Ao ameaçar Mandetta, presidente reage ao isolamento com radicalismo e irracionalidade
Um consórcio formado por generais e líderes políticos conseguiu adiar a demissão do ministro da Saúde. A bomba foi temporariamente desarmada, mas Jair Bolsonaro continua de olho no botão. Ele já provou ser capaz de produzir estragos até com as mãos atadas.
A incompetência exibida pelo presidente na crise do coronavírus levou à criação de um cordão sanitário no perímetro de seu gabinete. A ação de governadores, de técnicos da área e dos militares do Planalto pode ter limitado seus poderes, mas Bolsonaro mostra estar disposto a ampliar conflitos e provocar explosões para reafirmar sua autoridade.
A ameaça pública de demissão de Mandetta nos primeiros dias da semana foi uma amostra desse espírito. Bolsonaro costuma reagir à condição de isolamento com radicalismo e irracionalidade. Foi assim nos 28 anos de sua carreira como um deputado do baixo clero que não era levado a sério pelos colegas.
A diferença é que, agora, ele tem um megafone mais potente nas mãos. Ainda que os generais se postem à porta do gabinete presidencial para impedi-lo de fazer besteiras, Bolsonaro e sua turma ainda conseguem torpedear recomendações das autoridades de saúde, criar problemas com países que produzem equipamentos médicos e difundir mentiras que colocam vidas em risco.
O presidente também deu sinais de que pretende tirar proveito político desse isolamento e tentar reagrupar sua tropa de apoiadores fiéis. No domingo (5) em que lançou a ameaça de demitir Mandetta, Bolsonaro insinuou que o ministro fazia parte de uma conspiração de grupos que querem fazer “tudo aquilo que acontecia em governos anteriores”.
O discurso antissistema, como se vê, reaparece sempre que o presidente se vê contrariado. Nesse terreno, constantemente adubado pelos mais raivosos integrantes da ala ideológica do governo, Bolsonaro se sente confortável para disparar absurdos, distrair o país e investir contra seus críticos.
Mesmo sozinho, é ali que ele tenta recuperar seu poder.