Para defender o decreto das armas, o chefe da Casa Civil omitiu estudos e apresentou dados falsos. A prática tem sido comum neste início de governo
Em 1921, o editor C.P. Scott escreveu que “o comentário é livre, mas os fatos são sagrados”. A máxima é republicada todos os dias pelo jornal britânico “The Guardian”. Mesmo assim, parece cada vez mais fora de moda na política do Reino Unido.
Ontem a premiê Theresa May se salvou por pouco de perder o cargo. Seria a segunda chefe de governo a cair por causa do Brexit. O primeiro foi David Cameron, vítima do referendo que ele mesmo convocou.
A votação mostrou o poder das “fake news”. Os defensores do rompimento com a União Europeia falsearam dados e omitiram os custos de deixar o bloco. Os eleitores caíram na armadilha populista e decidiram contra o próprio bolso.
A campanha do Brexit inspirou os estrategistas de Donald Trump e Jair Bolsonaro. Os americanos já convivem há dois anos com um governo que contesta estudos científicos e prega a existência de “fatos alternativos”. Agora, tudo indica que chegou a nossa vez.
Ao defender o decreto das armas, o ministro Onyx Lorenzoni declarou à GloboNews que “toda a experiência da humanidade mostra, sem nenhuma falha que negue essa evidência, que quanto mais armada a população, menor a violência”.
A maioria das pesquisas sérias diz exatamente o contrário. No Brasil, a taxa de homicídios passou a subir mais lentamente depois de 2004, quando o Estatuto do Desarmamento entrou em vigor.
O ministro não parou por aí. Ele disse que os roubos a residências na Inglaterra aumentaram 40% depois que a posse de armas foi proibida. A Agência Lupa mostrou que as estatísticas dizem o oposto: a taxa caiu 72%.
O chefe da Casa Civil ainda alegou que a Declaração Universal de Direitos Humanos “garante o direito de tu, na manutenção da vida, tirar a vida daquele que te agride”. A afirmação simplesmente não existe no documento.
Onyx parece à vontade num governo em que a ministra dos Direitos Humanos contesta Darwin e o ministro do Meio Ambiente considera o aquecimento global um problema “secundário”.
A novidade é ver Sergio Moro se entrosando nesse time. Na noite de terça, o titular da Justiça criticou as pesquisas sobre o desarmamento e alegou que seus resultados seriam “controvertidos”.