O coronavírus chegou e Paulo Guedes insiste na conversa das reformas. Para a professora Monica de Bolle, o ministro está perdido e não entende a gravidade da crise
Em visita à Fiesp, o ministro da Economia foi questionado sobre o risco de o dólar ultrapassar a marca dos R$ 5. A resposta foi puro Paulo Guedes: “É um câmbio que flutua. Se fizer muita besteira, pode ir para esse nível”.
A profecia levou apenas uma semana para se realizar. Na quinta-feira, a moeda americana chegou a ser negociada a R$ 5,02. A semana terminou com a cotação em R$ 4,81, maior valor nominal desde o Plano Real.
Seria injusto culpar Guedes pelo derretimento do câmbio. A guerra do petróleo e a chegada do coronavírus produziram um estrago maior que a sua capacidade de autossabotagem.
No entanto, as besteiras do ministro não ajudam o país a sair da crise. Além de tumultuar o ambiente com falas desastradas, ele resiste a tomar medidas para amenizar o tombo anunciado.
Na quinta, Guedes tentou empurrar responsabilidades para os outros. Retomou a conversa das privatizações e cobrou a aprovação de reformas que ainda nem foram enviadas ao Congresso.
A atitude irritou parlamentares que o ajudaram a mexer na Previdência. O deputado Rodrigo Maia disse que o ministro pensa de forma “medíocre”. A reação indicou que o estoque de paciência com o “Posto Ipiranga” do bolsonarismo pode estar prestes a se esgotar.
A economista Monica de Bolle, da Universidade John Hopkins, tem despontado entre os insatisfeitos com Guedes. Ela defende a revisão do teto de gastos e a adoção de medidas contracíclicas, duas ideias que causam calafrios no ultraliberal de Chicago. Para a professora, o ministro está preso numa “camisa de força ideológica” e vê a regra do teto como “vaca sagrada”.
“Guedes está completamente perdido, não compreende a gravidade da crise. No meio de um incêndio, você não propõe uma reforma tributária”, critica. “Esta é uma crise inédita, que vai gerar uma paralisia nunca vista. O mundo todo está flexibilizando regras fiscais, e o Brasil está atrasado”.
Na quinta, o ministro reincidiu nas besteiras. Num dia em que a Bolsa acionou duas vezes o circuit breaker, ele disse que o país “estava em pleno voo, começando a decolar”. “Não existe pleno voo com PIB de 1%. A economia brasileira está frágil, com crescimento baixo, desemprego alto e redes de proteção esgarçadas”, rebate De Bolle.
A professora alerta que o pior ainda está por vir. Nas próximas semanas, o coronavírus tende a se espalhar entre os brasileiros mais pobres, que só contam com a rede pública de saúde. Quando isso ocorrer, os cortes no social devem cobrar uma conta amarga.