disputar a Presidência da República em 2018.

Os dois nomes discutidos hoje, de Temer e do ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, numa campanha, defenderiam “o legado do governo, não do partido”, sustenta, em entrevista ao Correio. “Meirelles é a versão piorada do Michel”, diz. Renan não apenas descarta a possibilidade de apoiar algum deles, como defende que o MDB; em vez de investir recursos em uma candidatura própria, precisa “sobreviver à hecatombe que o governo Michel Temer provocou no partido”.

Enquanto busca um projeto alternativo para apresentar na convenção do MDB, em julho, o senador elogia Joaquim Barbosa (PSB), desacredita o futuro de pré-candidaturas, como a do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), alerta quanto ao potencial de votos de Jair Bolsonaro (PSL-RJ) e comenta sobre alguns dos nomes que fazem parte do quadro fragmentado que espera para a eleição de 2018. Mas reforça que o apoio dele é ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que tentará visitar na prisão nos próximos dias “para conversar sobre a conjuntura atual”.

O senador acredita que, embora Lula ainda esteja preso, conseguirá se candidatar em agosto. Mas sem plano B. Outra opção, como o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad, seria “trocar o lulismo pelo petismo” — na visão do senador, má ideia. Renan fala também sobre o fim do foro privilegiado e a Operação Lava-Jato, e critica a atuação de alguns investigadores, que classifica como “abuso de autoridade”. Confira os principais trechos da entrevista:

O senhor começou a preparar um projeto alternativo à candidatura do presidente Michel Temer ou do Henrique Meirelles para a convenção de julho. Por quê?
Na verdade, não é uma preparação, é uma compreensão que se generaliza no partido. O MDB é um partido plural, com muitas correntes, e precisa sobreviver à hecatombe que o governo Michel Temer provocou no partido. Acabamos de perder 15 deputados federais e sete senadores. O MDB não tem vantagem com a candidatura do Michel.

O presidente diz que seria uma forma de defender o governo, de tentar resgatar um legado, como ele se refere às melhorias na economia, por exemplo.
Se existe legado do governo Michel Temer, certamente não é do MDB.

Como assim?
O MDB sempre foi o partido das massas, dos trabalhadores, da defesa do interesse nacional, da estabilidade democrática e econômica, dos avanços sociais. O maior legado que precisa sair dessa eleição é o MDB continuar grande. Nós temos excelentes governadores, bons candidatos a deputados. Uma aliança meramente para defesa do legado do Michel significaria a derrota dessas pessoas.

Por que você tem tanta convicção disso?
Porque o Michel faz um governo estreito, com opção pelo mercado. Flexibilizou direitos trabalhistas em plena recessão, ampliou desemprego, não retomou os investimentos públicos nem privados. O país vai ter deficit até 2025.

Mas já seria difícil. Seria pior se tivesse ficado a Dilma?
Na verdade, a crise se agravou. Ainda no mês passado, tivemos um aumento do desemprego, com aumento da informalidade. O que, aliás, aconteceu em todo país que, na crise, flexibilizou direitos, modernizou legislação ou, de uma forma ou de outra, incentivou o custo da produção. O Brasil vive muitas dificuldades porque, além da crise econômica, nós temos uma crise política sem fim, com dificuldades cada vez maiores na separação dos poderes. Isso tudo torna esta eleição de 2018 uma eleição única, com a política desgastada e com um número de candidatos que remonta à eleição de 1989.

O senhor falou que ia defender um projeto alternativo. Qual é esse projeto?
O projeto alternativo significa que é diferente da candidatura do Michel ou do Meirelles, porque elas não acrescentam nada ao MDB. São candidaturas preocupadas em defender uma prática que não está sendo aceita na sociedade.

E não tem nenhum outro nome no MDB?
O sonho do MDB é ter um candidato a presidente competitivo, que agregue nos estados, que some. Essa candidatura é imbatível numa convenção. É o que sempre quisemos, o problema é que não temos. A candidatura do Michel é a defesa do legado do governo, não do partido.

E como será a defesa do legado do partido?
O MDB hoje está vivendo papel contrário ao que desempenhou no passado. Por isso, precisa mudar. Não é a ponte para o futuro, é a ponte para a sobrevivência. Esse sentimento de necessidade de preservar o MDB não se conjuga com a candidatura do Michel e do Meirelles, não é compatível. Daí a necessidade de um cenário alternativo, que precisa ser articulado. Precisamos construir uma convergência em torno da repetição do que aconteceu em 2006, quando o MDB aprovou não ter candidatos, contra a candidatura própria do Anthony Garotinho. Ou pode caminhar para aprovar alianças. Nesse caso, indicando ou não o vice-presidente.

Ou seja, o senhor acha que não é momento de o MDB ter candidatura própria?
No passado, os oráculos da política brasileira vaticinaram o fim do MDB, e não se apagou a luz do partido, porque nós ganhamos aquela convenção, respeitando as prioridades regionais. Ou seja, as prioridades políticas programáticas eleitorais. E isso favoreceu a eleição de grandes bancadas, e o MDB, de novo, foi um dos partidos que mais tiveram votos na eleição. Mesmo não tendo candidatos nos grandes centros aos governos estaduais, teve uma votação muito grande, próxima do primeiro colocado.

O cenário atual é outro?
Hoje, esse cenário é completamente diferente. Não temos mais o número de governadores que tínhamos, pelas circunstâncias eleitorais. Alguns deixaram seus cargos para ser candidatos. Tivemos rebaixamento na Câmara e no Senado. A compreensão da necessidade de casar os interesses regionais do MDB com candidatura nacional e com aliança vai dificultar a homologação dos nomes do Michel ou do Meirelles pela fragilidade eleitoral que eles hoje significam. E, se contarmos com a presença do Michel nos palanques, muita gente vai pagar com a derrota o preço dessa incompreensão. Eu acho até que o Henrique Meirelles melhorou. Não pelos resultados que obteve na economia, mas pela grande jogada de marketing que ele fez ao posar com a cadela. Ouvi isso de muitos publicitários. Sem dúvida que ele ficou mais humano.

O senhor acha que todos os pré-candidatos vão ficar ou vai afunilar?
Acredito que todos ficarão, inclusive o Lula. E esse quadro eleitoral deverá ficar congelado até decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) com efeito suspensivo para o STF (Supremo Tribunal Federal).

Só quando o Supremo der um veredito sobre a candidatura do Lula iremos destravar o quadro?
A complexidade tornou mais fácil prender o Lula não votando as ADCs do que impedir a candidatura dele com a legislação eleitoral. A própria Lei da Ficha Limpa garante aos condenados em segunda instância o direito de pedir o registro. E, pedido o registro, tem que ser tratado em igualdade de condições com os outros candidatos.

Ou seja, ele ainda pode recorrer ao Supremo depois. Então, o senhor acha que teremos candidatura de Lula?
Eu acho. Não enxergo no TSE, que é uma Corte respeitável, um procedimento igual ao do Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª Região. Que, não há dúvidas, colocou a condenação do Lula no calendário eleitoral para obrigar a sua prisão.

Como o senhor vê o Joaquim Barbosa, que surge como opção dentro do PSB?
Sempre achei Joaquim Barbosa um grande nome. Aliás, não é surpresa seu desempenho nas pesquisas. Todas as pesquisas que incluíram seu nome apontavam esses resultados.

O senhor poderia apoiá-lo?
Se o Joaquim acertar na política, ele pode entrar no jogo com mais facilidade do que o Ciro Gomes, do que a Marina Silva ou do que o próprio Geraldo Alckmin. Mas precisa acertar na política. É um nome respeitável, mas eu voto no Lula. Eu apoiaria o Lula. Eu confio na hipótese, sobretudo pelos avanços da última semana no STF, de a sua candidatura sobreviver até a eleição. Não vejo alternativa para ele senão insistir no direito que tem de ser candidato, apesar da condenação sem provas por um típico juízo de exceção.

E entre os que tentam se firmar no centro, o senhor acredita que Rodrigo Maia ainda pode ser candidato?
Não, não acredito. A candidatura do Rodrigo tem a mesma consistência da candidatura do Michel ou do Meirelles. Mas seria bom para a democracia a participação de candidatos com pensamentos políticos econômicos diferentes. Isso que, sem dúvida, diferenciará um debate. Mas o jogo, entendo que continuará congelado até a última semana de setembro. Porque, pelas pesquisas, uma quantidade enorme de eleitores diz que não vai votar em ninguém, vai anular o voto, não vai comparecer às eleições.

E como o senhor vê o Jair Bolsonaro?
Penso radicalmente diferente dele, mas não subestimo a candidatura.
Aliás, no mundo todo, esse fenômeno de direitização, de discurso contra política, tem crescido. E muitas vezes ganha, porque são subestimados.

Agora tem a questão do financiamento, não é? Como vai ser a questão do dinheiro?
Esse é o problema do MDB e de muitos partidos. Tentamos estabelecer regras para dar isonomia do financiamento para que não houvesse prejuízos para correntes nos partidos. Mas o presidente Michel Temer vetou. O que deixa aos partidos a definição para o financiamento, esse é outro problema que precisa ser conjugado. Porque a candidatura do Meirelles, ou do Temer, significará mais dificuldade de financiamento para o MDB.

Mas o Henrique Meirelles disse que financia a campanha dele…
Sem dúvida é outro fator que humanizará mais a candidatura. Mas o Meirelles é a versão piorada do Michel. O Michel ainda tem política, o Meirelles não tem popularidade nem política.

O ministro Carlos Marun disse,na semana passada, que o senhor faltou à reunião, mas não falta à inauguração. Como o senhor vê a crítica?
Na minha terra, costuma-se dizer que ninguém está livre de coice de burro e de pedrada de doido. Mas só rebato críticas de quem conheço. Marun? Quem é Marun? Não conheço, portanto, nem vou responder.

Se o PT trocar o Lula pelo Haddad, consegue repetir a votação no Nordeste?
Seria trocar o lulismo pelo petismo. Em português claro, não seria uma boa troca. Recomenda-se que o Lula esgote todos os meios para sua candidatura.

Mas até lá dá tempo de fazer a transferência de votos?
Com esse jogo que está aí, qualquer um que se apresentar como substituto do Lula, eles destruirão. Com aquela narrativa que eu falei: alguém, para sair da cadeia, conta um fato que não precisa provar. Hoje, me lembrei do Estado Novo, quando Graciliano Ramos foi preso por ser comunista quando nem comunista era. O que se reproduz agora na democracia com a condenação do Lula por um tríplex onde ele nunca morou e que nunca comprou, por ter reformado uma cobertura que, agora se sabe também, nunca reformou. Inacreditável. Mas é um sintoma dos tempos em que vivemos, que não são únicos no Brasil, tivemos outros.

O senhor acredita que outras pessoas que estão sob investigação vão acabar tendo o mesmo destino que o Lula?
Quando defendemos a lei do abuso de autoridade, o Moro (o juiz Sérgio Moro) veio aqui para defender a aprovação da lei, desde que ressalvasse a hermenêutica. O que significa não obrigar o juiz a julgar de acordo com a lei, com provas, mas de acordo com a convicção. Mas não basta dizer que tem, tem que mostrar para condenar. Se não, acontece o que aconteceu com Lula. Condena, mas as pessoas não se convencem. Nesse cenário, é evidente que qualquer um pode ser tratado na mesma condição que o Lula.

Na quarta-feira, o Supremo vai analisar o foro privilegiado. Como está essa questão no Congresso?
Essa intervenção no Rio de Janeiro, entre outros males, imobiliza o Congresso. Retira do Legislativo o protagonismo que ele deve exercer. Aprovamos em dois turnos no Senado, e eu me dediquei a isso, o fim do foro para os 58 mil, como qualquer democracia civilizada. Não basta acabar com o foro para 600 pessoas e garanti-lo para outros. Eu sempre defendi investigação. Toda vez que me investigam, eu defendo que é uma oportunidade para que eu possa esclarecer fatos, fazer a prova negativa. Mas todos têm que ser investigados. Todos, sem exceção. Por exemplo, por que é que não se investiga o (ex-procurador-geral da República, Rodrigo) Janot depois do que aconteceu na delação da JBS?

O senhor acha que ele tinha que ser investigado?
Tinha que ser investigado. E tem que ser investigado na primeira instância, como qualquer outro.

Quanto tempo mais será que vai ter de Lava-Jato?
A Lava-Jato precisa continuar. Ela vai deixar muitos resultados. Mas ela não pode prender para delatar, ou então prende para continuar prisão provisória com a condenação em primeira instância, que foi o que aconteceu com o (Antonio) Palocci, deixando a delação como a única alternativa. Eu sempre defendi a Lava-Jato, sempre considerei que ela deixaria avanços civilizatórios. Mas isso não significa dizer que, por isso, pode exagerar, abusar da autoridade, passar de seus limites com vazamentos que não foram apurados, muitos deles mentirosos, com delações seletivas dirigidas. Eu nunca me esqueço de uma nota que dizia que, para todos os 77 delatores da Lava-Jato, foi feita a pergunta “nos ajude, o que você sabe sobre o Renan Calheiros?”. Isso não pode acontecer. Juízes de primeira instância, por meio da convocação de suas entidades, invadirem o STF até que ele receba uma denúncia contra o senador Renan Calheiros, que foi o que aconteceu em dezembro do outro ano. Isso não pode acontecer, porque isso desequilibra a democracia. Atemoriza as pessoas.

O senhor ficou atemorizado com aquilo?
Todo ser humano tem medo. Eu também tenho medo. Esse enfrentamento que eu fiz em alguns momentos não é heroísmo, é que ou faz isso, ou vai prevalecer a compreensão que eles querem que prevaleça, que é a generalização da corrupção na política, com a participação de todos. É um jogo bruto que acaba nivelando culpados com inocentes. E criando um cenário de substituição da política. No Paraguai, agora tivemos abstenção de 44%. Eles querem que, nesta eleição, tenhamos cenário igual no Brasil.

E acha que vamos ter esse cenário?
Acho que vamos. Por isso que falei lá atrás, o quadro ficaria congelado porque uma parcela significativa, 30% da população, diz que não vota em ninguém, 35% ou 36% votam no Lula. Aumentou depois da prisão, em Maceió. Para que o Ciro cresça um ponto, ele tem que derrubar um ponto do Alckmin, da Marina, do Álvaro, do Collor…

Como o senhor vê essa questão de a ministra Cármen Lúcia dizer que seria depenar o Supremo rediscutir a prisão em segunda instância?
Tenho o maior respeito pela ministra, consideração, mas acho que houve um equívoco no encaminhamento dessa questão, e o preço está sendo cobrado agora. Quanto mais cedo ela votasse a ADC, mais segurança jurídica se tinha, menos dúvida havia.

O senhor algum dia imaginou que o Supremo fosse ter mais protagonismo que o Legislativo?
Este cenário não é novo, quando alguém tenta afastar presidente de Congresso com uma liminar. Quando isso acontece, já dá para oferecer uma dimensão do papel que cada um exerce.

A população parece que está aprovando o novo Supremo e o juiz Sérgio Moro, o contrário do que ocorre com a classe política. Como vai ser chegar em outubro para pedir voto para o eleitor diante de uma população tão mal-humorada?
Esse fenômeno não é só brasileiro. Aqui temos especificidades, mas é preciso robustecer a ocupação de espaços, na comunicação, o equilíbrio desse debate, para que cresça a percepção de que nada se resolve sem a política. Mesmo a política com essa importância tem que responder por seus erros eventuais, por isso, a necessidade de investigações. Mas não apenas para as políticas, mas para os tribunais, por exemplo. Todos os setores.

O senhor usa muito o Twitter. A campanha vai ser mais em rede social, então?
Cada vez mais vamos ver campanhas com mais participação de redes sociais. Esta daí terá uma participação forte, porque você vai ter uma diminuição do horário eleitoral, o que valerá mais, na prática, serão as iniciações e a rede social terá um papel grande a cumprir, para o bem e para o mal.

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