Perdeu a oportunidade de criar rede de apoio político e larga em desvantagem
Jair Bolsonaro tentou tomar de assalto o partido pelo qual se elegeu, o PSL, em vez de com ele construir boa relação —o que teria sido útil, considerando que a sigla teve a maior fatia do fundo eleitoral neste ano. Fracassou em seu intento, e a organização seguiu sob controle de seu velho cacique, Luciano Bivar. Depois, ensaiou construir seu próprio partido, o Aliança pelo Brasil. Novamente fracassou e, ao notar que não teria como viabilizá-lo em tempo para as eleições municipais, desistiu.
Com isso, Bolsonaro não teve um partido para chamar de seu durante as disputas locais, perdendo a oportunidade que seus antecessores —FHC e Lula— aproveitaram muito bem: fazer crescer sua agremiação pelo país, enraizando-se e criando uma rede de apoio político crucial para as eleições proporcionais vindouras (Câmara dos Deputados e Assembleias Legislativas), mas também para a Presidência da República. Só por isso (obra exclusivamente sua), já sai derrotado das eleições de 2020.
Agora, especula-se que o presidente —eleito por vociferar contra a “velha política”— possa se filiar a um dos partidos do centrão —a quintessência do que ela significa. O mais cogitado é o PP. É aquele que Bolsonaro integrou por mais tempo, a despeito das muitas mudanças de nome, desde que deixou de ser a Arena da ditadura militar e de ter vertebralidade política, tornando-se um mero partido de adesão: esses que apoiam qualquer governo, desde que bem recompensados, sem dar maior importância a ideologias ou programas.
Os partidos do centrão foram os que mais cresceram nesta eleição: PP, PSD, PL, Avante, Patriota, Podemos, PSC, Republicanos, Solidariedade —todos aumentaram o seu número de prefeituras. Até o ex-bolsonarista PSL cresceu. Apenas o jeffersoniano PTB e o MDB, dentre as agremiações de adesão, declinaram —embora este último permaneça o maior em número de governos locais. Hoje estão todos, com parcial exceção do MDB, na base formal do presidente no Congresso. Fosse de fato um governo de coalizão, talvez pudessem caminhar com Bolsonaro até 2022. Contudo, não é o caso.
Ademais, como diz a sabedoria política, o centrão ninguém compra, só aluga. Assim, se o governo seguir errático, improdutivo e perder popularidade país afora da mesma forma como tem ocorrido em grandes cidades, os partidos de adesão se atrelarão a outra candidatura, com maiores chances de ganhos. Ela pode ser de algum partido da centro-direita ou direita tradicional (não bolsonarista) que chegue bem em 2022.
Quem se saiu bem nestas eleições foi o DEM —que não é centrão, ou não teria ficado por mais de 12 anos firme na oposição aos governos petistas. O ex-PFL não só cresceu como ganhou cidades importantes: Salvador e, virtualmente, Rio de Janeiro. Ademais, terá livre de mandato, podendo percorrer o país a partir de janeiro, um dos prefeitos mais populares e jovens do Brasil: Antônio Carlos Magalhães Neto. Considerando-se ainda o contraponto que Rodrigo Maia tem feito ao bolsonarismo no Congresso, há espaço para ocupar o campo da direita com maior moderação e alienar o atual presidente.
Claro que o candidato também pode ser um outsider, como Luciano Huck, embora estas eleições estejam mostrando que o tempo de aventureiros e neófitos parece ter ficado em 2016 e 2018. O astro da TV talvez perca o lugar para um político mais experimentado nas hostes da direita —e esse provavelmente não será Jair Bolsonaro.
*Claudio Couto, professor de ciência política na FGV-Eaesp e coordenador e produtor do canal do YouTube e podcast ‘Fora da Política Não há Salvação