Em artigo, Mourão acusou imprensa, governadores, juízes e parlamentares de prejudicarem o país. O texto assustou quem pesa prós e contras de um processo de impeachment
Ao convidar Hamilton Mourão para sua chapa, Jair Bolsonaro contratou uma espécie de seguro-impeachment. O general era conhecido por fazer imprecações contra a democracia. Na campanha, reforçou a fama de brucutu ao falar em “autogolpe” e propor uma Constituinte sem votos.
Depois da posse, o vice trocou de figurino. Mais esperto do que o capitão, ele suavizou o tom e passou a se apresentar como um moderado entre radicais. O novo estilo incomodou o clã presidencial. No entanto, o general continuou a ser visto com desconfiança pelos paisanos.
Ontem os políticos ganharam mais um motivo para se preocupar. Em artigo no jornal “O Estado de S. Paulo”, Mourão voltou a defender teses autoritárias. O general escreveu que nenhum país no mundo está “causando tanto mal a si mesmo”como o Brasil. Ele está certo, mas o texto dá a entender que a razão dos problemas é a democracia.
O primeiro alvo do vice foi a imprensa, que precisaria “rever seus procedimentos” na cobertura da pandemia. Ele cobrou mais opiniões “favoráveis ao governo”, uma exigência típica de ditaduras. “Sem isso teremos descrédito e reação”, acrescentou, num momento em que o presidente estimula agressões contra jornalistas.
Mourão também acusou “governadores, magistrados e legisladores” de prejudicarem o país. Em seguida, condenou a “profusão de decisões de presidentes de outros Poderes, de juízes de todas as instâncias e de procuradores”. Naturalmente, a queixa só se aplica às decisões que contrariam os interesses do Planalto.
O vice ainda reclamou das “manifestações de personalidades” contra o governo. Segundo ele, as críticas causariam “prejuízo à imagem do Brasil”. No mundo real, quem queima o filme do país é Bolsonaro, carimbado pelo “Washington Post” como o pior líder do planeta.
Sem os palavrões do capitão, o general endossou o discurso de que as medidas de isolamento provocarão “caos” e “desastre”. Na boca de Bolsonaro, essa conversa sempre soou como desculpa para um golpe. No artigo de Mourão, assustou quem calcula os riscos de um processo de impeachment.