Cenário político pode caminhar para pulverização de candidaturas, diz Alberto Aggio
3 de abril de 2025Notícias,EVENTOS FAP,Alberto Aggio,democracia,EF-destaque,posição_1Manchete-Home,Mais Notícias
Reflexões e especulações marcaram, em São Paulo, lançamento do livro Construção da Democracia no Brasil, 1985-2025: Mudanças, metamorfoses, transformismos
Comunicação FAP
O historiador Alberto Aggio alertou para a possibilidade de pulverização de candidaturas presidenciais nas eleições de 2026. Essa análise marcou, na quarta-feira (2/4), em São Paulo, o lançamento do livro A Construção da Democracia no Brasil, 1985-2025: Mudanças, metamorfoses, transformismos (232 páginas), de sua autoria. A obra foi editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), vinculada ao Cidadania 23, e pela Annablume. Segundo o autor, o cenário político, marcado pela erosão da popularidade do presidente Lula e pelos imbróglios judiciais do ex-presidente Bolsonaro, favorece o surgimento de diversas candidaturas, o que, acrescentou, pode apresentar riscos, assim como a polarização.
“O cenário político caminha para pulverização de candidaturas diferenciadas, e, talvez, as eleições de 2026 possam ser semelhantes às de 1989, quando se apresentaram 11 candidaturas”, disse o autor do livro, que é parte do projeto 40 anos de democracia no Brasil, organizado pela FAP e pelo partido. Aggio é doutor em História pela Universidade de São Paulo (USP), livre-docente e titular pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Também tem pós-doutorado pela Universidade de Valência, na Espanha, e pela Universidade Roma Tre, na Itália.










Antipetismo
O professor lembra as eleições de 2018, quando a prisão de Lula impulsionou a candidatura de Bolsonaro, que, de acordo com o autor, não foi resultado de pulverização, mas do antipetismo. “O grande líder do petismo estava preso, e a candidatura de Bolsonaro apareceu como a mais viável para impedir a reprodução do petismo. Era o antipetismo, ainda existente, que predominava, mesmo antes das eleições, da apresentação das candidaturas", acentuou.
A erosão da popularidade de Lula, segundo o autor, pode dificultar a candidatura do petista em 2026. "Se as pesquisas mostrarem que a erosão vai se aprofundar, poderá ficar difícil para Lula ser candidato”, analisa. Além do antipetismo, de acordo com ele, outro elemento importante é a definição de possíveis nomes que poderiam derrotar o presidente e o seu partido. “Podem aparecer vários candidatos, e a tendência, se Lula não for candidato, se o antipetismo não for elemento importante na disputa eleitoral, é que várias facções vão dizer que seus candidatos representam o futuro melhor para o país", acrescentou.
No entanto, o historiador destacou que tanto a polarização quanto a pulverização de candidaturas são negativas para a democracia. "A polarização já mostrou que é ruim, mas a pulverização também é. São dois cenários: um que a gente já conhece, que é o da polarização e bloqueia o debate. Na polarização entre Lula e Bolsonaro, entre Bolsonaro e petismo, ninguém ouve ninguém", afirmou Aggio.
"Ruído geral"
"Se formos para o terreno da pulverização, o que teremos são muitas falas simultaneamente. Haverá uma espécie de ruído geral, mas na política não tem vazio. Alguém vai se sobressair. No cenário de pulverização, os dois que vão para o segundo turno representarão cerca de 20% do eleitorado brasileiro cada um deles, tomando como referência o cenário de 1989 vivido no país. Nesse caso, os dois candidatos não vão representar a maioria do eleitorado. O restante ficou fora", disse.
O professor afirmou, ainda, que o sistema político eleitoral está deixando de representar fielmente os interesses da maioria da população. “O cenário da polarização é de bloqueio. Na pulverização, corre-se o risco de uma representação muito baixa dos que vão para o segundo turno", ressaltou, para enfatizar que o momento exige cautela e atenção. "Estamos em um momento em que, por diversas razões, fomos parar nessa circunstância. Vamos ver como os candidatos irão se apresentar e como o cenário político vai se configurar", pondera.
Live e lançamentos
Aggio vai participar, na terça-feira (8/4), a partir das 19 horas, da live "Como compreender os 40 anos da Nova República?", que será realizada pelo Instituto de Estudos e Pesquisas para o Fortalecimento da Democracia (IEPFD), com transmissão no canal do instituto no Youtube.
Novo lançamento do livro está previsto para o dia 24 de abril, em Recife. Também há previsão de ser lançado, em maio, no Rio de Janeiro. Assim como em São Paulo, o trabalho já foi lançado em Brasília, em 14 de março deste ano, um dia antes da data de celebração do fim da ditadura militar no país.
O processo de construção democrática dos últimos 40 anos no Brasil, segundo o texto, defronta-se hoje com um cenário global no qual os desafios à democracia são cada vez mais evidentes. “Tal situação produz mal-estar e desorientação ao conjunto da sociedade brasileira”, diz um trecho.
Desaprovação do governo Lula está perto do não retorno
3 de abril de 2025juventude,POLÍTICA HOJE,PH-destaque,comunicação,Imposto,posição_1,Notícias,Manchete-Home,Economia,Mais Notícias,Brasília,desempregoEleições,política,governo,Partidos,trabalho,Memória
A superexposição de Lula por meio de entrevistas e eventos não neutralizou a percepção negativa que a população tem da economia. A causa é a inflação
Luiz Carlos Azedo/Correio Braziliense
Por onde quer que se olhe, o apoio da população ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva continua em queda livre. Apesar de o governo adotar medidas com o propósito de melhorar a própria imagem, como o empréstimo consignado para assalariados, a bolsa de estudos Pé-de-Meia para jovens adolescentes de baixa renda e a isenção do Imposto de Renda para quem recebe até cinco salários-mínimos, Lula não consegue estancar a sua queda nas pesquisas.
A Pesquisa Genial/Quaest, divulgada nesta quarta-feira, mostra que a desaprovação do governo Lula subiu de 49% para 56% entre 25 de janeiro e 25 de março, enquanto a aprovação caiu de 47% para 41%. Os números são brutos. O esforço de marketing realizado pelo ministro Sidônio Palmeira (Comunicação Social) até agora não surtiu efeito. A tese de que o problema do governo era sobretudo não se comunicar com a sociedade está sendo posta em xeque pelas pesquisas.
Parece o caso da velha máxima do gerenciamento estratégico: quando um projeto está dando errado, se as mesmas coisas continuarem a ser feitas, continuará dando errado. A quase universalidade dos números negativos reflete um mal-estar generalizado da sociedade com o governo federal.
A queda na aprovação ocorre em todas as regiões do país. No Nordeste, principal reduto eleitoral de Lula, a vantagem que era de 35 pontos percentuais (pp) caiu para 6 pontos entre dezembro e março, e a desaprovação subiu para 23 pp maior que a aprovação. No Sul, a diferença é de 30 pp. Entre as mulheres, é a primeira vez que a desaprovação chega a 53% e supera a aprovação, que está em 43%.
Sem o apoio maciço do Nordeste, da maioria das mulheres e dos brasileiros de baixa renda, o projeto de reeleição do Lula estará irremediavelmente comprometido. A aprovação está em 34% para quem tem renda familiar de mais de 5 salários-mínimos, em 36% para quem tem renda de 2 a 5 SM e chegou a 52% para quem tem renda de até 2 salários. A vantagem estratégica de Lula entre os eleitores de até 2 SM já foi de 43 pp em julho de 2024; agora, está em apenas 7 pp.
A desaprovação ao governo Lula chegou a 26% entre os seus próprios eleitores, ou seja, 25% de sua base de apoio. Isso significa um deslocamento muito além daqueles que votaram em Lula no segundo turno para impedir a reeleição de Jair Bolsonaro. Esse percentual abarca muitos que votaram em Lula no primeiro turno, o que é ainda mais preocupante para o Palácio do Planalto. O nome disso é frustração de expectativas.
Força de inércia
Com esses resultados, é o caso de Lula ir para o divã e avaliar a sustentabilidade de seu projeto de reeleição. É preciso encontrar as causas profundas desse descontentamento, que não está sendo revertido por medidas que o governo julgava capazes de alavancar a sua popularidade. O alcance dos projetos não atingiu a escala que se esperava.
O programa Pé-de-Meia, por exemplo, além das dificuldades de controle sobre a sua execução nos municípios, para que realmente chegue aos que devem ser beneficiados, exibe um aspecto que precisa ser mais bem avaliado pelo governo: ninguém vai convencer os pais dos alunos que não recebem a bolsa de que seus filhos não têm igualmente esse direito, se estudam na mesma escola pública do jovem com Pé-de-Meia.
O crédito consignado, o empréstimo do Lula, é um indiscutível sucesso de bilheteria: até 24 de março de 2025, mais de 5 milhões de assalariados haviam solicitado o consignado CLT, totalizando mais de R$ 50 bilhões. Entretanto, a maioria pega o empréstimo para quitar ou renegociar dívidas com os bancos e operadoras de cartão de crédito. Ou seja, o programa é bem-vindo, mas não impacta de imediato o custo de vida.
Até agora, a proposta de isenção do Imposto de Renda para quem recebe até R$ 5 mil também não surtiu o efeito esperado; como só valerá para o próximo ano, pode ser que ainda traga resultados efetivamente positivos no futuro. A maioria da população tem a percepção de que a economia piorou e o governo caminha na direção errada: são 56% em ambos os quesitos.
A superexposição de Lula por meio de entrevistas e eventos foi alicerçada nesses programas, porém não neutralizou essa percepção negativa que a população tem da economia. A causa principal é a inflação, sobretudo o preço dos alimentos nos supermercados e dos combustíveis nos postos de gasolina. Lula subestima a inflação como fez no Plano Real, em 1994, quando estava na oposição e combatia o ajuste fiscal.
O poder de compra da população decaiu nesses dois quesitos, apesar da redução do desemprego e do aumento da renda média. Isso poderia ser compensado pelos programas sociais do governo, porém, 67% da população de baixa renda identifica esses programas como direito adquirido. É o caso do Bolsa Família.
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Primeiro autista a tornar público diagnóstico no Congresso preside sessão
2 de abril de 2025Notícias,POLÍTICA HOJE,PH-destaque,posição_1,Manchete-Home,Mais Notíciascidadania 23,Amom Mandel,TEA,Transtorno do Espectro Autista
Em dia histórico, Amom Mandel, relembra soluções legislativas que estão em tramitação avançada e mostra desafios com “apagão de dados” sobre a população com TEA no Brasil
Amom Mandel (Cidadania-AM), primeiro deputado federal a tornar público diagnóstico do Transtorno do Espectro Autista (TEA) no Congresso Nacional, presidiu a sessão solene em alusão ao Dia Mundial de Conscientização do Autismo, comemorado nesta quarta-feira (02/04). Pela primeira vez, um parlamentar autista comanda a homenagem feita na Casa para discutir os desafios enfrentados por essa parcela da população. A tônica da solenidade foi o clamor por inclusão real, respeito e efetividade nas políticas públicas.
Mandel ressaltou que a burocracia vivida por pessoas autistas no acesso a direitos básicos ocorre diariamente. Por isso, instituir a Carteira Nacional de Identidade da Pessoa com Deficiência (CNIPCD), relatado pelo parlamentar no plenário da Câmara dos Deputados, é uma solução para padronizar a comprovação das pessoas com deficiência e retirar obstáculos desnecessários a serviços e benefícios.
“A inclusão não pode ser só uma palavra vazia. Ela precisa partir de cada um de nós e se transformar em prática diária. Minha luta é para que cada um deles tenha o direito de viver com dignidade”, afirmou o parlamentar.
O “apagão de dados” oficiais sobre a população autista no Brasil foi outro tema levantado na tribuna por Amom. O limbo de informações detalhadas sobre esse grupo social dificulta, principalmente, a implementação de políticas públicas. “A ausência de um registro unificado contribui para a invisibilidade dessas pessoas, comprometendo seu acesso a direitos fundamentais”, disse.
Simplificar para população
Como membro da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência (CPD), Amom se comprometeu a ser linha de frente na criação do Código Brasileiro de Inclusão. A ideia é consolidar todas as leis federais sobre PCDs em um único lugar, tornando-as mais acessíveis à própria população e, portanto, mais eficazes na promoção da inclusão. Legislações referentes aos direitos das pessoas com deficiência estão dispersas, o que dificulta a compreensão e aplicação.
“Junto ao presidente da Comissão de Defesa dos Direitos das Pessoas com Deficiência, deputado Duarte Júnior, iniciamos debates, realizamos audiências públicas e estabelecemos diálogos contínuos com especialistas, autoridades e famílias, visando identificar e implementar soluções concretas para os desafios enfrentados pela comunidade autista”, disse.
Fonte: Cidadania 23
Brasil não deve despertar velhos ressentimentos dos paraguaios
2 de abril de 2025PH-destaque,Militares,paraguai,posição_1,Manchete-Home,Mais NotíciasNotícias,Brasília,política,violência,governo,cultura,Guerra,Literatura,Memória,POLÍTICA HOJE
Funcionário da Abin revela que a agência fez invasões de hacker a sistemas do Congresso, da Presidência e de autoridades do Paraguai envolvidas nas negociações de Itaipu
Luiz Carlos Azedo/Correio Braziliense
Segundo volume da coleção Plenos Pecados, da Editora Objetiva, Xadrez, Truco e Outras Guerras, do escritor José Roberto Torero, é inspirado na Guerra do Paraguai (1865-1870), o maior conflito armado em que o Brasil esteve envolvido no continente. Os demais livros, sem spoiler, são Mal Secreto, de Zuenir Ventura (Inveja); O Clube dos Anjos, de Luís Fernando Verissimo (Gula); A Casa dos Budas Ditosos, de João Ubaldo Ribeiro (Luxúria); Canoas e Marolas, de João Gilberto Noll (Preguiça); Terapia, de Ariel Dorfman (Avareza); e Voo da Rainha, de Tomás Eloy Martínez (Soberba).
O livro de Torero é uma sátira meio macabra envolvendo pessoas em conflitos durante a Guerra do Paraguai. Seu pecado capital é a ira. O livro narra de forma ficcional a implacável perseguição ao Mariscal (marechal) Francisco Solano López, o ditador do Paraguai, de mando do príncipe francês Gastão de Orléans, o Conde d’Eu, capitão de cavalaria na Guerra Hispano-Marroquina e comandante-chefe do exército imperial na Guerra do Paraguai, casado com a Princesa Isabel, a herdeira do trono brasileiro. O trauma dessa guerra até hoje alimenta ressentimentos dos paraguaios. Morreram 90% dos homens acima de 20 anos do Paraguai.
Nesta terça-feira, o governo do Paraguai convocou o embaixador do Brasil no país, José Antônio Marcondes, para cobrar explicações sobre o suposto monitoramento da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) a sistemas do governo paraguaio. Em depoimento à Polícia Federal, um funcionário da Abin informou que a atual gestão da agência teria mantido operações de invasão hacker a sistemas do governo do Paraguai e de autoridades envolvidas nas negociações da usina de Itaipu.
A denúncia é mais uma dor de cabeça para o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pois o governo está em fase de negociações com o Paraguai sobre o Anexo C do acordo de construção da usina de Itaipu, que define as condições de comercialização da energia gerada. O chanceler do Paraguai, Rubén Ramírez, afirmou que as autoridades do país classificam o tema como “delicado” e disseram que o Brasil precisa explicar qual foi o resultado da interferência. O ministro de Indústria e Comércio, Javier Giménez García de Zúñiga, que negocia o acordo, afirmou que os debates sobre o tema estão suspensos até que a questão seja esclarecida.
A Polícia Federal investiga o vazamento de informações no âmbito do inquérito sobre a chamada “Abin paralela”, que teria utilizado ferramentas e serviços da agência para a prática de ações ilícitas. No depoimento, o funcionário da Abin afirmou que a atual gestão da agência manteve operações de invasão hacker a sistemas governamentais do país vizinho, inclusive do Congresso, da Presidência da República e de autoridades envolvidas nas negociações da usina de Itaipu.
A ação foi iniciada ainda no governo Jair Bolsonaro, mas continuou durante o governo Lula, com suposta autorização expressa do atual diretor da Abin, Luiz Fernando Corrêa. Teria como objetivo obter dados sigilosos sobre valores em negociação no Anexo C do Tratado de Itaipu. Uma tremenda trapalhada.
O massacre
Solano López morreu na Batalha de Cerro Corá ou Aquidabanigui, a última da guerra, a 454km ao nordeste de Assunção. Os paraguaios tinham sido derrotados na Batalha de Campo Grande (16 de agosto de 1869), pelas tropas imperiais. O exército paraguaio estava, desde então, reduzido a uns 400 ou 500 combatentes, sobretudo velhos, adolescentes e crianças, famintos, esfarrapados e mal armados.
Em 26 de fevereiro de 1870, o general brasileiro José Antônio Correia da Câmara, no comando de mais de 2 mil homens bem armados e bem alimentados, seguiu em direção ao acampamento paraguaio de Cerro Corá. Na manhã de 1º de março, uma terça-feira, as forças imperiais atacaram em duas frentes. Em 15 minutos, a linha de resistência sucumbiu. Juan Francisco, o Panchito, filho de Solano López, de 15 anos, lutou de sabre na mão, até ser fulminado por tiro.
O presidente paraguaio fugiu a cavalo, acompanhado de três oficiais. A versão oficial conta que López acabou cercado por dois soldados e resistiu, empunhando seu espadim de cerimônia, sendo revidado com um golpe na cabeça. O cabo José Francisco Lacerda, de 22 anos, conhecido como Chico Diabo, transpassou López com a lança, de baixo para cima, atingindo a virilha direita e alcançando as entranhas. O que aconteceu depois tem várias versões, todas tendo o general Correia da Câmara no comando.
López morreu em combate ou foi executado? A hipótese de execução é corroborada pela profanação do seu cadáver, que teve sua orelha esquerda cortada, os dentes quebrados a coronhadas de fuzis, um dedo arrancado e um pedaço do couro cabeludo escalpelado, tudo seguido de um massacre da população civil. Somente em 4 de março, o Conde d’Eu foi informado da morte de Solano López; estava longe dos combates, a bordo de um navio.
A espada do López foi enviada por Correia da Câmara ao imperador D. Pedro II. O general presenteou o visconde de Rio Branco com a condecoração que López portava e ficou com o relógio do Mariscal, que a seguir doaria a um museu. Chico Diabo, o matador de López, tomou para si a faca de prata e ouro, com as iniciais FL (Francisco López).
O canhão “El Cristiano” (o cristão, em português), com 12 toneladas, que está exposto no Museu Histórico Nacional, no Rio de Janeiro, foi feito com o metal dos sinos das igrejas de Assunção, onde ajudou a conter o avanço das tropas brasileiras por dois anos. Até hoje o Paraguai espera sua prometida devolução.
Fonte | Nas entrelinhas: todas as colunas no Blog do Azedo
Lula destaca 40 anos de democracia ao lembrar golpe de 1964
1 de abril de 2025POLÍTICA HOJE,PH-destaque,Militares,posição_1,Mais NotíciasNotícias,congresso,Brasília,política,Luiz Carlos Azedo,violência,Justiça,Partidos,terrorismo,Memória
É importante a reflexão sobre 1964 para que os fatos não se repitam como tragédia, ou seja, para que outra tentativa de golpe não tenha êxito
Luiz Carlos Azedo, Entrelinhas/Correio Braziliense
Desde a redemocratização, há 40 anos, nunca foi tão importante relembrar o golpe de 1964. Embora nossas instituições democráticas tenham revelado resiliência ao debelar a intentona de 8 de janeiro de 2023, o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) dos envolvidos na conspiração golpista, entre os quais o ex-presidente Jair Bolsonaro, três generais de Exército e um almirante de esquadra, não é um tema pacífico no Congresso Nacional, mesmo tendo sido um dos palácios invadidos e depredados por bolsonaristas inconformados com a eleição do petista.
As articulações para aprovação de uma anistia aos envolvidos, o que inclui o ex-presidente Jair Bolsonaro, que está inelegível, são a comprovação de que o passado sombrio precisa ser levado em conta no presente. Foi o que fez o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ontem, sem alimentar ressentimentos em relação às Forças Armadas, que foram fundamentais para que fracassasse a tentativa de o destituir, uma semana após a posse.
“Hoje é dia de lembrarmos da importância da democracia, dos direitos humanos e da soberania do povo para escolher nas urnas seus líderes e traçar o seu futuro. E de seguirmos fortes e unidos em sua defesa contra as ameaças autoritárias que, infelizmente, ainda insistem em sobreviver”, escreveu Lula no seu perfil do X.
“Não existe, fora da democracia, caminhos para que o Brasil seja um país mais justo e menos desigual. Não existe um verdadeiro desenvolvimento inclusivo sem que a voz do povo seja ouvida e respeitada. Não existe justiça sem a garantia de que as instituições sejam sólidas, harmônicas e independentes”, acrescentou.
Lula completou: “Nosso povo, com muita luta, superou os períodos sombrios de sua história. Há 40 anos, vivemos em um regime democrático e de liberdades, que se tornou ainda mais forte e vivo com a Constituição Federal de 1988. Esta é uma trajetória que, tenho certeza, continuaremos seguindo. Sem nunca retroceder.”
“Lembrai-vos de 64”, perdão pelo trocadilho com o título do livro de Ferdinando Carvalho sobre a atuação do Partido Comunista Brasileiro (PCB), publicado pela Biblioteca do Exército, em 1981, mas é o caso. O general é autor de mais duas obras sobre o mesmo tema, porém ficcionais: Os Sete Matizes do Rosa e Os Sete Matizes do Vermelho, ambos de 1977.
Seus livros até hoje alimentam o discurso de ódio dos saudosistas do regime militar, principalmente aqueles que tomaram de assalto o Palácio do Planalto, o Congresso e o Supremo com objetivo de provocar uma intervenção militar e destituir o presidente Lula. Carvalho escreveu Lembrai-vos de 35 (Biblioteca do Exército) com o objetivo de conter a abertura política durante o governo do general João Baptista Figueiredo, após a anistia de 1979 e o restabelecimento das eleições diretas para governadores, marcadas para 1982.
Radicalização política
Enfraquecido na Presidência pelo avanço da oposição, que vencera as eleições proporcionais de 1974 e 1978, Figueiredo era desafiado pelos porões do próprio regime militar, de onde partiam os atentados terroristas em bancas de jornais, gráficas, até contra a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a Associação Brasileira de Imprensa (ABI), que clamavam por democracia e liberdade.
A disposição terrorista dos militares envolvidos com sequestros, torturas e assassinatos de oposicionistas nos quartéis, que também haviam sido beneficiados pela anistia, não tinha limites. Até que deu errada a ação terrorista promovida por membros do DOI-Codi e setores da linha dura militar em 30 de abril de 1981.
Durante um show de MPB com 20 mil pessoas, no Rio Centro, na Zona Oeste do Rio de Janeiro, uma bomba explodiu acidentalmente em um veículo, matou um sargento e feriu um capitão do Exército, enquanto outro artefato, posicionado no gerador, não foi detonado.
O caso expôs divisões nas Forças Armadas e intensificou o movimento por mudanças democráticas. A imprensa teve um papel fundamental na denúncia de abusos e na luta pela verdade histórica durante a transição, sua atuação na cobertura desse atentado é um marco do jornalismo brasileiro.
Alguns jovens cadetes e oficiais influenciados àquela época pelas obras de Carvalho voltariam ao poder com a eleição de Jair Bolsonaro (PL) à Presidência, em 2018, entre eles o ex-ajudante de ordens do general Silvio Frota e general de Exército Augusto Heleno, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência, com destacada liderança militar.
A matéria-prima dos livros de Carvalho é o Inquérito Policial Militar (IPM) nº 7.098 (1964-1966), do qual foi responsável, para apurar as atividades do PCB no território nacional. Muito do que a direita ideológica brasileira fala hoje sobre a esquerda no Brasil reproduz suas teses.
Nas entrelinhas: todas as colunas no Blog do Azedo
‘Claramente, há uma doença na alma americana agora’, diz o cientista político Mark Lilla
31 de março de 2025Notícias,TEMAS & DEBATES,TD-destaque,cientista político,mark lilla,posição_1Manchete-Home,Mais Notícias
Autor de livros sobre o pensamento reacionário diz que Donald Trump quer liderar uma contrarrevolução e decreta a morte do conservadorismo
Por Guilherme Evelin/Estadão
Cientista político, historiador das ideias e ensaísta, Mark Lilla, professor de Humanidades da Universidade Columbia, em Nova York, é um dos mais argutos observadores das mudanças econômicas, sociais e políticas nos Estados Unidos que levaram Donald Trump a conquistar a presidência do país por duas vezes.
Lilla vê o fenômeno Trump como resultado de transformações — uma delas, o aumento do individualismo na sociedade americana — iniciadas com o reaganismo, o movimento criado a partir da primeira eleição de Ronald Reagan para a Casa Branca em 1980. Para Lilla, agora, está claro, porém, que o populismo de Trump representa a morte do conservadorismo encarnado por Reagan, o que criou, segundo ele, um vácuo na política americana, difícil de ser preenchido.
Em 2016, na primeira eleição de Trump, Lilla causou polêmica com um artigo em que atribuía a derrota de Hillary Clinton às políticas identitárias que transformaram o Partido Democrata num porta-voz de grupos minoritários, mas com pouca conexão com o restante da sociedade. Agora, ele avalia que um certo desleixo com que o governo democrata de Joe Biden tratou a questão da imigração ilegal foi fundamental para o retorno de Trump. Lilla participou recentemente de um evento sobre os 40 anos da redemocratização no Brasil organizado pela Fundação Astrojildo Pereira.
Leia a seguir os principais trechos de entrevista que ele deu ao Estadão.
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, faz pronunciamento na Casa Branca: presidente tem tomado inúmeras decisões por decreto. O senhor acha que Donald Trump no poder representa o auge de um processo de declínio do conservadorismo americano que começou depois do governo Ronald Reagan. Pode explicar essa ideia?
O conservadorismo americano é diferente do conservadorismo na Europa ou na América Latina, onde os países foram profundamente marcados pela história da Igreja Católica e pela existência de uma aristocracia com terras. Os Estados Unidos são um país de imigrantes, de comércio e que sempre foi individualista. Aqui, desenvolveu-se um conservadorismo “fusion”, que fundiu o individualismo do livre mercado e a defesa da ordem econômica liberal com os valores sociais tradicionais relacionados à família, aos papéis de homens e mulheres na sociedade, ao lugar da religião na sociedade. Esse foi um casamento muito estranho, com uma grande tensão, porque o individualismo na esfera econômica pode se esparramar para a cultura da sociedade e afetar a moralidade. Mas ele prosperou ao longo do século 20, e o governo Ronald Reagan foi a coroação desse conservadorismo que acreditava nas instituições e em mudanças lentas.
Essa tradição, porém, não tinha como se defender do populismo que ascendeu após Reagan por várias razões. Muito tem a ver com o que aconteceu no mundo do rádio e da televisão. Havia uma regra de radiodifusão nos EUA que dizia, por exemplo, que cada estação de rádio tinha que apresentar os dois lados de uma questão política. Isso foi abolido durante os anos Reagan. O que ocorreu em seguida foi que surgiram locutores de rádio que ganharam fama e ficaram ricos alimentando ideias populistas radicais. Também,por alguma razão, aqueles que estão na direita realmente perderam a cabeça por causa de Bill Clinton. Clinton era, de muitas maneiras, conservador. Fiscalmente, ele era conservador e tirou pessoas dos programas de assistência social. Mas, por ele ser jovem e moderno, isso, por alguma razão, afetou profundamente as pessoas de direita. A outra coisa que ocorreu foi o Nafta, o acordo de livre comércio com o Canadá e México.
Então, todas essas coisas se juntaram, e a velha tradição conservadora, naquele momento representada pela família Bush, nunca se reproduziu, nunca teve filhos, ideologicamente falando. No primeiro debate da eleição de 2016 entre os pré-candidatos republicanos, houve aquele contraste incrível entre Jeb Bush (ex-governador da Flórida), que era um dos filhos de George Bush, e Trump.
Trump entendia de televisão, entendeu que a nação havia mudado e simplesmente destruiu Bush. Hoje, podemos dizer que o conservadorismo americano morreu, porque Trump e seus seguidores não são conservadores, apesar de serem muitas vezes chamados assim. São populistas reacionários que querem fazer uma contrarrevolução na política e na sociedade. Ao contrário do que se pensava, a era Reagan não representou um rejuvenescimento do conservadorismo americano,mas o início do seu fim.
Quais foram as razões materiais para essa transformação do conservadorismo em populismo?
Acho que três coisas podem ser mencionadas. A primeira foi o Nafta, que destruiu áreas do país onde as pessoas eram tradicionalmente democratas, como em Detroit, onde eu cresci. As pessoas começaram a votar nos republicanos para presidente, enquanto permaneciam democratas em outros aspectos. De repente, todos esses homens perderam seus empregos e não podiam mais sustentar suas famílias. Suas esposas arrumaram empregos e passaram a ganhar mais dinheiro do que eles. Então, isso gerou uma grande crise social e muita raiva.
O abuso de drogas aumentou em todo o país. A segunda coisa é que a economia mudou no sentido de que a indústria passou a importar cada vez menos, e você passou a precisar de um diploma para ter uma vida de classe média, o que não era o caso antes. Então, você tem um grande grupo de pessoas insatisfeitas. Nem é uma classe econômica, mas um grupo de pessoas presas nessa situação insatisfatória. A última coisa a ser mencionada, obviamente, é a internet e como ela, em vez de moderar a opinião política, apenas inflama as paixões das pessoas.
A morte do conservadorismo deixou um vácuo na política americana. Vê alguma possibilidade desse vácuo ser preenchido no futuro?
Apenas em um futuro distante. Não há nenhum democrata importante agora que possa fazer isso, e enquanto Trump estiver por perto, nenhum republicano o fará. Então, minhas energias agora estão sendo dirigidas para tentar criar programas de educação para criar uma nova elite democrata que não seja progressista de esquerda ou radical de esquerda, mas moderada e centrista.
Os conservadores e agora os “trumpistas” têm todas essas escolas de verão em todo o país, pagas por fundações, aonde jovens, seja no ensino médio ou na faculdade, vão por duas semanas, estudam grandes livros, encontram políticos e ingressam num pequeno mundo. Isso nunca aconteceu do lado democrata, e então estou interessado em buscar isso. Temos que começar do zero.
O ex-presidente Joe Biden é um democrata centrista. No entanto, seu governo não conseguiu impedir o retorno de Donald Trump ao poder. Quais foram os principais motivos desse fracasso? A inflação durante o governo Biden ou a política identitária seguida pelos setores mais esquerdistas do Partido Democrata?
Tudo isso foi importante, mas a primeira coisa a mencionar é a imigração. O governo Biden teve o instinto suicida de deixar mais e mais pessoas cruzarem ilegalmente do México para os EUA. O problema da imigração não é a imigração em si, mas o fato de que ela deixa, para as pessoas com mentalidade populista, mais visíveis todos os problemas pelas quais estão chateadas e acumulam raiva, como a perda de seus empregos, o multiculturalismo e uma sensação de desrespeito porque os imigrantes têm acesso a serviços sociais que pessoas da classe trabalhadora deixaram de ter. Biden não conseguiu ver isso. Seu declínio mental já era evidente no primeiro ano após sua eleição, e ele realmente entregou a maior parte do trabalho às pessoas do seu governo. Ele não prestou atenção à imigração e não a controlou. Kamala Harris também não viu problema com a imigração.
O senhor acha então que a chamada política identitária seguida pelo Partido Democrata teve um peso menor na derrota de 2024 do que na primeira eleição de Trump, em 2016, quando o senhor escreveu um artigo de grande repercussão, criticando o “identitarismo”?
Certamente, essa foi uma questão de fundo, mas os democratas tentaram, de alguma forma, “limpar” sua imagem. A convenção nacional que nomeou Kamala Harris como candidata presidencial não colocou ênfase na questão identitária e se esmerou em mostrar bandeiras americanas tremulando. Mas o partido ainda se organizava de acordo com grupos de identidade. Quando as pessoas que concorriam ao Congresso saíam à busca dos eleitores, ainda usavam essa linguagem.
Mais do que isso, desde que escrevi sobre os problemas da política identitária, ela se institucionalizou nas universidades e nas corporações e começou a parecer que seria uma característica permanente da vida americana. Quando eu conversava sobre isso com meus colegas democratas, eles diziam: “Você está exagerando só porque escreveu um livro sobre isso”. Mas desde que Trump foi reeleito, ele se concentrou em acabar com os programas de ação afirmativa em todas essas instituições e está sendo aplaudido pela direita e pela base de seu partido. Isso claramente importa para eles.
Quão séria o senhor considera a ameaça do governo Donald Trump à democracia nos EUA? O país está em um caminho para o autoritarismo, como alegam alguns críticos de Trump?
O perigo maior é que nos tornemos mais oligárquicos. Se você olhar para a foto das pessoas que estavam na posse de Trump, não havia nada além de bilionários atrás dele. Há também os favores especiais que estão sendo dados a Elon Musk e à Tesla. Trump está promovendo uma grande quebra da estrutura do Estado e isso vai gerar muito caos. Sobre a questão do autoritarismo, na verdade não saberemos a resposta para essa pergunta até vermos como os tribunais respondem. Vários casos estão percorrendo o sistema judiciário, mas ainda não sabemos como os juízes decidirão. Eventualmente, as principais questões terão que ser decididas pela Suprema Corte. Lá, podemos ter certeza de que dois dos juízes votarão com Trump, não importa o quê.
O senhor se refere aos juízes Samuel Alito e Clarence Thomas?
Sim.
Como vê a postura adotada até agora contra o governo Donald Trump pelo Partido Democrata, que parece estar passando por uma espécie de crise existencial?
Bem, há posturas e ações. Posturas, não estou interessado agora. Estou interessado em ação. Há muitas pequenas manifestações em todo o país, mas ninguém organizou uma marcha em Washington ainda, o que é muito surpreendente para mim. O problema dos democratas é que eles não têm um candidato presidencial forte ou um ex-presidente que possa aproveitar o momento.
E é desesperador que Chuck Schumer (que votou a favor de extensão do Orçamento apresentada pelos republicanos no Congresso americano) seja o líder da oposição no Senado. Muitas pessoas estão impulsionando Alexandra Ocasio-Cortez, a deputada de esquerda de Nova York, para assumir um papel de líder. Ela é jovem. Ela é enérgica. Ela é persuasiva em certas questões. Mas ela não é alguém que pode falar com a América média. Tê-la como líder significaria também desistir de uma política externa forte, porque ela, à sua maneira, é uma espécie de isolacionista.
Vê algum papel do Congresso na resistência a possíveis planos autoritários de Trump?
Não vejo. A resistência teria que vir dos republicanos. Os democratas podem votar contra Trump o quanto quiserem, mas se Trump tiver maioria, ele será protegido pelo Congresso. O que está faltando são precisamente vozes conservadoras que se preocupam com a República. Uma das minhas primeiras memórias políticas é o caso Watergate e assistir às audiências sobre as investigações no Congresso.
Havia, pelo menos,um terço dos republicanos, desde o início, que queriam que Richard Nixon renunciasse ou pensavam que havia problemas que deveriam ser investigados. E eles defenderam as instituições democráticas. Não há hoje um único republicano no Congresso que faria isso agora. A última foi Liz Cheney (ex-deputada por Wyoming, filha do ex-vice-presidente Dick Cheney, que votou pelo impeachment de Trump após a invasão do Capitólio) , e ela foi expulsa do partido
Qual é a razão para tal domínio do Partido Republicano por Trump?
Trump entrou na eleição de 2016 por uma espécie de projeto de vaidade pessoal. Mesmo na noite da eleição, ele não esperava vencer. Melania (a primeira-dama) ficou chocada e deprimida quando ele venceu. Mas ele começou a soar como um demagogo clássico, um tribuno do povo, e um culto de personalidade se desenvolveu em torno dele. Então, essa coisa foi colocada no colo de Trump por uma grande parte do público americano. Então,não é só o que há de errado com Trump. A pergunta é: o que há de errado com os americanos?
Qual é sua resposta para essa pergunta?
Há muitas coisas erradas com a América, que se encontram em outros países, certo? O que é mais profundamente perturbador para mim e sobre o qual escrevi em meu livro “Ignorance and Bliss” (sem tradução no Brasil) é a falta de vontade das pessoas de aceitar a ciência, a razão e as evidências ao tomar suas decisões. Isso afetou sua visão da política e do engajamento político. Um número significativo de eleitores republicanos agora diz que ficaria feliz com um regime militar. Houve uma quebra do patriotismo e da responsabilidade cívica nesse grande grupo de pessoas brancas insatisfeitas. A podridão já estava lá, mas no momento em que Trump apareceu e foi eleito, as pessoas se alinharam atrás dele. Então, claramente, há alguma doença na alma americana agora.
Como professor de Columbia, em Nova York, como viu a decisão da direção da universidade de concordar com exigências da administração Trump para restaurar fundos de US$ 400 milhões cortados pelo governo, sob a alegação de que estudantes judeus não foram protegidos de assédio durante protestos contra a guerra na Faixa de Gaza. Viu uma capitulação a uma pressão indevida?
O governo Trump não cortou os fundos apenas pelo que aconteceu durante as manifestações. O caso inclui também o programa de estudos do Oriente Médio, iniciado por Edward Said(intelectual palestino, um dos fundadores dos estudos pós-coloniais) ,que se tornou um lugar hostil especialmente para estudantes israelenses que vieram estudar em Columbia após o serviço militar, devido a professores que eram muito antissionistas e traziam suas opiniões para a sala de aula. Isso tem sido um fato da vida em Columbia há muito tempo.
Na minha opinião, não cabe ao governo federal intervir nisso. Mas eles usaram a lei de direitos civis para justificar a intervenção. Imagine todo o aparato administrativo que foi criado para lidar com a discriminação no campus e para proteger estudantes negros.Todas essas regras podem ser usadas para proteger judeus e judeus israelenses, mas não estavam sendo aplicadas. Algo deveria ter sido feito internamente na universidade em relação a este departamento e essas manifestações, porque se houvesse um departamento onde estudantes negros se sentissem desconfortáveis em estudar, isso seria intolerável. Uma intervenção não deveria ter vindo do governo federal e isso, de fato, é uma capitulação.
A questão é saber se a universidade não tínha outra escolha a não ser capitular, porque não são apenas os US$ 400 milhões. Se não aceitasse os termos do governo, todo o financiamento de Columbia poderia ser interrompido, caso em que a universidade teria que fechar imediatamente. Então, é uma situação muito complicada.
O governo Trump está travando uma guerra contra as universidades de elite dos EUA e Columbia foi o primeiro alvo nessa guerra?
Sim. Há uma guerra total agora. JD Vance (o vice-presidente) disse uma frase, agora famosa: “A universidade é nosso inimigo”. Há um ativista político, Christopher Rufo, que tem sido o principal responsável por fazer com que políticos da direita usem todos os meios possíveis para punir universidades que, em sua opinião, se tornaram “woke” (termo em inglês, hoje usado de forma pejorativa para designar tentativa de imposição de ideias progressistas) . Há um esforço em duas frentes: um é tirar o financiamento de universidades que seriam progressistas; o outro é criar universidades separadas – há algumas na Flórida agora e em outros lugares – que seriam oficialmente não “woke”.
Como vê as consequências dessa mudança nos EUA para o futuro da democracia no mundo?
Há duas coisas a serem ditas. Uma é que Trump está fornecendo um manual para tipos ditatoriais em outros países imitá-lo. Os governantes muitas vezes se imitam. Quando Luís XIV construiu Versalhes, isso despertou muita inveja em outros reis, que passaram a tentar construir pequenas Versalhes em toda a Europa. Agora, líderes de outros países estão tentando imitar Trump - Bolsonaro no Brasil, especialmente.
Então, Trump é especialmente tóxico para o Brasil neste momento. Por outro lado, os americanos– especialmente aqueles que são conservadores – têm a impressão de que o mundo não faz nada além de reclamar da América. Eles simplesmente não estão cientes do fato de que, abaixo de algumas críticas superficiais, as pessoas querem vir para os Estados Unidos, não apenas por razões econômicas, mas porque gostam da ideia de autogoverno, de viver sob um Estado de direito, sem que a autoridade seja usada arbitrariamente contra eles.
Então, quaisquer que sejam as reclamações que possam ser feitas sobre a política externa americana na ONU e em outros fóruns internacionais, pessoas comuns em todo o mundo ainda veem nos EUA coisas que as inspiram. Isso não vai desaparecer da noite para o dia, mas é difícil crer que o efeito do governo Trump no resto do mundo será bom. Por outro lado, com a retirada dos EUA da Europa, os países europeus terão que encontrar seus recursos internos para serem exemplos de democracia e terem sua própria política externa. Algo novo e talvez bom saia disso.
Os maus jogadores da Nova República e os 40 anos de redemocratização
28 de março de 2025Notícias,Alberto Aggio,democracia,POLÍTICA HOJE,PH-destaque,posição_1Manchete-Home,Mais Notícias,cidadania 23
Vinícius Müller*
Uma das maiores complexidades da história se revela na dificuldade de estabelecermos certo consenso sobre quais itens e personagens de um determinado período merecem ser considerados fundamentais ou mais relevantes para quem, no futuro, tenta capturar a essência daquela conjuntura. Essa dificuldade se acentua quando a história a ser compreendida é suficientemente atual para que possamos chamá-la de ‘história do tempo presente’, afinal não podemos contar, nesse caso, com o distanciamento temporal como um aliado daqueles que se dedicam a decifrar o passado. Por isso, uma das maneiras de mitigar essa dificuldade reside no uso das efemérides como um auxílio para a definição de parâmetros, criando um espaço que, ao mesmo tempo, limita e possibilita nosso entendimento sobre a história. E apenas com essa limitação dada pela efeméride é que podemos identificar os itens persistentes e personagens ainda vivos que tornam essa história não só inteligível, mas própria ‘do tempo presente’.
Neste ano de 2025 temos uma chance maiúscula de usarmos uma efeméride para reconstruirmos uma história que ainda nos define como sociedade. Há 40 anos, o colégio eleitoral escolhia Tancredo Neves como presidente da República, formalizando a ascensão de um civil ao cargo maior do País após 21 anos de ditadura militar. Esse é o recorte histórico estabelecido por Alberto Aggio em seu novo livro A Construção da Democracia no Brasil, 1985-2025: mudanças, metamorfoses, transformismos (Fundação Astrojildo Pereira/Editora Annablume). Aggio, professor de História na Unesp e intelectual com longa contribuição ao entendimento da história política do Brasil e da América Latina, não apenas descortina a origem da Nova República brasileira, cuja fundação ocorreu exatamente no episódio da eleição de Tancredo, mas lança luz sobre os itens e personagens fundamentais desse que, embora seja o mais longevo período democrático brasileiro, enfrenta nos últimos momentos o aumento da desconfiança em relação aos seus próprios fundamentos. Ou seja, reconstrói aquela que se apresenta como a mais urgente ‘história do tempo presente’ para uma geração, da qual Aggio faz parte, que vivenciou a transição do poder militar para os civis e que inaugurou a redemocratização brasileira.
Transições e rupturas na redemocratização brasileira
O modo como essa história nos é revelada se relaciona à uma série de leituras que temos sobre nosso passado. Essa variedade é a janela que possibilita o entendimento das origens não só da Nova República, mas também — e principalmente — dos motivos que nos levaram a pensar que ela está em risco desde, ao menos, 2013.
Explicitamente, três questões se impõem a partir da escrita de Aggio. Uma delas é o uso, caro ao autor, da abordagem do italiano Antonio Gramsci, teórico que cunhou a tese da revolução passiva. Nesse caso, a transformação operada pela redemocratização que caracteriza a Nova República não deve ser vista pela ruptura, mas sim por uma transição cujos elementos da mudança são tão visíveis quanto os elementos da continuidade, embora a direção dessa transformação aponte para certa predominância dos primeiros sobre os últimos. Dessa forma, há uma espécie de sentido da história que, entre avanços e obstáculos, se consolidou majoritariamente como uma transformação cujos itens constitutivos devem ser vistos ao longo da trajetória. Tais itens são inegavelmente aqueles que formam uma estrutura que, mesmo insuficiente, dá coerência ao período: eleição de Tancredo Neves; Constituição de 1988, Plano Real e avanço das questões sociais sob os dois primeiros governos de Lula.
A segunda questão, de certa forma complementar à primeira, é a leitura da Nova República a partir da obra de Luiz Werneck Vianna e sua citada frase de que o Brasil “tem horror à linha reta, uma vez que o traço de preferência nacional é o ziguezague”. Esse vai e vem tem se revelado nas últimas quatro décadas por aparentes contradições entre a modernização e o arcaísmo que, de tempos em tempos, ganha nova roupagem. No caso da Nova República esse conflito pôde ser visto de forma mais nítida na contingência da presidência de José Sarney. Eleito como vice na chapa de Tancredo, Sarney carregava a contradição de ter sido aliado da ditadura militar e o primeiro presidente, de fato, da Nova República. Mais do que isso, de ter operado seu governo a partir de elementos contidos no ambiente democrático, mas ainda carregando o ‘entulho autoritário’ do período anterior. Em uma leitura que desconsidera a ‘revolução passiva’ e seu andar em ziguezague que, com temporalidades diversas, ao fim e ao cabo, garantiu avanços significativos e democráticos à Nova República, Sarney e seu governo foram e ainda são vistos por certos segmentos da esquerda brasileira como muito pior do que realmente foram. Cabe aqui, portanto, a proposta de que sem uma revisão dos primeiros anos da Nova República que reposicione, sob um olhar amplamente positivo sobre o que significou o governo de Sarney para a redemocratização brasileira, não teremos a dimensão necessária para compreendermos o debate sobre uma possível crise que nossa democracia estaria vivendo desde 2013. Ou seja, o destaque ao governo Sarney não deve ser dado ao seu passado de aliado aos militares, e sim à sua relação fortemente amparada em valores democráticos junto à Constituinte de 1988, criadora da principal sustentação da Nova República.
E a aproximação entre a abordagem da revolução passiva e o ziguezage de Werneck Vianna possibilita transparecer o terceiro item fundamental da obra de Aggio. Parcelas significativas entre aqueles que se diziam os restauradores da democracia, notadamente entre as esquerdas brasileiras, têm uma histórica dificuldade em compreender para além da perspectiva do conchavo, a possibilidade de um avanço democrático, em sentido amplo, e, portanto, uma transformação verdadeira, a partir da política da conciliação. Tal dificuldade revela um olhar maniqueísta sobre a história brasileira e que, de certa forma, justificou a equivocada percepção de que a verdadeira redemocratização só ocorreria por ruptura. Embora a obra de Aggio concentre a análise no período da Nova República, essa percepção se repete em outras leituras sobre momentos variados de nossa história, como a Independência, a conciliação do Império, a Proclamação da República e a lei da Anistia.
O resultado dessas diferentes leituras de nossa história foi a criação de ao menos dois grandes rompimentos. Um deles, interno à esquerda, foi a cisão entre aqueles que rapidamente se posicionaram não só como democratas, mas que também reconheceram a legitimidade dos itens que formam o escopo da democracia brasileira. De outro lado, aqueles que se disseram democratas, mas se posicionaram contrariamente aos itens que constituem a institucionalidade da Nova República. O problema é que, passados 40 anos, está evidente que foi o segundo grupo que se destacou e se transformou numa das forças hegemônicas no País.
A regra do jogo e os jogadores
Em certa medida, a repactuação do federalismo contemplada pela Constituição de 1988 potencializou certa hegemonia sobre o jogo eleitoral da Nova República ao PMDB. Oriundo do antigo MDB, de oposição ao regime militar, o partido teve três presidentes (Sarney, Itamar e Temer), mas inúmeros poderes subnacionais, além de figurar tanto no Congresso quanto na divisão ministerial dos governos nacionais como protagonista durante quase todos os quarenta anos de redemocratização. Teve também sua dissidência à esquerda, o PSDB, como responsável por um dos pilares fundamentais do período, o Plano Real, sob a liderança de Fernando Henrique Cardoso. Contudo, a cultura política que após as quatro décadas ainda se revela majoritária é aquela identificada na intersecção entre o petismo e o papel de seu líder máximo, Lula da Silva, e sua ideologia, o lulismo. Com cinco vitórias eleitorais ao cargo majoritário do País — e mais tantas outras derrotas, quase todas em segundo turno — o petismo e o lulismo estiveram sempre como um dos dois protagonistas no plano eleitoral e político do País. Aggio acerta ao concentrar parte significativa de sua análise sobre a Nova República na cultura petista e, por isso, insinua o que pode ser o cerne de certa dicotomia que, depois de quatro décadas, nos deixa apreensivos quanto à crise da nossa democracia.
Não é novidade na história brasileira o embate entre as regras do jogo e seus elementos fundamentais de construção institucional, de um lado, e os principais jogadores, de outro. Como se houvesse um limite, testado sob forte pressão feita por alguns jogadores que oscilam, calculadamente, entre a aderência às instituições a partir de certa posição organicamente forjada e o descrédito dessas mesmas instituições a partir da construção de uma narrativa que se ampara no confronto, nunca na conciliação. A cultura petista e lulista que parcialmente se confunde com a trajetória desses quarenta anos de redemocratização apostou, ao longo de sua construção, no descrédito dos processos e eventos que deram, ao fim, a sustentação da Nova República. Embora tenha usado todos esses itens como trampolim não só para a sua contribuição mais acertada — o avanço das pautas sociais — mas também e, oportunamente, na defesa de alguns dos itens que estruturam a Nova República, o petismo se opôs à eleição de Tancredo (chegou a expulsar membros do partido que votaram em Tancredo no Colégio eleitoral), fez feroz oposição a Sarney, não chancelou a Constituição de 1988, foi contra a modernização econômica iniciada de modo atrapalhado por Collor, não aceitou compor o governo Itamar, chegando a desligar membros do partido que aceitaram cargos no governo (como ocorreu com Luiza Erundina), se opôs ao Plano Real — o qual acusava, infantilmente, de ser neoliberal — e contribuiu decididamente para a polarização que antecipa a tragédia atual ao associar sem nenhum pudor o governo FHC à direita ideológica.
Portanto, uma trajetória na qual o principal jogador usa as regras do jogo, no limite de sua violação, mas sem violá-la, para desacreditar os próprios marcos de criação e legitimidade das instituições. Essa aparente contradição não é novidade e nem exclusividade da Nova República. Infeliz e coincidentemente, ocorreu em certa medida no início da década de 1930, no período que imediatamente antecede ao golpe do Estado Novo varguista e na década que antecede o golpe militar de 1964. Não à toa, a última eleição presidencial foi disputada entre um saudosista do varguismo e um apologista da ditadura militar.
Entre os avanços e obstáculos da Nova República, a sociedade mostrou que identificava que parte das dificuldades desse período histórico vinha do confronto entre o ‘espírito’ das instituições e o modo como os jogadores se comportavam. A resposta foi a ampliação da recusa de um e outro, que significou a radicalização de alguns contra as instituições democráticas e a desconfiança em relação à honestidade e integridade dos agentes políticos. Ou seja, uma avenida para a ascensão da direita (essa sim, de verdade!) que estressou ainda mais a polarização e seriamente se comprometeu com a ruptura institucional.
Se a Nova República e a democracia brasileira estão sob risco, o livro de Aggio é esclarecedor na medida em que identifica e explica sem moralismos e vulgaridades a trama que, nas últimas quatro décadas, nos levou até essa situação. Se, de fato, não estão sob risco, é exatamente pela força das instituições que foram criadas e sustentaram o maior período democrático da história brasileira. Mesmo sob forte descrédito de alguns seus principais jogadores.
*Doutor em História Econômica, professor do INSPER, da Faculdade Belavista, da IBMEC, da FECAP, da Fundação Dom Cabral e do CLP-FAAPO. O autor publicou o texto, originalmente, no Estado da Arte/Estadão. Foto destaque: Felipe Rau/Estadão.
Livro A Construção da Democracia no Brasil, 1985-2025, será lançado em São Paulo
26 de março de 2025Notícias,EVENTOS FAP,Alberto Aggio,livro,democracia,EF-destaqueposição_1,Manchete-Home,Mais Notícias
Fundação Astrojildo Pereira e Annablume editaram obra, que é parte do projeto de 40 anos do regime no país
Comunicação FAP
O livro A Construção da Democracia no Brasil, 1985-2025: Mudanças, metamorfoses, transformismos (232 páginas), do historiador Alberto Aggio, será lançado nesta quarta-feira (2/4), em São Paulo. O trabalho, editado pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), vinculada ao Cidadania 23, e pela editora Annablume, é parte do projeto 40 anos de democracia no Brasil, organizado pela entidade e pelo partido, e será comercializado na internet.
O lançamento será realizado, a partir das 18 horas, na Livraria Martins Fontes Paulista, na Avenida Paulista, 509, Bela Vista, perto do Metrô Brigadeiro. O evento contará com a presença do autor, que vai recepcionar o público em uma noite de autógrafos. O livro foi lançado, em Brasília, no dia 14 de março deste ano. Aggio é doutor em História pela Universidade de São Paulo (USP), livre-docente e titular pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Também tem pós-doutorado pela Universidade de Valencia, na Espanha, e pela Universidade Roma Tre, na Itália.
“Neste livro, procuro realizar uma reflexão sobre o processo político brasileiro das últimas quatro décadas. Uma ideia organiza o livro: a construção da democracia. Nesse processo, coincidem mudanças, metamorfoses e transformismos que marcam os principais atores políticos dessa construção”, diz o autor, convidando o público para marcar presença no lançamento.
O processo de construção democrática dos últimos 40 anos no Brasil, segundo o texto, defronta-se hoje com um cenário global no qual os desafios à democracia são cada vez mais evidentes. “Tal situação produz mal-estar e desorientação ao conjunto da sociedade brasileira”, diz um trecho do livro.
“É reconhecível, quase que consensualmente, que há uma crise de legitimação democrática, que se vem impondo às democracias hodiernas, produzida por um gradativo e persistente arrefecimento da formulação programática dos partidos políticos, enfraquecendo as estruturas de representação, acompanhado por processos de colonização da lógica de mercado, o que tem proporcionado um enfraquecimento das possibilidades de consenso democrático”, afirma.
No livro, Aggio ressalta que o elevado índice de desigualdade social, chamada por ele de “marca dolorosa que ainda se mantém”, a despeito da ampliação do consumo das classes populares, nas últimas décadas, continua como um dos principais obstáculos que se colocam à construção de uma democracia de maior qualidade no Brasil. Essa constatação, segundo o autor, é possível ao analisar o caminho percorrido e o lugar a que se chegou o país.
“Apesar da diminuição da extrema pobreza, o país não conseguiu resolver o problema da desigualdade social e racial dentro de parâmetros aceitáveis. Não há como não reconhecer que isso afeta a convicção de que a democracia pode mudar a vida para melhor”, observa o autor.
De acordo com o livro, depois de 20 anos de autoritarismo e da imposição de uma modernização avassaladora que alterou a morfologia da sociedade brasileira e 40 anos de uma construção democrática exitosa, mas com reconhecidos déficits, não é facultado ao Brasil perder o rumo que o mantém atrelado à trilha do moderno. Isto é expresso principalmente nos atores representativos da política democrática.
Apesar de todas as dificuldades e das poderosas dúvidas a respeito do presente, segundo o texto, resta a expectativa de que o país possa ser capaz de romper os entraves que bloqueiam os avanços democráticos e, simultaneamente, inventar maneiras de aprofundar, em novo patamar, a modernidade política que, de alguma forma, a construção democrática dos últimos 40 anos estabeleceu como uma aspiração compartilhada. Isso, de acordo com o autor, é possível em um contexto que valoriza o que se fez de positivo e projeta aberturas e inovações correspondentes às irreversíveis mudanças tecnológicas.
A democracia, segundo o livro, se consolidou institucionalmente, prova disso é que conseguiu suportar a realização de dois processos de impeachment – um acontecimento político sabidamente traumático –, o que, de acordo com o autor, ocorreu “sem sobressaltos dramáticos”.
A partir de 2018, no entanto, a democracia brasileira viveu sob risco com a chegada da extrema-direita ao poder, mas os órgãos de controle institucionais conseguiram barrar as iniciativas de erosão democrática colocadas em marcha durante o governo de Jair Bolsonaro, impedindo que sua “guerra de movimento” contra as instituições políticas prosperasse.
O livro afirma, ainda, que a democracia brasileira conseguiu suportar a tentativa de golpe de Estado de 8 de janeiro de 2023, que fazia parte de um dispositivo previamente preparado de quebra da ordem institucional para impedir que se consumasse o retorno de Lula à presidência da República.
A fortaleza institucional da democracia contrasta, todavia, com a fragilidade da forma como a sociedade vivencia e participa da política, segundo o texto. Os partidos políticos, organismos centrais da vida democrática, foram e ainda são incapazes de se abrirem para a dinâmica de transformações que ocorrem na vida social e econômica. “Os partidos se oligarquizaram e se enrijeceram”, diz o livro.
“[Os partidos] passaram a ser estruturas voltadas para o enriquecimento de suas lideranças – e aqui não estamos nos referindo à corrupção –, o que gera um sentimento de rejeição da sociedade em relação aos partidos. O resultado é a perda de confiança na política, processo que acaba se generalizando por todos os setores sociais”, diz um trecho.
O livro reconhece avanços nessa dimensão, especialmente no que se refere à mecânica eleitoral, transformando o Brasil numa democracia de massas, legitimada interna e internacionalmente. Contudo, diz o autor, o sistema político presidencialista, com seu hibridismo característico, no qual o Executivo é eleito majoritariamente e o Parlamento proporcionalmente, não tem permitido e tampouco impulsionado reformas políticas significativas no campo da representação, o que afeta a qualidade da democracia.
Muitas oportunidades foram perdidas, nesses 40 anos, para serem realizadas reformas que melhorassem a estrutura de representação, como a implantação do voto distrital misto. Segundo o autor, algumas que foram feitas, como a cláusula de desempenho para os partidos nas eleições parlamentares, tardarão a ser implementadas integralmente.
“Esses dois exemplos apenas evidenciaram a dificuldade de legitimação das instituições na sociedade. Por isso, o êxito da construção democrática e o mal-estar diante da dificuldade de legitimação das instituições políticas parecem compor, paradoxalmente, duas faces de uma mesma moeda. Em razão disso, acaba predominando a desconfiança em relação às instituições políticas que dão sustentáculo à democracia. Mesmo assim, apesar das imperfeições e ineficiências, as instituições políticas têm sido um fator real de sobrevivência da democracia no Brasil”, diz o livro.
Lula vai a Tóquio com um olho no Trump e outro no Xi Jinping
25 de março de 2025Notícias,lula,Correio Braziliense,POLÍTICA HOJE,PH-destaqueposição_1,Mais Notícias
Luiz Carlos Azedo (Entrelinhas/Correio Braziliense)
Planejada para ampliar parcerias comerciais na Ásia, o objetivo é diversificar as correntes de negócios e tratar a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China como uma oportunidade para ampliar as relações com países asiáticos
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chegou ao Japão nesta segunda-feira, acompanhado dos presidentes da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP). Os ex-presidentes do Senado Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e da Câmara Arthur Lira (PP-AL) também integram a comitiva, além de outros parlamentares e ministros. Planejada para ampliar parcerias comerciais na Ásia, o objetivo é diversificar as correntes de negócios e tratar a guerra comercial entre os Estados Unidos e a China como uma oportunidade para ampliar as relações comerciais com grandes países asiáticos.
Visita de Estado, Lula teve um encontro reservado com o imperador Naruhito e sua esposa, a imperatriz Masako. Acompanhado da primeira-dama Janja da Silva, o presidente voltará a se reunir com o casal imperial para um jantar. Naruhito, 65 anos, assumiu em 2019 o Trono de Crisântemo, como é conhecido o trono japonês, uma dinastia com mais de 2 mil anos, que remonta a 600 a. C.. Esta será a quinta vez que o presidente brasileiro visita o país.
O Brasil conta com a maior população nipodescendente fora do Japão, estimada em mais de 2 milhões de pessoas, e o Japão abriga a quinta maior comunidade brasileira no exterior, com cerca de 211 mil nacionais. Os dois países mantêm Parceria Estratégica e Global que completa uma década em agosto deste ano. Entretanto, são 130 anos das relações diplomáticas. Foram estabelecidas com a assinatura do Tratado de Amizade, Comércio e Navegação em 1895. O acordo permitiu abertura recíproca de representações diplomáticas em 1897 e abriu caminho para o início da imigração japonesa, em 1908.
O Japão é o nosso mais tradicional parceiro na Ásia e o nono país a investir no Brasil. Um dos objetivos da viagem é a abertura do mercado japonês para o agronegócio brasileiro, especialmente para as carnes bovina e suína in natura. O segundo país a ser visitado por Lula será o Vietnã, um caso bem-sucedido de integração às cadeias globais de valor, ao lado da Indonésia e da Índia.
A comitiva presidencial deve seguir para Hanói, capital vietnamita, na quinta-feira. Estão previstos encontros com o presidente do Vietnã, Luong Cuong, e o primeiro-ministro do país, Pham Minh Chinh. Brasil e Vietnã registraram em 2024 intercâmbio comercial de US$ 7,7 bilhões, com superávit brasileiro de US$ 415 milhões. O Vietnã é o quinto destino global das exportações do agronegócio brasileiro e um dos principais produtores mundiais de café, arroz e produtos eletrônicos.
Lula faz esse périplo pela Ásia com um olho no presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, e outro no líder chinês Xi Jinping, os dois grandes protagonistas da economia mundial. Novas tarifas serão adotadas pelo governo dos Estados Unidos a partir do dia 2 de abril. A política protecionista de Trump é muito agressiva, porque pretende transferir “indústrias críticas” para os Estados Unidos. Uma lista de 15 “países sujos”, com balança comercial deficitária para os Estados Unidos, deve ser anunciada por Trump. Austrália, Canadá, China, União Europeia, Índia, Japão, Coreia do Sul, México, Rússia e Vietnã estão entre eles.
Entretanto, inclusão do Brasil na lista não pode ser atribuída à balança comercial, que é equilibrada. Se ocorrer, será para proteger setores com baixa competitividade da economia norte-americana, como o siderúrgico, por exemplo. Entretanto, há conversas entre o Itamaraty e as autoridades norte-americanas. O presidente em exercício, Geraldo Alckmin, ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio, é o principal interlocutor entre os dois governos nessa questão.
Para Trump, as regras, instituições e alianças da globalização sugaram os EUA. É uma visão completamente oposta à do presidente da China, Xi Jinping. O caso chinês é particularmente interessante porque sua expansão comercial se deu de acordo com a institucionalidade da economia globalizada, nos marcos da Nova Rota da Seda. Apesar de seu atual poder econômico e militar, numa região na qual os Estados Unidos são a força hegemônica desde o fim da Segunda Guerra Mundial, a China optou pela cautela e o “soft power”, apesar da tensão permanente com Taiwan, a ilha rebelde chinesa, e com o próprio Japão, um grande parceiro comercial, em relação às ilhas Sankaku, no Mar da China.
Bilhões de dólares foram investidos em Institutos de Confúcio e programas de ajuda externa em dezenas de países, a China exerce forte atração pelo desenvolvimento econômico e tecnológico impressionantes, por seu urbanismo futurista e a emancipação de milhões de pessoas da pobreza. Entretanto, em três décadas alterou a divisão internacional do trabalho, no qual tinha lugar cativo ao produzir bens de consumo não duráveis e eletrônicos, ao alcançar um patamar econômico e tecnológico no qual compete em quase tudo e com quase todos.
Além da enorme distância cultural e de valores, o nosso maior parceiro comercial, sem o qual o agronegócio brasileiro entraria em colapso, também é o principal concorrente da nossa indústria, nos mercados interno e externo. Os principais compradores das nossas manufaturas são os Estados Unidos e, depois, a Argentina. Entretanto, a parceria com a China pode alavancar os investimentos em infraestrutura, principalmente na logística para o Pacífico. É um trunfo de Lula nas negociações com Trump, porém, aumentar a dependência em relação aos chineses não é uma boa alternativa. É preciso encontrar um novo ponto de equilíbrio.
Uma Homenagem ao “Partido da Democracia”
21 de março de 2025Notícias,Alberto Aggio,democracia,POLÍTICA HOJE,PH-destaque,posição_1Manchete-Home,Mais Notícias,cidadania 23
Nossa democracia veio à luz a partir de um processo de transição negociada
Foi bastante importante, em termos políticos e também históricos, a propositura, montagem e realização do evento de lembrança dos quarenta anos da nossa redemocratização, celebrado no Seminário “40 anos de democracia no Brasil – conquistas, dívidas e desafios”, realizado em 15 de março no “Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves”, em plena Praça dos Três Poderes de Brasília. O evento, promovido pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP) e pelo Cidadania 23, contou com apoio do jornal Correio Braziliense, que produziu uma exposição magnífica de fotos, documentos e objetos significativos. As palestras e debates reuniram políticos, intelectuais, dirigentes e militantes políticos, além do público interessado.
Pelo espírito que guiou o encontro e pelas personalidades que lá discursaram, destacando-se o ex-presidente José Sarney, tratou-se de um evento que, no essencial, homenageou o “partido da democracia” – o “partido” que conduziu a transição, produziu a Constituição de 1988 e a sustenta até os dias que correm. Não se trata de um “partido” com registro no TSE. Refiro-me aqui a uma “invenção política”, melhor dizendo, a uma “convicção política”. Para todos que lá estiveram, o sentimento era de que esse “partido da democracia” lá se expressou desde a ideia que decantou o evento até as últimas palavras pronunciadas naquele espaço. Por outro lado, a contrapelo, a celebração dos 40 anos de democracia no Brasil não foi a produção de mais uma “narrativa”. Diferentemente, o que se fez foi refletir e produzir História in atto, a saber, um “discurso” interpretativo e aberto, mas colado aos fatos históricos.
No contexto desse evento pude apresentar ao público o meu livro A construção da democracia no Brasil, 1985-2025 – mudanças, metamorfoses e transformismos (FAP/Annablume, 2025), cuja intenção maior foi a de elaborar uma interpretação crítica sobre a história política dos últimos 40 anos. Como se sabe, a democracia vem sendo acossada pelo extremismo de direita no mundo e também no Brasil e, por isso, é preciso defendê-la mais do que nunca. Não há melhor forma de defende-la senão por meio de uma releitura da história da sua construção, apontando os momentos cruciais de suas conquistas bem como os pontos essenciais em que os atores que protagonizaram essa trajetória claudicaram no seu desenvolvimento, o que acabou produzindo um conjunto de déficits reconhecidamente problemáticos.
Apesar disso, é preciso registrar, antes de mais nada, que além da Constituição de 1988, os 40 anos de democracia legaram à sociedade a criação do Sistema Único de Saúde (SUS), consagrando o direito à saúde como sendo de todos e não um privilégio. Com o Plano Real, recuperou-se o valor da moeda e selou-se o fim da hiperinflação, iniciando-se um processo de redução da pobreza que viria a ser aprofundado em seguida. Nessa jornada, houve reconhecidamente uma ampliação do acesso à educação a segmentos sociais antes excluídos. Em síntese, a democracia está sendo, para milhões de brasileiros, um fator civilizador capaz de efetivamente melhorar a vida.
Mesmo assim, nem todos os atores políticos, dentre os mais significativos, compartilham a mesma visão a respeito dos passos positivos que foram dados para que pudéssemos construir a democracia nos últimos 40 anos. É difícil obter um consenso interpretativo a respeito da necessidade histórica desses passos bem como do seu significado e mais difícil ainda obter consensos a respeito da validade das etapas percorridas. Por isso somos tão divididos e incapazes, no mais das vezes, de enfrentar e vencer os mais poderosos desafios que se apresentam.
A começar pelo processo de transição do autoritarismo para a democracia. Nossa democracia não nasceu de uma revolução. Nossa democracia veio à luz a partir de um processo de transição negociada, como foi na Espanha, depois da morte de Franco, ou no Chile, depois da derrota de Pinochet no plebiscito de 1988. São exemplos de democracias que nasceram de transições negociadas com a institucionalidade ou com segmentos do regime anterior. Foram necessárias operações políticas complexas para se extrair resultados positivos dessas negociações. Por isso, algumas forças políticas, à esquerda e à direita, não compreenderam a transição e se colocaram contra ela. Contudo, é preciso que se afirme que a transição brasileira foi negociada, mas também foi uma transição com um apoio popular. Como escreveu a economista Maria Conceição Tavares, asseverando, no calor da hora, que o Brasil daqueles anos não era mais o Porto Seguro das elites e nem a Estação Finlândia dos revolucionários.
Como afirmou, no evento, o ex-deputado constituinte, Miro Teixeira, “não foi fácil chegar até onde estamos”, reconhecendo que a nossa transição foi heroica, popular e, sobretudo, empenhou-se em isolar e conter os extremistas e os extremismos. É, portanto, falsa a avaliação de que se tratou de uma transição conservadora. É hora de a intelectualidade compromissada com a democracia rever essa visão enganadora e equivocada que maltrata a história – nos dois sentidos, pode-se enfatizar.
Hoje, mais do que uma crise da democracia, o que se observa é uma crise do sujeito político portador do moderno, que sempre carregou consigo a proposição que conectava liberdade, democracia e autonomia com vistas a uma sociedade mais justa, próspera e igualitária. Na hora presente, é preciso convocar os democratas a construírmos os desenhos que possam informar um novo horizonte democrático, isto é, uma nova cultura política, democrática e interdependente, que se afirme no Brasil e se expanda pelo mundo.
Para isso, precisamos de estadistas à altura dos desafios do nosso tempo. Infelizmente, como bem observou o jornalista José Casado em seu artigo intitulado “O ‘pobrismo’ se tornou matéria-prima eleitoral básica”, publicado na edição de 15 de março de 2025, Lula e o PT “parecem não ter compreendido a dimensão da mudança ocorrida sob seus pés nos últimos quarenta anos”, cujo processo ultrapassou “a representação política baseada no critério de classes”. As metamorfoses dos atores democráticos que o país vivenciou no contexto de uma globalização triunfante, na passagem do século XX para o XXI, dentre eles Lula e o PT, ensejaram a possibilidade de um transformismo positivo. Naquele contexto, como escrevi no livro e que Casado reproduz, “foi possível vociferar diante de tudo, de todos e das mais difíceis circunstâncias que o projeto político (de Lula e do PT) era, como dizia o ex-deputado petista José Dirceu, ‘governar no Brasil’. Pois era, enfim, simplesmente isso e não construir uma sociedade democrática, justa, solidária, mesmo que não se conseguisse alcançar o poder. Agora, tudo indica que não será mais possível, pelo menos na forma como se pensava”.
No andamento do terceiro mandato, continua Casado – ainda citando literalmente o meu livro –, as identidades se esfumaçaram “num ambiente onde partidos e seus líderes substituíram projetos de modernização nacional pela visão tosca da política como negócio, com prioridade às transações nem sempre transparentes, mas convergentes à garantia de poder numa “partidocracia” patrimonialista e endinheirada”.
Em absoluta contradição com o momento inicial da construção democrática, a sensação que temos hoje é de degradação política pelo vazio de hegemonia, derivando no estabelecimento de um transformismo negativo, no qual a política significa apenas negócio. Para concluir, como anotei no final de um dos capítulos do livro, “trata-se de um transformismo que poderá bloquear a democracia e seus possíveis avanços. Seria desastroso para o país cumprir esses 40 anos de construção democrática sem reconhecer uma ameaça dessa magnitude”.
*Artigo publicado originalmente no portal Revista Será
Desafios da Democracia: Igualdade de gênero, justiça social e luta contra retrocessos
17 de março de 2025Notícias,EVENTOS FAP,Fundação Astrojildo Pereira,EF-destaque,posição_1,Manchete-HomeMais Notícias,cidadania 23,Democracia 40 anos,Vera Lúcia Santana Araújo
Vera Lúcia exige reformas partidárias para reverter desigualdades de gênero e fortalecer a proteção do Estado Democrático de Direito
A ministra Vera Lúcia Santana Araújo, do TSE, destacou que a democracia passa também pelo enfrentamento da luta pela igualdade de gênero e respeito às etnias. “Uma democracia que ainda se arrasta, que segue com atropelos, abalos e ameaças”, disse. Segundo ela, é necessário analisar o papel dos partidos políticos, no cenário atual, diante dos problemas e desafios postos. Para a ministra, a violência contra mulher gera uma dívida do Estado em relação a todo país por causa dos dados apresentados que são muito elevados.
Vera Lúcia cobrou dos partidos políticos as mudanças necessárias para reverter a discrepância entre homens e mulheres no país. “O mesmo Congresso que ao mesmo tempo legisla a favor das mulheres, esse mesmo descumpre da lei que foi feita por ele”, criticou. “A sub-representação de mulheres e negros nos coloca em uma situação [bastante ruim].”
De acordo com a ministra, a despeito das conquistas já realizadas, ainda há muito o que fazer. Ela ressaltou que o momento atual é de “ofensa” do Estado Democrático de Direito. “Se vivermos um retrocesso constitucional, será um fracasso para a nossa geração”, reagiu. “A gente não pode viver na dependência de um julgado do Supremo Tribunal Federal e da decisão do Tribunal Superior Eleitoral”, ressaltou. Para ela, é muito grave haver no Brasil grupos em defesa do retorno da ditadura.
Forte emoção
Na sua defesa pela democracia, a diretora-executiva Fundação Astrojildo Pereira, Elza Pereira Correia, lembrou que é filha de pais comunistas, que sempre defenderam as liberdades. Emocionada, ela reiterou que muitos no Brasil perderam a vida, foram torturados e mortos para garantir um país verdadeiramente democrático. “Viva a democracia brasileira”, afirmou.
Para o ex-governador do Distrito Federal Cristovam Buarque, há alguns desafios bastante pontuais no Brasil na preservação da democracia. Na opinião, dele o sistema democrático passa pelo combate à fome, à redução da desigualdade social, da ampliação do atendimento da saúde, a rediscussão do papel e das atribuições dos militares, além da necessidade de estabelecer uma consciência ecológica. “A democracia existe para funcionar dentro das nações”, disse. “Mas acabou o tempo em que cada país decida o que é democracia. O mundo está globalizado.”
Segundo Cristovam, há uma “crise estrutural” causada pela nova percepção de mundo provocada pela rapidez do tempo e da globalização. Ele reitera que um dos desafios mais profundos do planeta está nos “imigrantes sociais”, os estrangeiros rejeitados por todos. De acordo com o ex-governador, as autoridades não sabem como lidar com esses desafios, por exemplo. “Mas temos de comemorar o que já conquistamos. Não vamos encontrar a solução rapidamente.”
Recuperando-se da gripe Influenza nos Estados Unidos, o cientista político e historiador Mark Lilla participou remotamente do Seminário. Ele reiterou que, apesar das dificuldades, o sistema democrático ainda é o melhor.
“A democracia como qualquer outra ordem política tem vantagens e desvantagens, mas sabemos que as alternativas são muito piores. Nos Estados Unidos, nós temos muito a aprender com o Brasil e entendemos o quão rápido a democracia pode acabar”, observou o norte-americano. Segundo ele, o governo Donald Trump trouxe à tona a discussão sobre os imigrantes ilegais e o controle das universidades. Temas que têm relação direta com a interferência no sistema democrática.













































































































