Apesar de Pacheco afirmar não ter visto apoio à medida entre senadores, ele se comprometeu com Lira a levar proposta a votação
Ranier Bragon e Danielle Brant / Folha de S. Paulo
A Câmara dos Deputados concluiu na noite desta terça-feira (17) a votação da reforma eleitoral que retoma a possibilidade de coligações nas eleições para deputados e vereadores, além de colocar na Constituição amarras ao STF (Supremo Tribunal Federal) e ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral).
O segundo turno da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) foi aprovado por 347 votos a 135. Por se tratar de mudança na Constituição, era preciso haver votos de ao menos 308 dos 513 deputados. Agora, o texto segue para o Senado.
Para valer para as eleições de 2022, as mudanças têm que ser promulgadas até o início de outubro deste ano.
O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmou nesta terça ter obtido compromisso do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), de que a proposta não será engavetada.
“O Senado deve pautar [para votação], fez o compromisso de pauta. Agora, eu não posso, não devo e não vou me pronunciar sobre o que o Senado vai, no mérito, aprovar ou não. Os senadores decidem. Eu só pedi o respeito ao presidente Rodrigo Pacheco de, em a Câmara aprovando em segundo turno, pautar a PEC, mas sem compromisso nenhum de resultado”, afirmou Lira.
Pacheco confirmou: “Em respeito à importância da matéria, vamos submetê-la à apreciação do Senado”. Dias antes, o senador manifestou uma avaliação de que a proposta não será aprovada por lá.
A retomada das coligações entre os partidos para a eleição de deputados e vereadores está proibida desde o último pleito. Ela vai na contramão de regras que visam diminuir o leque das 33 siglas existentes hoje. O fim das coligações para a eleição ao Legislativo foi uma das medidas mais elogiadas pela ciência política nos últimos anos.
Partidos nanicos, sem representação significativa na sociedade e que funcionam muitas vezes como balcão de negócios, tendem a obter vagas no Legislativo apenas na união com siglas maiores.
Isso porque o sistema proporcional, hoje em vigor, distribui as cadeiras no Legislativo com base na votação total dada ao partido e aos seus candidatos. Um partido nanico ou pequeno tem chance maior de eleger representantes em conjunto do que isoladamente.
A proibição das coligações junta-se à cláusula de desempenho —que tira recursos das siglas com baixo desempenho nas urnas— na tentativa de dar maior racionalidade ao quadro político nacional.
Nas coligações, é comum também o eleitor votar, por exemplo, em um candidato defensor dos sem-terra e ajudar a eleger um ruralista, porque não raro siglas das mais diferentes ideologias se unem tendo em vista apenas as perspectivas de sucesso eleitoral.
As coligações foram aprovadas após acordo que sepultou, mais uma vez, a proposta de instituir o distritão nas eleições. Nesse modelo, são eleitos para a Câmara, Assembleias e Câmaras Municipais os candidatos mais bem posicionados. Os votos dados aos derrotados e os votos dados em excesso aos eleitos são desprezados.
O distritão fragiliza os partidos e tende a beneficiar políticos já bem posicionados ou celebridades.
Os deputados suprimiram um dispositivo que flexibilizava a cláusula de desempenho caso o partido conseguisse eleger ou tivesse pelo menos cinco senadores. Hoje, a regra prevê que é necessário eleger ao menos 11 deputados federais distribuídos em pelo menos um terço das unidades da federação.
Esse foi o caso da Rede em 2018, que teve uma votação muito ruim na Câmara, mas conseguiu eleger cinco senadores. Mesmo assim, ficou sem recursos e estrutura no Legislativo por causa da cláusula de barreira, que só leva em conta s votos dados aos candidatos a deputado federal.
A PEC aprovada em segundo turno nesta terça também altera a data de posse de presidentes da República (5 de janeiro) e de governadores e prefeitos (6 de janeiro), o que ocorre hoje no dia 1º de janeiro.
Um outro ponto da PEC estabelece que o voto dado a mulheres e negros terá peso duplo na definição da distribuição das verbas públicas —hoje o dinheiro é repartido de acordo com a votação que cada legenda tem na eleição para a Câmara dos Deputados.
A PEC impõe ainda amarras ao STF e ao TSE, colocando na Constituição a determinação que decisões suas que alterem regras eleitorais só podem valer na disputa se forem tomadas até um ano antes.
Esse trecho é uma antiga demanda dos congressistas, segundo quem o Judiciário tem extrapolado suas funções. Se esse ponto passar também no Senado, tende a ser judicializado.
O projeto ainda flexibiliza punições a partidos e dá mais liberdade para aplicação do dinheiro destinados por eles às suas fundações.
Além dessa proposta, a Câmara dos Deputados pretende votar projetos que visam alterar praticamente toda a legislação eleitoral e política do país, em uma reforma que, se entrar em vigor, será a maior da história desde a Constituição de 1988.
Projeto que pode ir a voto nas próximas semanas, relatado pela deputada Margarete Coelho (PP-PI), tem 372 páginas e 902 artigos.
Além de censurar a divulgação de pesquisas eleitorais até a antevéspera do pleito, a proposta enfraquece as cotas para estímulo de participação de mulheres e negros na política, esvazia regras de fiscalização e punição a candidatos e partidos que façam mau uso das verbas públicas e também tenta colocar amarras ao poder da Justiça de editar resoluções para as eleições.
O projeto de Margarete, aliada de Arthur Lira, pretende revogar toda a legislação eleitoral e estabelecer um único código eleitoral. Uma primeira tentativa de alteração nas regras eleitorais já foi rejeitada pela Câmara.
No dia 10 o plenário da Câmara rejeitou projeto de emenda à Constituição que pretendia exigir a impressão do voto dado pelo eleitor na urna eletrônica.
A medida era uma das principais bandeiras do presidente Jair Bolsonaro. Desde antes de assumir, ele tem alimentado suspeitas contra as urnas eletrônicas, apesar de jamais ter apresentado qualquer indício concreto de fraude nas eleições.
Baseado nessas falsas suposições, e em um cenário de queda de popularidade e de maus resultados em pesquisas de intenção de voto, já ameaçou diversas vezes a realização da disputa do ano que vem.
O acordo para votação da PEC também incluiu a aprovação de projeto que permite a partidos políticos se organizarem em federação por ao menos quatro anos, o que representaria uma sobrevida a legendas pequenas, que correm risco de serem extintas por não alcançarem um percentual mínimo de votos nas eleições.
O presidente Jair Bolsonaro afirmou a auxiliares que vetará o projeto. Acordo que está sendo costurado prevê que o Congresso mantenha o veto.
ENTENDA A VOLTA DAS COLIGAÇÕES
O que são Desde 2020 os partidos estão proibidos de se coligar para a eleição de deputados e vereadores. A coligação para as eleições majoritárias permanece. Na Câmara, a medida foi fruto de um acordo entre os defensores do distritão e a oposição
Por que as coligações foram proibidas” Objetivo foi sufocar agremiações de aluguel e reduzir o número de partidos hoje no país (33)
Por que podem voltar Partidos nanicos e médios tendem a obter vagas no Legislativo apenas em coligações com siglas maiores. Com isso, pressionam pela retomada do modelo
PRÓXIMOS PASSOS DA PEC
- No Senado, a PEC começa a tramitar pela Comissão de Constituição e Justiça. Se aprovada, segue para votação em plenário (no Senado não há comissão especial)
- Para ser aprovada pelo Senado, é preciso o voto de ao menos 49 dos 81 senadores
- Se for aprovada sem modificação em relação ao texto da Câmara, a PEC é promulgada pelo próprio Congresso e passa a vigorar, sem sanção presidencial
- Para valer para as eleições de 2022, porém, as regras têm que entrar em vigor ao menos um ano antes, ou seja, no início de outubro de 2021
Fonte: Folha de S. Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/08/camara-aprova-em-segundo-turno-volta-das-coligacoes-e-texto-vai-ao-senado.shtml