No mercado, aposta-se em menos lavajatismo
Entre os executivos de banco de uma forma ou de outra atentos à Lava-Jato, há um moderado otimismo. Acredita-se que tanto no plano dos grandes interesses nacionais quanto no que se refere ao próprio pescoço de cada um, o pior já passou. Na visão destes atores do sistema financeiro, o resultado concreto das investigações que afetam a mais de dez bancos implicará em pagamentos acertados em termos de ajustamento de conduta. As irregularidades a serem desvendadas seriam enquadradas como falhas de controle, e não casos de corrupção. É uma agenda com seu custo para o mercado financeiro, mas suportável. Não tem cadeia. Não tem instituição sendo fechada.
Um núcleo jacobino persistiria no Rio de Janeiro, em torno da 7ª Vara Federal, comandada por Marcelo Bretas, mas a onda teria se dissipado em Curitiba, na PGR e no Supremo. A equação política, na visão de um espectador, mudou. “O lavajatismo e o bolsonarismo formaram uma aliança de ocasião que está se desfazendo com o tempo”, acredita.
Na opinião desse senhor, o Brasil viveu um momento de grande perigo entre o fim do ano passado e o começo do governo atual. Era o risco do lavajatismo, com Sergio Moro à frente do governo, servir de combustível para uma escalada autoritária.
Esta marcha poderia ter o seguinte encadeamento: instalava-se a chamada CPI Lava-Toga, o que abriria caminho para pedidos de impeachment dentro do Supremo. Sob pressão, a casa aceitaria aprofundar as investigações contra detentores de foro a tal ponto que o que restasse da classe política seria destruída. Neste processo, a elite empresarial ficaria muito fragilizada e o grande líder populista poderia reunir os sobreviventes dos outrora poderosos em uma mesa e estabelecer novos termos: para a Presidência da República, tudo seria possível. Aos demais restaria a submissão.
Deste risco o Brasil estaria livre. Seja porque o bolsonarismo não demonstrou ter blindagem absoluta ao que as investigações podem trazer, seja porque a imperícia fez morada no Palácio da Alvorada. Perdeu-se apoio para isso entre os militares, no Congresso, na mídia, em parte dos eleitores, e por fim, da cúpula do Judiciário, com a troca de guarda entre Cármen Lúcia e Dias Toffoli. Passaram a viver das redes sociais.
Não que Cármen Lúcia coonestasse alguma aventura autoritária do presidente, pelo contrário. Mas a ministra havia revestido sua presidência de uma aura messiânica que deixava sem controle o radicalismo da primeira instância. Toffoli jamais será um herói. Para ninguém.
A agenda econômica de Paulo Guedes de forma indireta também ajuda a desanuviar o ambiente. A tensão entre entorno de Bolsonaro e o de Rodrigo Maia, nesta visão, é um pouco de disputa por protagonismo. Existe uma tendência natural para se aprovar alguma reforma da Previdência, como porta de entrada para outras reformas de uma agência “market friendly”. Na visão do mercado, a votação de uma agenda reformista não é uma panaceia, mas tira o país das cordas de uma recessão profunda. Falta de crescimento e radicalização política andam de mãos dadas. Moderação está mais associada com algum desenvolvimento econômico.
Para este executivo, Guedes não coloca trava em ninguém. “Em relação à democracia, não dá para confiar nele. Ele não se importa se o regime é democracia ou ditadura, contanto que dê espaço para as ideias dele. Ele não vai ser o cara que vai colocar algum obstáculo”. A agenda do ministro da Economia, portanto, favorece a estabilidade das instituições de uma maneira indireta. Ressalve-se que, em público, quando questionado, Guedes afirmou mais de uma vez que jamais compactuaria com um regime autoritário.
14 de junho
O termômetro da Previdência, um monitor de votos na Câmara em relação à reforma desenvolvido pela empresa de consultoria Atlas Político, publicado desde março pelo Valor , anda se movendo de forma contundente. Parece cada vez mais palpável a aprovação da reforma, desde que o governo federal começou a negociar mudanças no texto.
Pela primeira vez o contingente de indecisos deixou de ser o mais numeroso da Câmara. No dia 18 de março 220 deputados estavam no muro, agora são 137 nesta condição. O total de votos contrários, 144 até ontem, está virtualmente inalterado desde o início do levantamento. Os que defendem a aprovação do texto com alterações passou de 79 em 8 de abril para 127 agora. Os apoiadores incondicionais da reforma, por dois meses entre 90 e 100, passaram a 105.
Ainda está longe dos 308 votos necessários para aprovar a reforma – a soma dos que são de alguma maneira favorável dá 232 – mas uma onda está se formando. É difícil pensar que a greve geral convocada no dia 14 vá alterar esta realidade.
A paralisação da próxima semana tende a ser um circuito fechado. Se ganhar a adesão do setor de transportes pode-se dizer que deve ser bem sucedida, induzir a interrupções em cadeia das jornadas de trabalho. É provável que as ruas sejam tomadas nas principais cidades. Mas é jogo jogado: estamos falando de sindicalistas, militância organizada em partidos e movimentos sociais. Fortalece quem já tem posição formada. É diferente dos protestos relacionados à educação, sobretudo do primeiro, que mostrou a reação social diante de um fato novo, qual seja os cortes na área decididos pelo governo e a maneira como foram apresentados.
O protesto de 15 de maio pegou de surpresa um grupo político capaz de politizar qualquer tema, até as polêmicas envolvendo Neymar. Ao que tudo indica, foi menosprezado o risco de reações negativas ao posicionamento do ministro da Educação.
O 14 de Junho parte de um ambiente totalmente diferente. É contra a reforma da Previdência, um tema em relação ao qual o governo investiu muito para construir uma imagem positiva. No mínimo, a reforma hoje não é tão impopular quanto foi no passado. A oposição anda perdendo terreno na batalha pela comunicação do tema.
*César Felício é editor de Política.