Governo Lula: FAP realiza webinar sobre rumos da economia
25 de abril de 2023EVENTOS FAP,Economia,debate,EF-destaque,Lula [Luiz Inácio Lula da Silva],webinarManchete-Home,Mais Notícias,FAP,Notícias
Comunicação FAP
A Fundação Astrojildo Pereira (FAP) realizará, nesta quarta-feira (26/4), a partir das 19 horas, webinar sobre os rumos do governo Lula na economia. O evento online será transmitido em tempo real, no site e nas redes sociais (Youtube e Facebook) da entidade, para todas as pessoas interessadas.
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Nova obra destaca propostas para desenvolvimento com inclusão social
Participam do debate o economista Benito Salomão, conselheiro da FAP e doutor em economia pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU), e a ex-presidente do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) Vanessa Petrelli, que também foi secretária municipal de Agricultura e Abastecimento de Uberlândia. Os dois são professores de economia e relações internacionais na UFU.
Otaviano Canuto, professor na Elliott School of International Affairs da George Washington University, também está confirmado para o debate. Ele ainda é professor afiliado na Universidade Politécnica Mohamed VI e do Center for Macroeconomics and Development em Washington.
A mediação é de Cezar Rogelio Vasquez, engenheiro de Produção pela UFRJ, mestre em Engenharia de Produção pela Coppe/UFRJ e membro do Conselho Curador da FAP.
Estadão | Pesquisadores lançam propostas para retomada do desenvolvimento com inclusão social
Correio Braziliense | Livro debate desenvolvimento em várias frentes técnicas e ideológicas
Saiu na Veja | Rede descoberta
25 de abril de 2023livro,Temas & Debates,Revista Vejareportagem,Parceiros FAP,posição_1,Manchete-Home,Mais Notícias,FAP,Notícias
Por José Casado, publicado na revista Veja
“Eu sou Victor Muller Ferreira, nasci o 04 de abril de 1989 no Riode-Janeiro, em Niteroi” — dizia o documento encontrado num dos dispositivos eletrônicos apreendidos com o passageiro deportado da Holanda para o Brasil, em março do ano passado.
Descontados os erros na escrita, não sobrava uma única verdade nas dezesseis palavras iniciais de um roteiro tosco sobre um homem que nunca existiu, mas morou em Niterói, Brasília, São Paulo e Baltimore (EUA) nos últimos onze anos.
Victor era Sergey na vida real. Jamais foi Muller Ferreira, como identificado no passaporte brasileiro. Erab Vladimirovich Cherkasov, informavam certidões russas. Nascera trinta e sete anos atrás em Kaliningrado, antiga Königsberg do filósofo Immanuel Kant. É um enclave do tamanho do Recife, entre a Polônia e a Lituânia, base naval da Rússia no Mar Báltico.
Detido no aeroporto de Guarulhos por identidade falsa, Cherkasov está preso em Brasília. Semana passada começou a ser processado nos Estados Unidos como agente de espionagem do Estado-Maior das Forças Armadas da Rússia. Ele nega. O governo de Vladimir Putin pediu sua extradição, qualificando-o como um mafioso moscovita.
Cherkasov é caso exemplar das dificuldades dos espiões do século XXI para criar histórias de vida coerentes no mundo digital e burlar sistemas de vigilância biométrica nas fronteiras.
Já era complicado na Europa de oito décadas atrás, quando Leopold Trepper vestiu a pele do industrial canadense Adam Milker e começou a montar a Orquestra Vermelha, a maior rede de espionagem soviética durante a II Guerra Mundial.
No fim de 1939, conta Trepper no livro O Grande Jogo (Fundação Astrojildo Pereira), chegaram à Bélgica quatro agentes russos que deveria infiltrar nos Estados Unidos. Todos estavam com passaportes uruguaios, confeccionados num birô moscovita de falsificações — a “sapataria”, no jargão da época. Para entrar nos Estados Unidos como cidadãos sul-americanos, precisavam de endosso do consulado de seu país em Bruxelas. O problema era que, dos quatro “uruguaios”, só um falava espanhol e sabia alguma coisa sobre o Uruguai.
Falhas em Moscou expõem espiões no Brasil, na Argentina e na Europa
A Orquestra Vermelha tornou-se lenda da espionagem soviética pelos êxitos. Um deles foi no outono de 1941, quando Hitler reuniu seus generais para decidir a ofensiva contra Moscou. Não levou muito tempo para o Kremlin conhecer, em detalhes, a opção pelo cerco à capital soviética — o estenógrafo do Estado-Maior da Wehrmacht na reunião era um dos “músicos” de Trepper.
Nas sombras da guerra de Putin na Ucrânia, os serviços secretos da Rússia agora parecem sitiados por falhas de informação e de segurança. Desde a invasão, dezenas de agentes russos mantidos sob cobertura diplomática foram expulsos por governos europeus. Estão perdendo, também, agentes treinados e custeados na vida encoberta no exterior.
Nos últimos doze meses foram descobertos três deles com identidades e residências no Brasil e dois na Argentina. As ações antiespionagem foram públicas, com indícios de coordenação entre treze governos.
Sergey Cherkasov foi identificado como oficial da inteligência militar russa e barrado na Holanda, em março do ano passado, depois de uma temporada na Universidade Johns Hopkins (EUA), onde viabilizara seu grande jogo: um estágio no Tribunal Penal de Haia, que investigava crimes de guerra na Ucrânia.
Deportado e preso em São Paulo, foi mapeado até nos locais onde escondia arquivos eletrônicos para coleta por outros agentes. Um deles numa ruína no mato, no quilômetro 34 da Rodovia Raposo Tavares, em Cotia (SP).
Na época da prisão de Cherkasov, a Grécia identificou a agente russa Irina Alexandrovna Smireva. Ela é casada com outro agente que vivia no Brasil na pele do empresário carioca Gerhard Daniel Campos Wittich.
Seis meses depois, em outubro, a Noruega prendeu o coronel russo Mikhail Valeriyevich Mikushin, o José Assis Giammaria no passaporte brasileiro, infiltrado num grupo de pesquisas no Ártico. Às vésperas do Natal, a Eslovênia deteve um casal de espiões, com passaportes argentinos em nome de María Rosa Mayer Muñoz e Ludwig Gisch.
Essa inusitada fragilidade na rede de agentes de Moscou com vidas falsas construídas no Brasil e na Argentina foi tema do vice-diretor da CIA, David Cohen, em visita aos governos do Mercosul na semana passada.
Fonte: Artigo publicado na Veja.
Aniversário de Brasília: Cineclube Vladimir Carvalho exibe filme O Céu Perdeu a Cor
18 de abril de 2023BIBLIOTECA SALOMÃO MALINA,SM-destaque,Biblioteca_destaques,posição_1,Manchete-Home,Mais Notícias,FAP,Notícias
Comunicação FAP
Às vésperas do aniversário de 63 anos de Brasília, a Biblioteca Salomão Malina exibirá, nesta quarta-feira (19/4), a partir das 15 horas, no Cineclube Vladimir Carvalho, o longa-metragem O Céu Perdeu a Cor, dirigido pelo cineasta Gustavo Serrate, com roteiro de Rodrigo Huagha. A entrada é franca. O espaço fica no Conic, na região centro da capital federal.
Com duração de 72 minutos e exibido em preto e branco, o longa conta com uma narrativa fragmentada por lapsos de tempo. O filme, um drama com classificação indicativa para pessoas a partir de 10 anos de idade, é resultado de um projeto independente realizado em Brasília e finalizado no período da pandemia.
O longa tem como personagem principal a cidade de Brasília e conta a história de quatro personagens todos quebrados pela vida. Um homem negro, ex-trompetista cansado da vida, já não consegue mais trabalhar e está a ponto de desistir. Pablo, enfrenta a perda de um amor. Nadja retorna à cidade depois de uma longa ausência sem dar notícias a seus conhecidos. E Clarice, uma dançarina que busca uma maneira de incorporar os movimentos da epilepsia em sua dança.
Biblioteca Salomão Malina realizará workshop sobre poesia haicai
13 de abril de 2023Biblioteca_destaques,Manchete-Home,Mais Notícias,FAP,Notícias
Comunicação FAP
A Biblioteca Salomão Malina, mantida pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), realizará na segunda-feira (17/4), a partir das 19 horas, um worshop on-line sobre poesia hacai, a ser ministrado pelo professor argentino Javier Valado. O evento será realizado na mesma data em que o gênero literário é celebrado no Japão. Interessados poderão realizar as inscrições, gratuitamente. Haverá emissão de certificado para os participantes.
Para realizar as inscrições, as pessoas devem acessar o link do Google Forms disponibilizado pela biblioteca. O Workshop será realizado por meio da sala virtual do Zoom. O link de acesso ao evento será enviado para o WhatsApp ou e-mail cadastrado de cada inscrito. Mais informações podem ser obtidas diretamente pelo canal de comunicação oficial da biblioteca, pelo número: 61 98401-5561
De acordo com a organização do evento, o objetivo do workshop é incentivar a escrita criativa e instigar a leitura por meio do gênero de poesia haicai. Os participantes irão aprender sobre a origem da poesia no século XVII, sua estrutura gramatical tradicional (Aware, Kigo e Kireji) e sua relação com a natureza, a espiritualidade e o cotidiano. Também será discutido o haicai no Brasil e suas diversas estéticas e identidades poéticas.
O que é haicai
O haicai é uma poesia originada no Japão no século XVII (1600) e que está conformada por 17 sílabas, organizadas em seus 3 versos de 5, 7 e 5 sílabas, respectivamente. A métrica das 17 sílabas não determina o que é um haicai, e, sim, que a musicalidade, a percepção, a admiração e a reflexão sejam suas bases poéticas.
Também é um gênero conhecido por ser uma prática e uma brincadeira poética a partir da qual as pessoas podem expressar e compartilhar sentimentos frutos das vivências cotidianas.
Professor convidado
Javier Valado é argentino, professor de espanhol, residente no Brasil desde 2013. No ano seguinte, começou a escrever haicais. Em 2019, mudou-se para o Distrito Federal.
Desde 2020, Valado ministra aulas, oficinas e cursos de haicai em parceria com escolas, bibliotecas, ONGs e espaços de cultura de Sobradinho e do Distrito Federal.
Revista online | Editorial: O problema e suas raízes
13 de abril de 2023democracia,Jair Bolsonaro,Revista OnlinePOLÍTICA DEMOCRÁTICA DESTAQUE,revista online,posição_1,Manchete-Home,Mais Notícias,RPD MARÇO 2023,FAP,Notícias
Editorial da revista Política Democrática online (53ª edição)
Assistimos todos, neste fim de março, ao retorno ao Brasil do candidato derrotado nas eleições presidenciais de 2022. Foram quase três meses de ausência, passados na Flórida, estado norte-americano governado pelos Republicanos, que vem se constituindo em refúgio de próceres da extrema direita latino-americana.
O desembarque, projetado para ser um ato político expressivo em seu apoio, reuniu poucos partidários, frustrados pelas medidas de segurança tomadas pelas autoridades, que, ao proteger o viajante, impediram, simultaneamente, qualquer manifestação política dos presentes. Não houve discursos nem carreatas, apenas a dispersão dos presentes.
O evento foi, contudo, revelador da estratégia adotada pelo comando político da direita autoritária, após sua derrota nas urnas. Manifestações, marchas, motociatas e carreatas serão organizadas, o contraponto presencial necessário aos comandos de agitação permanente, lançados nas redes sociais. O propósito desses chamados, nas redes e nas ruas, é manter aceso o ânimo dos correligionários e simpatizantes, o apoio a seu líder e sua hostilidade profunda ao conjunto de inimigos imaginários que alimentam a adesão ao movimento: globalistas, comunistas, ambientalistas, ideologia de gênero, entre outros. Além de, claro, prosseguir nesse rumo até as eleições de 2024, momento em que um bom resultado eleitoral, ao menos similar ao conseguido nas eleições legislativas do ano passado, é esperado.
O chamado às ruas dificilmente terá respostas positivas, dado que as mobilizações presenciais chamadas pela extrema direita deveram, como sabemos agora, muito do seu sucesso relativo ao investimento pesado de recursos públicos. No entanto, trazer periodicamente um punhado de militantes às ruas pode ser o contraponto suficiente para a agitação permanente divulgada nos diversos grupos de partidários organizados nas redes sociais.
A estratégia pode ter sucesso, se considerarmos principalmente o percentual de eleitores convencidos pelas notícias falsas despejadas todos os dias, ao longo de mais de quatro anos, nas redes sociais. Pesquisa recente revelou, por exemplo, que quase metade dos eleitores considera a transformação do Brasil num país comunista uma possibilidade real, ao longo do atual governo.
Compete aos democratas de todos os matizes, socialistas, social-democratas, liberais e conservadores, trabalhar, de forma coordenada e permanente, contra a situação de desinformação que assola hoje parte importante do eleitorado. Repetir os argumentos em favor da ciência e da democracia, contra as teorias da conspiração, os diversos negacionismos, as soluções violentas e autoritárias de problemas políticos.
Dizer, sempre, que não há maquinações globalistas, mas problemas globais; que nas democracias a definição dos culpados de corrupção é monopólio da Justiça; que a mudança climática já é uma ameaça que pesa sobre todos; que não existe um perigo comunista que nos aflige; que ideologia de gênero é o nome de um fantasma criado há pouco tempo para assustar os cidadãos; que pobreza, desigualdade e exclusão social são os verdadeiros problemas deste país, cuja solução é premente e indispensável para todos nós; finalmente que racismo, sexismo e homofobia são também problemas reais, responsáveis por uma extensa gama de violências praticadas contra seus alvos, violências que chegam, em muitos casos, à morte das vítimas.
Esse é o debate de fundo, que deve ser travado por todos os democratas contra os temores que alimentam a adesão à extrema direita no país.
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Revista online | Clássicos da ficção científica, meio século depois, remetem a dilemas do nosso tempo
4 de abril de 2023filme,Revista Online,fap. fundacao astrojildo pereiraPOLÍTICA DEMOCRÁTICA DESTAQUE,revista online,posição_1,Manchete-Home,Mais Notícias,RPD MARÇO 2023,FAP,Notícias
Henrique Brandão*, jornalista, especial para a revista Política Democrática online (53ª edição)
Dois filmes emblemáticos de ficção científica completam este ano 55 anos de suas estreias no cinema e são referências até hoje, não apenas para os admiradores de sci-fi – uma enorme legião de aficionados! – mas para os amantes de cinema, em geral. Estou me referindo a 2001 – Uma Odisseia no Espaço, de Stanley Kubrick (1928-1999), e Planeta dos Macacos, de Franklin J. Schaffner (1920-1989), ambos lançados em 1968.
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Depois deles, o gênero foi elevado a outros parâmetros. Cada qual à sua maneira, tornaram-se modelos, que hoje em dia rendem fortunas em bilheterias.
Para além das questões técnicas e inovações que trouxeram, uma característica que faz esses filmes serem lembrados é, acima de tudo, as histórias que contam e as questões, atualíssimas, que levantam quanto ao futuro da humanidade.
À primeira vista, pelo enredo que apresenta, O Planeta dos Macacos aparenta ser uma bobagem: um grupo de astronautas aterrissa em um planeta que é dominado por símios e no qual os humanos são tratados e caçados como animais.
Mas o filme, adaptação do livro do escritor francês Pierre Boulle (1912-1994), marcou época, graças ao roteiro inventivo, à competente direção de Schaffner, à ótima atuação dos atores e à uma maquiagem excepcional, que levou um prêmio especial na premiação do Oscar – a categoria não existia até então. A produção custou U$$ 5,8 milhões, e a bilheteria americana rendeu US$ 32,5 milhões. O sucesso foi tamanho que gerou continuações, séries e rebbot que se desdobram até os dias atuais.
2001 – Uma Odisseia no Espaço teve sua estreia em dois de abril de 1968. O roteiro, livremente inspirado no conto A Sentinela (The Sentinel), de Artur C. Clarke (1917-2008), foi escrito a quatro mãos por Kubrick, já considerado um dos melhores cineastas de sua geração, e Clarke, considerado um dos maiores escritores de ficção científica de todos os tempos.
A reunião dessas duas figuras gerou uma das obras mais idolatradas da história do cinema. Reza a lenda que Clarke não gostou do que viu na première. Alegou que o filme tinha poucos diálogos. A versão que chegou às salas de cinema (149 minutos) tem menos 19 minutos do que a vista por Clarke, em razão de cortes feitos pelo próprio Kubrick.
De fato, 2001 é carregado de “calmarias”. Os primeiros 25 minutos e os últimos 23 não têm diálogos, só trilha sonora. Contando esses momentos de mudez e outros que acontecem ao longo do filme, o total é de 88 minutos sem conversas. Sobram 61 para os diálogos, grande parte deles travada no embate entre o Hall 9000, uma máquina de Inteligência Artificial (IA) de última geração, com sua fala monocórdia, e o comandante da espaçonave Discovery One. Passado mais de meio século da estreia da fita, o uso cada vez maior da IA no cotidiano humano gera indagações importantes, como a feita pelo historiador Yuval Noah Harari em artigo publicado em O Globo (28/03): Precisamos aprender a dominar a inteligência artificial antes que ela nos domine.
2001 está carregado de cenas de grande beleza visual. A sequência inicial, em que o hominídeo descobre que o osso de um animal pode servir de arma para subjugar outros grupos rivais na pré-história e, para comemorar o fato, lança o osso para cima, virou um dos momentos mais sublimes do cinema. O osso sai girando no ar, em câmera lenta, ao som de Assim Falou Zaratrusta, de Richard Strauss (1864-1949). Em seguida, há um corte para o ano de 2001, com satélites a “navegar” o espaço sideral, ao som da valsa Danúbio Azul. Só música, a destacar a ligação do homem pré-histórico com o astronauta do futuro.
Kubrick não viu problema nesses “silêncios”. Suas produções anteriores tinham diálogos e narrações em off. Mas este foi intencionalmente quieto. Para ele, o importante era proporcionar uma experiência intensamente subjetiva. "Se o filme conseguir atingir pessoas que nunca pararam para pensar no destino do Homem, terá tido sucesso", afirmou à época.
O Planeta dos Macacos vai em outra linha. Ao despertar de uma hibernação induzida, o comandante Taylor – interpretado por Charles Heston – descobre que está no ano de 3971, dois milênios à frente de seu tempo.
A princípio, estaria em um planeta desconhecido. Aos poucos, constata-se que os animais deste planeta são humanos que não falam e são “domesticados” e caçados por macacos. Aparentemente, a evolução se inverteu: agora os macacos é que são a espécie dominante, inteligentes, enquanto os humanos são “animais” irracionais.
Ao descobrir que os visitantes vindos do espaço falam, os chimpanzés, cientistas, se interessam em pesquisar sua história, desconfiados de que os macacos evoluíram dos humanos. No entanto, são impedidos pelo chefe político e líder de uma seita religiosa, um orangotango que tem uma versão diferente para o surgimento dos símios. Os militares, gorilas, têm uma aliança com o religioso e mantêm a ordem e os humanos sobre o poder das armas. Alguma semelhança com o mundo atual?
A cena icônica de O Planeta dos Macacos é o seu fim. Após tanto tempo da estreia, não há problema de spoiler. Fugindo dos gorilas, o personagem de Heston se depara com a Estátua da Liberdade em uma praia deserta e árida, devorada pelo tempo, semicoberta. Mensagem clara: o homem destruiu a Terra. Provavelmente em uma guerra nuclear, já que a Guerra Fria era um dos maiores temores da época em que o filme foi realizado.
No entanto, o recado serve também de sinal para o perigo da devastação dos nossos recursos naturais, que pode condenar a humanidade a um futuro no qual o deserto e as chuvas torrenciais predominem. Estão aí as mudanças climáticas batendo às portas.
Dois grandes filmes, com mensagens que ainda nos fazem refletir sobre qual modelo de civilização queremos.
Sobre o autor
*Henrique Brandão é jornalista e escritor
** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de março de 2023 (53ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da revista nem da FAP.
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29 de março de 2023filme,fundação astrojildopereira,Revista Onlinerevista online,posição_1,Manchete-Home,Mais Notícias,RPD MARÇO 2023,FAP,Notícias
Lilia Lustosa*, crítica de cinema, especial para a revista Política Democrática online (53ª edição: março de 2023)
Um dos filmes que mais me chamou a atenção nesta temporada de premiações foi o Entre Mulheres (2022), da canadense Sarah Polley, que também assina o roteiro, premiado neste último Oscar na categoria Melhor Roteiro Adaptado.
O longa-metragem, quarto da carreira da diretora, foi produzido pela grande Frances McDormand, que também atua no filme (com uma parte pequena), e toca em temas universais e superatuais, embora vividos em um mundo que parece tão distante no espaço e no tempo. Violência contra a mulher, patriarcado, religião, cegueira, culpa, perdão… está tudo ali na tela. Uma história baseada no livro homônimo da também canadense Miriam Toews, publicado em 2018, que foi, por sua vez, inspirado em fatos reais. Acredite se quiser!
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Na trama, vemos um grupo de mulheres que mora em uma colônia (não identificada no filme, mas que é inspirada na Colônia menonita Manitoba, na Bolívia) que segue dogmas religiosos bastante ortodoxos. Uma sociedade patriarcal, em que as mulheres não frequentam a escola, não aprendem a ler e não são autorizadas a sair das áreas “protegidas”. Coisa que quase todas aceitam “pacificamente”, já que é Deus quem está no comando. Prisioneiras do século 21, guiadas pela fé e pela covardia dos homens.
Acontece que todas as mulheres dali, incluindo crianças e idosas, são vítimas frequentes de atos de violência sexual, sendo, para isso, dopadas com químicos usados na agricultura. As consequências macabras de despertarem com hematomas, sêmen ou sangue no corpo são, em um primeiro momento, atribuídas a seres demoníacos, vindos de outra dimensão e, portanto, impossíveis de ser combatidos. Até o dia em que duas adolescentes revelam ter visto um homem da própria Colônia fugindo na mesma noite em que uma criança fora violentada. Os suspeitos são levados à delegacia.
Diante das evidências e da ausência dos homens, que correm em defesa dos acusados, oito mulheres - brilhantemente interpretadas por Rooney Mara, Claire Foy, Jessie Buckley, Sheila McCarthy, Judith Ivay, entre outras - aproveitam para pensar em alternativas para a situação: 1) perdoar; 2) ficar e brigar; ou 3) fugir. As discussões são devidamente registradas em ata pelo professor dos meninos da Colônia, o sensível August (Ben Wishaw), cuja mãe havia sido excomungada por haver questionado as regras ali estabelecidas. O objetivo de todo esse “falatório" e de seu respectivo registro é ter insumos suficientes para exercer a democracia e fazer valer suas vozes, mesmo que para isso tenham que recorrer a desenhos e/ou símbolos na hora da votação.
Com essa premissa, o filme se desenvolve em torno de muitos diálogos e reflexões (brilhantes, por sinal), muitas trocas de olhares e muitas expressões faciais e gestuais que não escapam à câmara atenta de Luc Montpellier. Aliás, a fotografia é outro ponto forte do filme, belíssima, com o predomínio de cores dessaturadas, frias, escuras, que refletem com maestria a ausência de alegria que parece ditar as regras da vida daquela gente. O formato widescreen (ou panorâmico) ajuda a expor a solidão e o isolamento daquelas mulheres que nunca viram um mapa em suas vidas. Ao mesmo tempo, os planos super abertos do campo contrastam fortemente com o ambiente claustrofóbico do celeiro que lhes serve de congresso para as discussões e votações.
A trilha, assinada pela islandesa Hildur Guonadóttir, também merece destaque, já que alterna momentos sombrios com outros bem iluminados, representando com precisão a esperança daquelas mulheres ali enquadradas.
Entre Mulheres é um filme sobre o valor do diálogo e da democracia, sobre a coragem de enfrentar algozes em nome da liberdade, sobre a união como arma para lutar por uma causa maior, sobre educação de meninos e sobre tantos outros temas de plena relevância em tempos atuais. Lições aparentemente banais para nós, que vivemos em uma democracia e que desconhecemos a vida em cativeiro, mas de extremo valor para aqueles que, tão perto de nós, ainda têm de conviver com a ignorância das sociedades ditatoriais.
Entre Mulheres é também uma história sobre aquele sonho de justiça que insiste em morar em cada um de nós. Sonhos que podem parecer utopias descabidas, fantasias femininas ou até histerias, mas que se colocados em prática têm grandes chances de virar realidade. Sabiamente e, com um certo toque de ironia (já que na vida real as coisas não aconteceram bem assim…), Sarah Polley decidiu abrir seu longa com a frase: "Esta história é fruto da fértil imaginação feminina”. Que assim seja!
Sobre a autora
*Lilia Lustosa é crítica de cinema e doutora em História e Estética do Cinema pela Universidad de Lausanne (UNIL), Suíça.
** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online de março de 2023 (53ª edição), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da revista nem da FAP.
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Revista online | A longa jornada de um partido em busca da democracia
21 de março de 2023publicações,Revista Online,POLÍTICA DEMOCRÁTICA DESTAQUE,revista onlinecarlos marchi,posição_1,Manchete-Home,Mais Notícias,pcb 100 anos,RPD MARÇO 2023,FAP,Notícias
* Daniel Costa, historiador e pesquisador, especial para a revista Política Democrática online (53ª edição: março de 2023)
No apagar de 2022, entre o alívio do encerramento de mais uma página triste de nossa história e a esperança trazida pelos ventos do novo ano, a Fundação Astrojildo Pereira (FAP) ofereceu nova contribuição para a compreensão dos nem sempre claros meandros da nossa política. Com o lançamento de Longa Jornada até a Democracia, obra do jornalista Carlos Marchi, o leitor terá a oportunidade de acompanhar o tortuoso caminho do PCB em busca de uma sociedade igualitária e democrática.
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100 anos do PCB: evento resgata memória e aponta desafios em Niterói (RJ)
O volume cobre parte da trajetória do partido, que acabou de completar 100 anos de existência. Partindo do momento anterior à fundação, Marchi traz o caldo político predominante nos círculos operários, onde o discurso e a prática política eram marcados pelo amálgama entre o anarquismo e o marxismo. Sua narrativa é encerrada em 1968, momento em que a ditadura civil militar edita o AI-5. A esquerda mundial é tomada pelos ventos do maio francês, e o PCB luta para consolidar a política definida em seu VI Congresso.
Realizado de forma clandestina, o encontro iria reafirmar as diretrizes da Declaração de 1958 e sua linha de atuação em torno da construção de uma oposição democrática. No momento em que grupos adotaram a estratégia da luta armada, o PCB optou pela luta dentro da institucionalidade, medida que fora muito criticada, porém, o tempo mostraria quem tomou a melhor decisão. O segundo volume dessa história, escrito pelo jornalista Eumano Silva, abordará a trajetória do partido do pós 1968 até sua transformação no Cidadania 23 e tem previsão de lançamento ainda para 2023.
O historiador Paul Ricoeur, em uma de suas obras, lembra que a memória é uma construção. Já para o também historiador Jacques Le Goff, assim como a memória, o esquecimento surge enquanto momento significativo da narrativa histórica, pois seria baliza de grande relevância no estabelecimento e consolidação de hierarquias entre grupos e indivíduos. Abro esse parêntese para trazer ao leitor que o centenário do partido vem sendo contado por diversos atores, desde intelectuais vinculados ao PCdoB (partido fundado em 1962), ao PCB (fundado em 1994) e ao Cidadania 23 (o legítimo portador do legado do partido fundado em 1922).
A seguir, veja fotos de lançamento do livro:
O livro de Marchi insere-se nesse terceiro grupo, porém, como lembra o sociólogo Caetano Araújo, a perspectiva do autor é interna ao partido, fato que contribui para a construção de uma narrativa factual que consegue apontar os erros e acertos, fugindo de uma construção hagiográfica. Para o historiador Vinicius Muller, "um dos embates mais interessantes entre os que tentam reconstruir a História é aquele que opõe os que a entendem como ruptura aos que a entendem por ajustes".
Assim, a narrativa de Marchi acerta ao compreender as diversas viradas táticas e programáticas do PCB, enquanto ajustes dentro do processo de busca pela democracia. Ainda para Araújo, que assina a orelha da publicação, "visivelmente, o autor adotou no seu trabalho a diretriz de Salomão Malina, apresentada como epígrafe: afirmar a história do partido em sua inteireza, com seus acertos e equívocos. Só assim é possível resgatar o sentido dessa história, para os militantes do passado e do presente".
No momento em que as redes sociais são povoadas de teses conspiratórias e fake news acerca da esquerda e mesmo da democracia, o livro de Marchi desmistifica fatos e personagens da história do PCB. Além de mostrar ampla bibliografia, que não fica devendo aos melhores trabalhos produzidos na universidade, o autor recorre a reconhecidos arquivos e a entrevistas com personagens relevantes na história do partido.
Outro mérito da obra é a análise do papel desempenhado por Luiz Carlos Prestes desde sua incorporação ao partido, ainda no começo da década de 1930. A adesão do líder da mítica Coluna foi o fermento para a tentativa de insurreição ocorrida em 1935. Marchi classifica o evento como "o mais trágico de todos os erros e de todas as quedas do Partido". A atuação política de Prestes, com seus erros e acertos, foi fundamental para a consolidação do PCB enquanto ator político de relevância no país.
Algo comum entre historiadores é o fato de criticar obras de cunho histórico escritas por jornalistas. Algumas merecem tais observações, pois carecem de fontes, embasamento bibliográfico e, às vezes, até distorcem os acontecimentos em nome de uma suposta simplificação e maior "acessibilidade" ao leitor. No entanto, o volume escrito por Marchi encontra-se distante de tais defeitos, já que sua mais recente obra, desde o lançamento, pode figurar com tranquilidade na bibliografia de futuros estudos sobre o tema ou na estante daqueles interessados na política brasileira do século XX.
O historiador Ivan Alves Filho, em seu livro Os nove de 22: O PCB na vida brasileira, também publicado pela FAP, diz que é “fundamental destacar na trajetória do PCB a sua capacidade de vislumbrar o novo. E de apostar nele. Esse é um partido que se reinventa historicamente. Eu diria até que não tem medo de se reinventar historicamente". Essa ausência de medo em se reinventar fica nítida ao longo da leitura dessa longa jornada até a democracia reconstituída com maestria por Carlos Marchi.*Daniel Costa é historiador pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e desenvolve pesquisa acerca da corrupção na América portuguesa, especialmente nas capitanias de Pernambuco e Minas ao longo do século XVIII.
Saiba mais sobre o autor
*Daniel Costa é historiador pela Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e desenvolve pesquisa acerca da corrupção na América portuguesa, especialmente nas capitanias de Pernambuco e Minas ao longo do século XVIII.
** Artigo produzido para publicação na Revista Política Democrática Online (53ª edição: março de 2023), editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), sediada em Brasília e vinculada ao Cidadania.
*** As ideias e opiniões expressas nos artigos publicados na Revista Política Democrática Online são de exclusiva responsabilidade dos autores. Por isso, não refletem, necessariamente, as opiniões da revista e da fundação.
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Revista online | Marcelo Madureira: “Não tenho ilusão em relação ao governo Lula”
21 de março de 2023Revista Online,POLÍTICA DEMOCRÁTICA DESTAQUE,revista online,posição_1,Manchete-Home,Mais Notícias,RPD FEVEREIRO 2023,FAPNotícias,Marcelo Madureira,Lula [Luiz Inácio Lula da Silva],Fake News
Comunicação FAP, especial para a revista Política Democrática online (52ª edição)
O ator e humorista Marcelo Madureira, que ficou conhecido por integrar o programa Casseta & Planeta, diz que as “artes não têm componente ideológico de estímulo ao ódio” e afirma que o “humor é uma espécie de crítica humorada sobre fatos e pessoas”. Ele, que também é empresário de comunicação digital, posiciona-se contra o Projeto de Lei 2630/2020, conhecido como PL das Fake News, que está em discussão no governo e no Congresso, e defende a autorregulação das mídias digitais.
“Regimes autoritários tendem a fazer esse tipo de controle, com o qual é preciso ter muito cuidado”, afirmou Madureira, em entrevista à 52ª edição da revista Política Democrática online, produzida e editada pela Fundação Astrojildo Pereira (FAP), em Brasília. A entidade é vinculada ao Cidadania. Ele acredita que o desenvolvimento da inteligência artificial e de várias ferramentas tecnológicas poderão reduzir o impacto das notícias falsas na sociedade.
Apesar de ter declarado voto no presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Madureira diz ser favorável à formação de uma ampla frente democrática. “Sou contra o autoritarismo de extrema direita ou de extrema esquerda. Não tenho qualquer ilusão em relação a esse governo, fora de que ele garanta a existência do regime democrático”, afirmou. A seguir, leia os principais trechos da entrevista.
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Política Democrática (PD): Existe um impasse entre pessoas que criticam o que chamam de “politicamente correto” e os que entendem que é preciso, sim, usar a linguagem de forma responsável em qualquer situação. Qual a sua opinião sobre a crítica ao que parte da sociedade classifica como politicamente correto no Brasil?
Marcelo Madureira (MM): Acho que existe um certo exagero com relação a essa política do politicamente correto, que acaba criando uma espécie de censura não institucionalizada sobre os conteúdos das pessoas, porque, muitas vezes, certas colocações, certas coisas gravadas, ditas ou escritas, são colocadas fora de contexto e acabam gerando uma enorme distorção, como as políticas de cancelamento, junto a essas políticas identitárias que existem hoje em dia. Não que eu seja contra política identitária, mas acho que elas tendem a ser mais políticas autoritárias que identitárias. Então, as pessoas defensoras do politicamente correto partem do pressuposto – por exemplo, no nosso caso dos humoristas – de como se não tivéssemos nenhum princípio de ética e profissional, o que faz [pensar] que a gente fala qualquer coisa ou ofenda qualquer tipo de pessoa ou de conjunto de pessoas que se possa imaginar – étnicos, políticos, religiosos – gratuitamente. Na verdade, o humor não quer ofender ninguém; ele quer fazer as pessoas rirem. O humor é uma coisa que o ser humano inventou para rir de si mesmo, rir das nossas idiossincrasias, das nossas limitações, da nossa arrogância, da nossa hipocrisia. O humor sempre teve uma certa. Aqueles que são objeto do riso, do humor, da piada se dizem ofendidos, quando, na verdade, você apontou que o rei está nu, uma realidade que todo mundo vê, mas não tem os canais - digamos assim, um canal humorístico - para falar sobre aquilo. Não digo nem denunciar, mas comentar aquilo, e aquilo tem um impacto na sociedade, uma repercussão. O humor é uma espécie de crítica humorada sobre fatos e pessoas, e isso só tem sentido se essas coisas, de fato, acontecerem. Por isso, eu, pelo menos, como humorista, sempre tive o cuidado de fazer piadas e não criar fatos falsos – fazer piadas sobre coisas que não são verdade, que não estão acontecendo. A grande preocupação que a gente tem é saber o que as pessoas estão falando, comentando, e fazer piada sobre isso.
PD: Então, o senhor não considera que parte de humoristas – ou de pessoas que se dizem humoristas –, de alguma maneira, pode reforçar, por exemplo, questões contra a comunidade LGBTQIA+ e pessoas negras? O senhor fez uma ressalva, dizendo que não é contra as políticas identitárias, mas, considerando esse mercado, algumas pessoas que se apresentam como humoristas não se atropelam?
MM: Já que você falou em termos de mercado, vamos tratar a questão economicamente. Achei muito correta essa sua colocação. Do lado da oferta, hoje você tem, de fato, uma quantidade de humoristas – de pessoas que se dizem humoristas, se dizem engraçadas – que falam as maiores barbaridades, inclusive de forma chula, uma coisa gratuita, com uma agressividade. Não sou moralista, muito pelo contrário, mas, usando palavras chulas, inadequadas, achando que são engraçadas. Não que você não deva usar, eventualmente, palavrão. O que consagra o humorista é a qualidade do trabalho dele. Qualquer um pode se autointitular humorista, falar coisas que lhe pareçam engraçadas ou mesmo usá-las de má-fé, em um pretenso humor para ofender, ridicularizar e avacalhar pessoas, instituições, grupos. Isso ocorre. Não é que não possa ocorrer, mas acho que o grande filtro para isso é justamente a opinião pública. Confio muito no receptor, na chamada opinião pública. Temos uma visão muito soberba do público, achamos que o nosso público, de maneira geral, não sabe distinguir as coisas. No humor, se sabe quem são os grandes humoristas, que são realmente bons, e aqueles que são apenas ofensivos ou que estão a soldo, por receberem dinheiro de A, B ou C, para fazer humor chapa branca, humor oficial, que não tem nada a ver com humor. Isso está do lado da oferta. Do lado da demanda, existem muitas pessoas que se acham ofendidas, se acham ridicularizadas, mas isso fica a critério de cada um. Por exemplo, posso chegar para você e falar "bom dia", e você ficar ofendido com isso, achando que estou sendo irônico, zombando da sua cara, porque sei que você teve um péssimo dia ou está atravessando um momento difícil. Então, tem má-fé também. Estou tentando relativizar as coisas para não cair, justamente, na polarização, já que, no Brasil e no mundo, tudo é polarizado, de maneira geral. Existem questões e reivindicações que são pertinentes, e outras que são absolutamente impertinentes, que não têm nada a ver. Por isso, acredito no bom senso do público. Então, o politicamente correto me parece um exagero porque eu, pelo menos, no meu trabalho de humorista, tomo cuidado de tentar ser engraçado. Jamais tive a intenção de ofender qualquer segmento da sociedade – políticos, antropólogos ou feministas, por exemplo –, com o objetivo de apenas ofender. Isso não tem, isso é discurso de ódio, discurso ofensivo. Isso não é trabalho de humorista. Isso é uma atitude indigna. Eu tento fazer graça.
PD: O senhor citou trabalho de humorista. Qual é o papel de um profissional que trabalha com arte do humor em uma democracia e em relação aos governos? Como o humor sobrevive mesmo em casos de governos autoritários de extrema-direita, como ocorreu durante o mandato do ex-presidente Jair Bolsonaro?
MM: O papel de todo artista, primeiro, é realizar a sua arte, avançar em relação aos limites estéticos e éticos da sociedade, propor novidades, surpreender. O artista é aquele que surpreende a sua plateia, de maneira agradável, lúdica, divertida ou crítica, no caso do humor. Isso é muito importante em todos os regimes. Eu mesmo e vários outros humoristas, durante o regime militar, jamais abrimos mão do papel crítico, aliás, com muita coragem e risco físico. Muitos foram presos, espancados, tiveram limitação ao realizar seu trabalho e fazer seu ganha-pão, mas o artista de verdade nunca se deixa intimidar, principalmente em regimes totalitários, em ditaduras. Sempre os humoristas nunca se intimidaram. É óbvio que existe o medo, como disse Millôr Fernandes. O medo sempre existe, mas também existe aquela necessidade de você, por meio de sua arte, mostrar o que você pensa, o que está errado. Não só em uma democracia, mas em qualquer tipo de regime, sobretudo nos regimes autoritários, é fundamental o exercício das artes. Em uma democracia, é preciso realmente entender o que é liberdade de expressão, mas, ao mesmo tempo, como criador, tem que saber que a própria liberdade de expressão tem limites. Artista não faz apologia de genocídio ou de perseguições raciais, preconceitos de maneira geral, de qualquer natureza, ou mesmo declarações que estimulem o ódio. Isso não é a ideia das artes. As artes não têm esse componente ideológico de estímulo ao ódio, bem pelo contrário. Há estímulo às liberdades, mas por meio da criatividade, para agregar massa crítica, conteúdo relevante para o conjunto da sociedade, e isso vale para todo tipo de artista, do palhaço de circo ao diretor de cinema. Em uma democracia, isso é muito bom e só estimula o ambiente democrático.
PD: Considerando justamente esse ambiente democrático e que o senhor tem empresa de comunicação digital, qual a sua avaliação sobre a proposta batizada como PL das Fake News? Qual é o limite entre o combate à desinformação, praticada por meio de mentiras ou informações fora de seu contexto, e o cerceamento à liberdade de expressão?
MM: Nós precisamos, em qualquer tipo de regime, ter muito cuidado com as legislações, porque elas podem virar não um instrumento de Estado, e, sim, um instrumento de governo. Usa-se legislação para perseguir A, B ou C, enquadrando essas pessoas na legislação que estabelece as normas de registro do que é aceitável e do que não é. Regimes autoritários tendem a fazer esse tipo de controle, com o qual é preciso ter muito cuidado. A princípio, sou contrário a esse tipo de proposta. Acredito muito no bom senso e no caráter das pessoas. Por outro lado, as fake news sempre existiram, antes como boato, mentira. Com a revolução tecnológica, em nosso mundo, todo digitalmente conectado, as notícias falsas correm muito mais rápido do que as verdadeiras. Esse é um dos grandes desafios. Como a sociedade pode ficar protegida da difusão de notícias falsas? Não tenho resposta ainda. Acredito que, com o desenvolvimento da inteligência artificial e de várias ferramentas ao longo do tempo, conseguiremos não acabar com fake news, mentiras, mas fazer com que elas não afetem tanto a opinião pública, nem sejam aceitas de forma gratuita. Com o avanço da tecnologia e acesso cada vez maior, as pessoas ficam sujeitas a fake news, mas também à educação, ao aprendizado. Elas tendem a ter um preparo intelectual maior, capaz de distinguir o falso do verdadeiro - aquilo que é crível daquilo que não é crível. Sempre desconfio das coisas. O interesse do conjunto da sociedade é que a internet seja um meio de troca de ideias, e não de ataques e mentiras. Acredito que, com o tempo, isso vai melhorar. Não vai acabar, mas vai melhorar bastante.
PD: Parte da sociedade diz que haverá risco de retrocesso se a proposta for discutida em comissão especial, como defendem as empresas do setor de publicidade digital. O senhor acredita que o caminho é a autorregulação das plataformas de mídias digitais, que também já foi sinalizada pelo presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes?
MM: Acredito muito na autorregulação das mídias digitais. No próprio escopo da publicidade no Brasil, há órgãos que não são de Estado, mas que são autorregulatórios, assim como há os conselhos de medicina, a OAB e vários conselhos profissionais que, de certa forma, protegem e regulam a atividade dos respectivos trabalhadores e, eventualmente, punem. Na área da publicidade, por exemplo, existem várias limitações. O Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar) age com muita ênfase e tem muita credibilidade. Praticamente, anúncios de tabaco não existem mais. Anúncios de bebidas alcoólicas são extremamente controlados. É autorregulação. São os profissionais de cada área, sérios e de boa-fé, que têm muito cuidado naquilo que estão fazendo. Por isso, prefiro realmente acreditar nesse caminho, na autorregulação, porque quando um negócio vem de cima para baixo, de fora para dentro, há o risco de ser transformado em instrumento de governo, instrumento de política, inclusive, de política econômica, de competição, que pode ser muito danoso, por favorecer os grandes.
PD: Caso o Estado regule as mídias digitais no Brasil, o senhor também vê risco de essa prática se estender para a regulação dos meios de comunicação?
MM: Exatamente. A princípio, a autorregulação é o melhor caminho, porque pressupõe que o cidadão tem direitos e deveres. Aqui no Brasil, as pessoas, quando se fala de cidadania, ficam muito preocupadas com a questão dos seus direitos, mas se esquecem um pouco dos seus deveres. Um cidadão tem que ser responsável, deve ter consciência de seus deveres para com o conjunto da sociedade, inclusive deveres no exercício da sua profissão, do seu trabalho. Acredito muito que, a princípio, a maior parte das pessoas têm senso de responsabilidade.
PD: Na avaliação do senhor, neste momento, qual é o principal desafio do país, que derrotou nas urnas um candidato de extrema direita e que elegeu um presidente que promete ser mais progressista? Até que ponto o novo governo, na sua avaliação, de fato já está conseguindo governar?
MM: O meu medo é as pessoas ficarem decepcionadas ao verem entrevista com um humorista falando de coisas muito sérias e importantíssimas. Sou cria do antigo Partidão, do glorioso PCB, e isso muito me orgulha. Fui educado politicamente pelo Partidão e, por isso, tenho muito sintonia com o Cidadania, porque o vejo como o herdeiro político do antigo Partidão, com todos os seus defeitos e virtudes. Somos todos humanos. Tenho muitos amigos. Hoje sou liberal de esquerda, ou um social-democrata de esquerda, para ser mais claro - de que costumo ter uma visão da história como um todo. No Brasil, 5% da população vive parasitariamente de 95% do resto dos brasileiros, que sobrevivem em condições cada vez mais difíceis. Isso é uma questão histórica que precisa ser rompida. Desses 5%, inclusive não é uma questão ideológica, dois terços deles são funcionários públicos municipais, estaduais ou federais. Para se ter uma ideia, grande parte do empresariado brasileiro é dependente do Estado. No total, 40% do PIB brasileiro vêm do Estado. Esse sistema, que no Brasil já é secular, precisa ser rompido, porque é uma sociedade que não vai dar certo, principalmente dadas as mudanças que o mundo vem atravessando. Hoje o ser humano se confronta com uma questão fundamental, que se retroalimenta. É a questão da concentração de renda, cada vez maior e mais aguda. Outra questão preocupante é o desequilíbrio ambiental. A concentração de renda e o desequilíbrio ambiental se alimentam, e isso está colocando em risco, agora, a humanidade. É preciso romper com isso e inventar uma nova forma de viver, um novo modus vivendi, que eu não sei qual é. O socialismo real se mostrou disfuncional, o capitalismo também não responde às demandas da sociedade. Não tenho resposta para essa pergunta hoje. Essa é a pergunta que se coloca para a humanidade. O Brasil está inserido nesse contexto. Só que, como tudo no Brasil, as coisas são mais arraigadas. O Brasil é um dos países que têm a maior concentração de renda do mundo. Tem uma população enorme, imensa, que cada vez mais vive à margem da economia, à margem de tudo, e sobrevive com grande dificuldade. Em um país como o nosso, que tem dimensão continental, com recursos naturais enormes, isso é um despautério, um contrassenso. É preciso que a gente entenda e compreenda a necessidade de mudança, de modernização do Brasil. Cito sempre a obra de Raymundo Faoro, Os Donos do Poder, escrita em 1958. É um livro enfadonho, difícil de ler, mas quem consegue ler consegue realmente compreender o Brasil de hoje em dia. Porque o Brasil de hoje não tem nenhuma diferença do Brasil do Império, da República Velha ou de Getúlio Vargas. É um país injusto e excludente, onde a miséria de grande parte da população é cada vez maior. Se continuar a se repetir esse modelo, esse estado de coisas, não consigo ver nenhum final feliz para essa história. Pelo contrário, vejo possibilidade de desmantelamento, de colapso geral muito grande, haja vista, por exemplo, as manifestações de 2013. Chega-se à anomia, que é o desmantelamento, a ruptura, o tecido social se desmancha, mergulhando a sociedade num caos, e caos começa e não tem data para acabar. Lembro o exemplo do Haiti, que é o único país em que aconteceu exatamente isso no século 18 e até hoje, no século 21, não conseguiu se recuperar do caos social. Evidentemente, o Brasil é um país enorme, de dimensões continentais, e tem papel extremamente importante no mundo, mas isso não nos salva dessa perspectiva. O problema do Brasil é justamente isso. Brasileiros mais privilegiados têm que pensar sobre isso, meditar sobre isso profundamente e, como digo, é a obrigação do cidadão participar da vida política, da vida social, da vida comunitária, e perceber que, se a gente não fizer mudanças estruturais relevantes no país, isso tudo pode inviabilizar a própria nação brasileira. Isso é um problema grave. E é preciso que se debata isso, se examine esse assunto, porque eles não se limitam só às fronteiras brasileiras. Essas questões se impõem hoje para o mundo inteiro, para os povos da África, da Ásia, da Europa, do resto das Américas. A humanidade hoje tem desafios imensos, e a impressão que tenho do Brasil, principalmente da nossa classe dirigente, política, é que ela tem postura meio alienada dessas questões. Eles não conseguem, ou não querem, ver a complexidade e a profundidade dessas questões e ficam nas questões cotidianas menores, que não são nada frente aos desafios que temos que enfrentar. Os desafios da miséria do povo brasileiro, da falta de educação, da falta de saúde, da falta de infraestrutura, da falta de transporte, da falta de segurança, são imensos, e não tem soluções fáceis ou triviais. No Executivo, no Legislativo e no Judiciário, vejo limitação intelectual e falta de visão, de perspectiva histórica. Há um despreparo mesmo para enfrentar. Nem sequer passa pela cabeça deles. Não tenho ilusão em relação ao governo Lula - e votei no Lula. Mais que isso: fiz campanha para o Lula, apesar de ser um severo crítico de Lula e do PT. No entanto, sei compreender o movimento histórico. Nas últimas eleições, o que estava em jogo era a democracia. Fora da democracia, não temos salvação. Então, por isso, não só votei no Lula, como fiz campanha para o Lula. A batalha pelas instituições democráticas não é jogo jogado, não é caso encerrado. Ela se coloca ainda, na medida em que há hoje, no Brasil, uma extrema-direita muito maior do que imaginávamos, organizada, estruturada, que é muito maior do que a família Bolsonaro, infelizmente. Por isso, sou favorável à formação de uma ampla frente democrática. Sou contra o autoritarismo de extrema direita ou de extrema esquerda. Não tenho qualquer ilusão com relação a esse governo, fora de que ele garanta a existência do regime democrático. Do ponto de vista tático e estratégico, a luta pela democracia só vai ser feita por meio de uma ampla frente que abranja o maior número possível de pessoas, com diferentes pensamentos, mas que sejam efetivamente a favor do regime democrático. Meu grande temor é que o Brasil fique oscilando entre um governo não de esquerda, mas esquerdista, e um regime de extrema direita, fascista, totalitário, como o de Bolsonaro. Percebo que o caminho está no centro, a virtude está no centro, no equilíbrio, em romper essa polarização que existe não só no Brasil, mas no mundo inteiro, com ódio recíproco muito grande, e isso não é solução para nada.
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Artigos - Revista Política Democrática Online – Edição 53
21 de março de 2023REVISTA PD,Revista Online
Artigos - Revista Política Democrática Online – Edição 53
Nas entrelinhas: o fantasma do comunismo renasceu com o bolsonarismo
21 de março de 2023comunismo,POLÍTICA HOJE,PH-destaque,Correio Brazileinseentrelinhas,posição_1,Mais Notícias,jairbolsonaro,FAP,Notícias
Luiz Carlos Azedo/Entrelinhas/Correio Braziliense
“Um fantasma ronda a Europa — o fantasma do comunismo. Todas as potências da velha Europa se aliaram numa caçada santa a esse fantasma: o papa e o czar, Metternich e Guizot, radicais franceses e policiais alemães. Que partido oposicionista não é acusado de comunista por seus adversários no governo?”
As primeiras palavras do Manifesto Comunista de 1848 publicado por Karl Marx e Friedrich Engels em Londres, em inglês, francês, alemão, flamengo e dinamarquês, parecem saltar das estantes empoeiradas para a pesquisa Ipec divulgada no domingo pelo jornal O Globo.
Para 44% dos brasileiros, o Brasil corre o risco de “virar um país comunista” sob o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Segundo a pesquisa, 33% concordam totalmente com a afirmação de que um novo regime poderia ser implantado no país; 13% concordam parcialmente com a tese. Discordam total ou parcialmente da ideia 48% dos entrevistados.
A pesquisa mostra que a essência do bolsonarismo é o anticomunismo. O ex-presidente Jair Bolsonaro trata toda a esquerda e mesmo setores liberais como uma “ameaça comunista”. Na campanha eleitoral de 2022, teve nome e sobrenome: Luiz Inácio Lula da Silva. Continua sendo um divisor de águas da política brasileira: 81% dos que afirmam que a gestão Lula é “ruim ou péssima” concordam com o risco de comunismo. Já 71% dos que consideram o governo Lula “bom ou ótimo” rejeitam a afirmação.
A “ameaça comunista” é um tema recorrente na política brasileira, corroborado pela história do Brasil. Fundado por anarquistas, sob a liderança do jornalista e crítico literário Astrojildo Pereira, o Partido Comunista surgiu em 1922. Colheu lideranças da primeira grande onda de greves operárias no Brasil, que ocorreu em 1917, o “ano vermelho”, pois coincidiu com a Revolução Russa.
O Partido Comunista logo foi posto na ilegalidade. Em janeiro de 1927, reconquistou a legalidade, com a eleição de Azevedo Lima para a Câmara de Deputados. Em agosto, foi posto novamente na ilegalidade, pela “Lei Celerada” (Decreto n° 5.221) do governo de Washington Luís. Com o trabalho assalariado e a crescente urbanização, a questão social havia emergido nas grandes cidades e se tornara um caso de polícia.
Naufrágio no passado
A lei limitava a atuação da oposição ao governo e a direito de reunião, pois permitia ao governo fechar por tempo determinado sindicatos, clubes ou sociedades que convocassem ou apoiassem publicamente greves ou protestos. Também proibia a propaganda desses temas e impedia a distribuição de panfletos ou jornais que apoiassem ou incitassem greves e manifestações. A imprensa foi amordaçada. Os sindicatos foram duramente reprimidos, trabalhadores estrangeiros socialistas e anarquistas foram deportados do país.
Com a entrada no Partido Comunista do líder tenentista Luiz Carlos Prestes, comandante da famosa coluna que leva seu nome e o do general Miguel Costa, o comunismo deixou de ser um fantasma. Com o levante comunista em quartéis do Rio de Janeiro, de Recife e de Natal, em novembro de 1935, durante a ditadura de Getúlio Vargas, passou a ser tratado como uma ameaça real. Com o fracasso da chamada Intentona Comunista, Prestes passou nove anos na cadeia.
Entretanto, o fantasma voltou a rondar o Brasil em 1964, durante o governo João Goulart, que assumiu o poder com a renúncia de Jânio Quadros e propôs um programa de reformas de base, entre as quais a agrária. Um discurso de Prestes na Associação Brasileira de Imprensa (ABI), no qual exagerava a influência comunista no governo, seria um dos pretextos para a destituição de Jango pelos militares, em março de 1964.
No livro A Mente Naufragada, o cientista político norte-americano Mark Lilla explica que o espírito reacionário difere muito do conservador. Trata-se de invocar o passado para nele viver sem transformações, o que é muito diferente da atitude do conservador, que tem o passado e suas tradições como referência para agir no presente e construir o futuro.
Lilla conclui que mente reacionária naufragou, “porque olha para os destroços de um passado que lhe parece ameaçado, e luta para salvá-lo, porque não sabe conviver com as mudanças”. Ironicamente, porém, isso faz do reacionarismo um fenômeno “moderno” no mundo da globalização e do multiculturalismo.
No Brasil, o grande porta-voz do pensamento reacionário é o ex-presidente Jair Bolsonaro, que não conseguiu se reeleger. Esgrime o fantasma do comunismo contra toda a esquerda, principalmente o PT, um partido de base operária e social-democrata, que retroalimenta o fantasma do comunismo pela sua narrativa classista e, principalmente, devido às boas relações com Cuba, Venezuela, Nicarágua e, agora, a China.