Presidente e ministros traduzem impulsos autoritários em ataques explícitos, sem nenhum pudor
Seria uma injustiça afirmar que Jair Bolsonaro flerta com o autoritarismo. O vídeo da reunião ministerial do governo em abril mostra que o presidente e seus auxiliares, mais do que isso, traduzem seus impulsos golpistas em ataques explícitos, sem nenhum pudor.
Os assuntos do encontro eram o coronavírus e os planos para a economia, mas Bolsonaro estava mais interessado em atiçar seu conselho de radicais. Defendeu atropelar outros Poderes, falou em intervenção militar e prometeu armar a população contra seus adversários.
Nas quase duas horas de gravação, aparece em estado bruto a aposta do bolsonarismo na escalada de um conflito com as demais instituições democráticas, com o intuito de acumular um poder quase ilimitado.
O presidente disse que não aceitaria ser alvo de processos “baseados em filigranas” e que haveria “uma crise política de verdade” caso o Supremo tomasse “certas medidas”. “Não vou meter o rabo no meio das pernas”, desafiou. Quando Abraham Weintraub falou em mandar para a cadeia os ministros do tribunal, ninguém manifestou incômodo.
Bolsonaro não se conforma com o fato de que não reina soberano. Atacou o “bosta desse governador” e o “prefeitinho do fim do mundo” que decretaram medidas de isolamento social. A ministra Damares Alves afirmou que eles deveriam ser presos, repetindo o que parece ser o método favorito do governo para lidar com críticos e adversários.
Atormentado pela limitação de sua autoridade, o presidente passeia pelo terreno da exceção, sem ser incomodado. Exortou as Forças Armadas a reagirem ao que chamou de “contragolpe dos caras” e disse que era preciso armar a população contra seus opositores. No dia seguinte, o governo ampliou em 18 vezes o acesso de cidadãos comuns a munições.
O golpismo é o recurso único de um grupo que nunca teve interesse em seguir a regra do jogo. O radicalismo está enraizado no gabinete presidencial. Bolsonaro seguirá esse caminho enquanto não for impedido.